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No fundo do poço, há água limpa. Mas é preciso coragem para lançar-se

O vazio é a origem de toda realização. Suportá-lo e compreendê-lo é um desafio

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Ao vazio atribui-se tudo de pior. A dor, o sofrimento, o descontentamento, o medo, a incompletude. Ele é o grande inimigo do ego: o zelador metido a dono do prédio, que quer tudo na mais perfeita ordem. Sem perceber, no entanto, que ele mesmo não é capaz de vislumbrar a perfeição.

Daí tenta-se preencher o vazio com palavras, objetos, relações. É inútil. Ele persiste lá, e persistirá. É assim que deve ser para que seja preservado o sentido da existência – e não só os caprichos e confortos egoicos.

Tudo brota do vazio. A semente carrega em si uma câmara oca. O útero é um vazio. O silêncio é um vazio. Nele, então, temos o princípio da criação das coisas, dos seres, das ideias.

A alma precisa desse espaço ocioso para se manifestar. Longe dos preconceitos e dos determinismos que limitam a realidade ao cristalizá-la. Se estamos totalmente preenchidos por algo, não há espaço para a inovação. Ficamos estagnados.

No entanto, isso nos parece mais seguro. São as âncoras usadas para manter o ideal de controle do ego. Nossas certezas preenchem nosso campo de visão. As prateleiras vazias evocam possibilidades que ainda não consegui vislumbrar – e isso é confundido com fracasso.

A natureza é tão sábia que se encarrega de desocupar espaços. Desgasta, corrói, esfacela. O tempo, agente compulsório da transformação, assume o papel de fomentar o vazio. Ele é o irmão mais velho da morte. E ela é a mãe das possibilidades.

Quando recebo alguém se queixando de um vazio, sentindo-se o pior dos seres justamente por isso, escuto o eco de uma alma que quer se realizar. O difícil nesses momentos é convencer o “eu” a confiar e retirar-se dessa função dominante, sob a promessa de que algo melhor surgirá.

A metáfora do “fundo do poço” é uma ótima imagem para ilustrar essa situação. Muitas vezes, achamos que chegamos ao fim. Mas, de fato, ainda tentamos nos agarrar nas paredes cobertas de lodo por temermos o vazio. Ignoramos, assim, que é no fundo que se encontra a água limpa, sede da vida.

Superar o desespero diante do vazio é perceber nele uma oportunidade, entender que ali está guardada toda a potência. Como nos ensinam os versos de Lao Tsé, escritos no Tao te Ching, 600 anos antes de Cristo:

“Trinta raios convergem para o centro da roda 
Mas é o vazio do meio 
Que faz andar a carroça.

Dá-se forma à argila para fazer vasos, 
Mas é do vazio interior 
Que depende seu uso.

Uma casa é furada com portas e janelas, 
É ainda o vazio 
Que permite a habitação.

O Ser dá possibilidades 
É através do não-ser que nós as utilizamos.”

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