Vídeo de Barroso de 2021 é editado para dizer que ele é contra o PT
É falso que Luís Roberto Barroso, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), declarou ser contra PT em vídeos que circulam nas redes socais
atualizado
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Esta checagem foi realizada por jornalistas que integram o Projeto Comprova, criado para combater a desinformação, do qual o Metrópoles faz parte. Leia mais sobre essa parceria aqui.
Conteúdo investigado: vídeo publicado no TikTok, e replicado em plataformas como o Twitter, Instagram e o Kwai, mostram o ministro Luís Roberto Barroso falando sobre esquemas de corrupção envolvendo o PT. Na peça investigada é possível ler as seguintes frases: “URGENTE Barroso muda de lado !!! Sexta 28/out/2022”, “Divulguem até domingo!!!!”. O perfil responsável pela postagem no TikTok utilizou a “#bolsonaro” na legenda da publicação.
Onde foi publicado: TikTok, Twitter, Instagram e Kwai.
É FALSO que o ministro do STF Luís Roberto Barroso tenha se posicionado a favor ou contra qualquer dos candidatos que disputam a Presidência da República — Jair Bolsonaro (PL), que busca a reeleição, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — nesta eleição.
Falso para o Comprova é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Bolsonaristas resgataram um vídeo de 2021, quando Barroso proferiu seu voto sobre a suspeição do ex-juiz Sergio Moro (União Brasil), hoje senador eleito pelo Paraná, no julgamento dos processos de Lula, na 13ª Vara Federal de Curitiba, e editaram trechos para alegar que o ministro havia mudado de lado, sugerindo que antes ele apoiaria o petista e, agora, estaria dando apoio ao atual presidente.
O conteúdo foi refutado pelo próprio STF, em matéria no portal do Supremo informando que é mentira que Barroso tenha se posicionado sobre as candidaturas. Em um dos trechos, o texto diz que “o ministro Barroso nunca declarou apoio a nenhum candidato e trata-se, portanto, de fake news”.
Alcance da publicação
O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 30 de outubro, o conteúdo no TikTok teve 213,3 mil visualizações, 8.095 curtidas, 529 comentários e 9.666 compartilhamentos.
O que diz o responsável pela publicação
O Comprova não conseguiu contato com o perfil que publicou a peça alvo da checagem, já que o TikTok não permite o envio de mensagens entre usuários que não se seguem mutuamente. A reportagem encontrou o perfil do usuário no Instagram e o questionou sobre a peça publicada, mas não obteve retorno até a publicação do material.
Como verificamos
Primeiramente foram feitas buscas no Google pelos termos “Barroso”, “apoio” e “Bolsonaro”. Dentre os resultados mostrados pelo buscador, estava uma publicação do Boatos.org na qual foi possível identificar o vídeo original em que Barroso fazia os comentários sobre o caso.
A partir daí, a equipe assistiu ao vídeo e constatou se tratar de uma peça antiga, diferentemente do que sinalizava a publicação alvo da checagem.
Uma busca no site do STF também retornou uma publicação da Corte desmentindo que Barroso tenha declarado apoio a Bolsonaro. O Comprova ainda tentou contato com o autor da publicação, mas não obteve retorno.
Vídeo utilizado na publicação é de 2021
A partir de um vídeo publicado no perfil do YouTube de Luís Roberto Barroso, é possível verificar que o conteúdo foi gravado no dia 22 de abril de 2021 e publicado no dia seguinte, diferentemente do que alega o conteúdo aqui investigado. A publicação original tratava-se do voto do ministro na suspeição do atual senador eleito Sergio Moro (União Brasil-PR), quando ainda era juiz, por parcialidade no julgamento de Lula, no âmbito da Operação Lava Jato. Também na ocasião, a maioria da Corte, incluindo o ministro Barroso, “negou provimento a recurso (agravo regimental) interposto pela Procuradoria-Geral da República (PGR) no Habeas Corpus (HC) 193726” de Lula.
A gravação original do voto tem pouco mais de 48 minutos e, logo no início, entre os minutos 00:04:56 e 00:06:14, Barroso informa que não poderia falar em culpa ou não do ex-presidente Lula nos processos em que era acusado e disse, ainda, não atuar por ideologias, em posicionamento diferente do que sugere o vídeo aqui investigado.
“Não li a acusação, não li a defesa, não examinei as provas. O processo penal pra mim gravita em torno de provas. Não tem opinião, não tem ideologia, não tem preferências pessoais. Tem prova ou não tem prova, como deve ser. E, portanto, eu deixo claro que nenhuma palavra no voto que estarei proferindo, envolve qualquer juízo acerca de culpabilidade ou não culpabilidade do ex-presidente (Lula). Eu vou apenas contextualizar o ambiente geral em que, a meu ver, se situa essa discussão específica, mas não quanto ao caso do ex-presidente, mas à discussão sobre a atuação da 13ª Vara Federal, sua competência e eventual suspeição do juiz (Sergio Moro) que foi o titular por longo período”, diz Barroso no trecho do vídeo.
Cortes no vídeo alteram sentido do discurso de Barroso
O conteúdo falso retirou de contexto frases do ministro, no momento em que analisava os agravos regimentais, trocou ordem do discurso e inseriu no vídeo, mais de uma vez, a menção ao “PT e seus próceres (chefes)”, ao passo que Barroso menciona uma sequência de outras siglas — PSDB, PP e PMDB (hoje MDB) — e não cita o Partido dos Trabalhadores repetidamente como na peça aqui investigada. Os cortes na gravação são feitos para alterar o sentido do discurso de Barroso.
