Aquietar a mente e saber a hora de agir: a melhor forma de resistência
Respeitar o tempo das coisas é uma forma de perceber a realidade e decidir sobre a ação certeira
atualizado
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Enquanto você caminha por uma floresta, percebe que um tigre está à espreita. Ao tentar fugir, ele dispara contra você. Chegam, juntos, na beira de um barranco. Você escorrega e, para evitar cair no despenhadeiro, acomoda-se numa fenda formada na terra pela raiz de uma árvore.
Ao perceber o tamanho da enrascada, olha para baixo e vê o movimento indócil de leões. Aparentam estar famintos, e te enxergam como uma presa. E você ali, no meio do caminho, aparentemente sem alternativas.
Olha para o lado e vê um pezinho de morangos, com frutos vermelhos e suculentos. O que fazer nessa situação? Coma os morangos, delicie-se. E resista firme.
Ouvi essa história de minha analista anos atrás. E, desde então, tem sido um farol diante de circunstâncias nebulosas. Não só quando o momento é exatamente desfavorável, mas principalmente quando nos foge o controle da situação.
O exercício de aquietar a mente é um desafio, especialmente no mundo contemporâneo. Somos hiperestimulados, inundados o tempo inteiro por informações contraditórias, desnecessárias, com capacidade de elevar a graus absurdos os níveis de ansiedade. Especialmente em situações onde nos foge completamente o poder de arbítrio.
Como disse, é um exercício. Como qualquer um, incomoda num primeiro momento por não estarmos habituados. Mas, aos poucos, recobramos alguma lucidez – imprescindível para lidar com a adversidade. À medida em que cresce o medo do futuro, mais perdemos a nossa capacidade de buscar alternativas viáveis para salvá-lo.
Penso nos morangos como o prazer que nos tira desse transe nefasto, do qual nos sentimos presa fácil ao mal que se aproxima. Desfruta-los, assim, não é uma alienação. É uma forma de resistência, de recordarmos em si o bom de viver.
A perspicácia é a virtude de quem consegue encontrar a melhor solução diante das enrascadas da vida. Muitas vezes, acreditamos que precisamos agir e, em vão, arriscamos nossa energia (e nossa pele) à toa. Respeitar o tempo das coisas é uma forma de perceber a realidade e decidir a melhor hora, a ação certeira. Tudo além disso é desgaste.
Respeitar a espera é a grande lição. Ao final desta história, escapará o que encontrar a melhor maneira de resistir. Cedo ou tarde, a voracidade das feras as levará para longe dali, em busca de uma caça mais fácil. A confiança sempre foi o antídoto mais eficaz ao desespero.