O vídeo editado começa com a seguinte frase: “O PT e os seus próceres, criou-se um mundo paralelo, de esperteza e desonestidade, que naturalizou as coisas erradas no país, para saque do país, por vezes em benefício do partido e por vezes em benefício próprio mesmo. Saque do estado brasileiro e, em última análise, saque do povo brasileiro”.
A fala de Barroso no vídeo original, a partir do minuto 00:13:45, é a seguinte: “A corrupção entre nós, já disse aqui, foi um pacto oligárquico, celebrado entre parte da classe política, parte da classe empresarial e parte da burocracia estatal para saque do país, por vezes em benefício do partido e por vezes em benefício próprio mesmo. Saque do Estado brasileiro e, em última análise, saque do povo brasileiro. Criou-se um mundo paralelo de esperteza e desonestidade que naturalizou as coisas erradas no país”.
No momento em que o ministro cita o Partido dos Trabalhadores nos termos do vídeo aqui investigado, ele fazia referência ao livro da jornalista Malu Gaspar, “A Organização”, e também menciona outras legendas que foram relacionadas na publicação dela, conforme pode ser observado do minuto 00:14:40 em diante. “Está tudo lá: o PT e os seus próceres, o PSDB e os seus próceres, o PP e os seus próceres, o PMDB e os seus próceres com os valores das propinas e, em muitos casos, com os nomes das contas não declaradas em paraísos fiscais”.
O vídeo investigado também intercala o discurso de Barroso com imagens de Lula e da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), embora durante a votação do ministro esse recurso não tenha sido utilizado.
Barroso nega que tenha apoiado Bolsonaro ou outro candidato
O gabinete do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, negou que ele tenha apoiado o presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro, ou qualquer outro candidato a cargos eletivos. Em nota publicada no portal do STF, no último sábado (29), Barroso reforçou que não tem lado na disputa política. “O Ministro Barroso nunca declarou apoio a nenhum candidato e trata-se, portanto, de fake news”, escreve.
“Meu papel é interpretar a Constituição e as leis com imparcialidade. Meu lado é sempre o do que é certo, justo e legítimo. Isso inclui enfrentar a corrupção e, também, defender a democracia. Cumpro a missão da minha vida – fazer um país melhor e maior – e ao realizá-la não temo desagradar quem quer que seja”, afirmou Barroso. O gabinete do ministro informou ainda que ele “sempre teve e continua a ter uma posição severa em relação a casos de corrupção devidamente documentados, comprovados e julgados com isenção”.
O STF alertou também para a importância de não repassar informações publicadas em plataformas não confiáveis e com dados alarmistas ou teorias conspiratórias. Para conscientizar a sociedade sobre a importância de evitar a propagação de notícias falsas sobre o STF e seus ministros, o Supremo lançou a série “#VerdadesdoSTF”, na qual conteúdos falsos ou deturpados atribuídos à Corte e aos seus ministros são objeto de esclarecimento.
Moro foi considerado parcial e Lula não responde mais a processos
Alvo da Lava Jato por suspeitas envolvendo um tríplex em Guarujá e um sítio em Atibaia (ambos em São Paulo), Lula havia sido condenado, em julho de 2017, por Sergio Moro por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex. A condenação foi confirmada em segunda instância e, em abril de 2018, Lula foi preso. O ex-presidente sempre se declarou inocente.
Lula foi solto após 580 dias e, em março do ano passado, o STF anulou as condenações por entender que ele não teve os direitos respeitados. Segundo o órgão, os processos não podiam ter tramitado na Justiça de Curitiba. Como mostrou a Folha, “segundo os magistrados, a competência de Moro era restrita a esquemas diretamente relacionados à Petrobras e as acusações contra Lula envolvem outros órgãos públicos que vão além da estatal petrolífera”. Em junho de 2021, o Supremo decidiu também que Moro foi parcial em seu julgamento. Já em abril deste ano, a ONU concluiu que Lula teve os direitos políticos violados.
Por que investigamos
O Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre a pandemia, políticas públicas do governo federal e as eleições presidenciais. Publicações falsas ou enganosas envolvendo autoridades públicas podem gerar interpretações equivocadas sobre a realidade e influenciar eleitores no momento da votação. Os cidadãos têm o direito de fazer suas escolhas com base em informações verdadeiras e confiáveis.
Outras checagens sobre o tema
O Boatos.org fez uma verificação na qual desmentiu um conteúdo que aborda o mesmo tema.
Recentemente, o Comprova fez checagens envolvendo ministros do STF e outros órgãos públicos. Nelas, o Comprova mostrou que Alexandre de Moraes não disse que vai mandar prender eleitor que reclamar das urnas; que é falso que aplicativo do TSE não permita denúncias contra o PT e que auditorias externas atestam confiabilidade de sistema eleitoral no 1º turno.
Neste final de semana, a equipe do Comprova se uniu a outras 6 iniciativas de checagem de fatos no Brasil para verificar conjuntamente a desinformação sobre as eleições. A parceria reúne AFP, Aos Fatos, Boatos.org, Comprova, E-Farsas, Fato ou Fake e Lupa.