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Mortes de médicos canadenses não têm relação com a vacina contra Covid

É falso que seis médicos tenham morrido em decorrência da aplicação de vacinas contra a Covid-19

atualizado

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Reprodução/Projeto Comprova
Imagem colorida de post falso sobre mortes de médicos canadenses
1 de 1 Imagem colorida de post falso sobre mortes de médicos canadenses - Foto: Reprodução/Projeto Comprova

Esta checagem foi realizada por jornalistas que integram o Projeto Comprova, criado para combater a desinformação, do qual o Metrópoles faz parte. Leia mais sobre essa parceria aqui.

Conteúdo investigado: publicação que circula no Telegram com informações sobre seis médicos que faleceram durante o mês de julho, no Canadá. A mensagem é acompanhada de um link para o site negacionista “Health Impact News”, que reúne informações de outros sites e perfis nas redes sociais para afirmar que as mortes estão relacionadas ao início da aplicação obrigatória da quarta dose de vacinas contra a Covid-19 em um hospital do Canadá.

É FALSO que seis médicos tenham morrido por causa da vacina contra a Covid-19 no Canadá. O texto, publicado originalmente no site “Health Impact News”, afirma que as mortes começaram a ocorrer duas semanas depois de um hospital iniciar a aplicação obrigatória da quarta dose da vacina contra a Covid-19. De fato, os seis médicos canadenses citados no conteúdo morreram recentemente, porém, não há relação comprovada com eventuais efeitos colaterais da vacina.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Três dos seis médicos eram vinculados à rede de hospitais Trillium Health Partners e morreram de diferentes tipos de câncer. Eles já estavam doentes há pelo menos um ano, como mostram reportagens de TV e sites locais do Canadá, como o CTV News Toronto. Lorne Segall, de 49 anos, faleceu após lutar por cerca de um ano contra um “câncer de pulmão avançado”, conforme seu obituário. O neurologista Stephen McKenzie faleceu aos 68 anos e, em um obituário publicado no site Legacy.com, a família de McKenzie diz que o médico morreu “após uma corajosa batalha contra o câncer”. A terceira morte foi de Jakub Sawicki. A esposa do médico, Iris Sawicki, disse que ele lutava contra um câncer gástrico desde agosto do ano passado. Procurada pelo Comprova, a Trillium Health Partners afirmou que “o boato que circula nas redes sociais simplesmente não é verdade. As mortes não eram relacionadas à vacina contra a Covid-19”.

Os outros três casos citados na publicação analisada são dos médicos Candace Nayman, Paul Hannam e Shahriar Jalali Mazlouman. Em uma outra publicação do “Health Impact News”, há um texto mencionando o que seria a sétima morte de um profissional da saúde do Canadá ocorrida em função da vacina contra a Covid-19: o médico Ryan Buyting.

Candace Nayman e Paul Hannam morreram depois de mal-súbitos durante práticas esportivas no último mês de julho. Candace participava de uma prova de triatlo e desmaiou enquanto nadava e Hannam teve um desmaio enquanto participava de uma corrida. Já Shahriar Mazlouman foi encontrado morto em uma piscina pública na cidade de Regina, na província de Saskatchewan. Os hospitais e autoridades sanitárias aos quais estavam vinculados Hannam e Mazlouman afirmaram ao Comprova que as causas das mortes não foram relacionadas com a vacinação contra a Covid-19.

Em relação à Candace Nayman, uma declaração do hospital ao qual ela era vinculada cita que a médica “sofreu uma parada cardíaca durante uma competição de triatlo e morreu”. Questionado pelo Comprova sobre o que poderia ter levado a médica a sofrer uma parada cardíaca, o hospital em que ela trabalhava disse que não poderia fornecer informações “por questões de privacidade”. O Comprova não conseguiu informações em relação à suposta sétima vítima, o médico Ryan Buyting.

Além disso, ao contrário do que diz o post, as mortes não ocorreram após os hospitais passarem a exigir imunização com quatro doses da vacina contra a Covid-19. O Comprova conseguiu confirmar que ao menos quatro dos seis médicos citados no conteúdo trabalhavam em hospitais que exigiam que seus funcionários tivessem tomado apenas duas doses da vacina. Conforme relatado por veículos de imprensa do Canadá, algumas regiões do país, como a província de Ontário, chegaram a exigir a obrigatoriedade da vacinação com duas doses para trabalhadores da saúde e da educação em 2021. Embora não seja obrigatória, a quarta dose da vacina já está sendo aplicada no país. O Comitê Nacional sobre Imunização do Canadá recomenda que qualquer pessoa acima dos 12 anos está elegível para receber a quarta dose dos imunizantes.

Alcance da publicação

No canal do Telegram Médicos Pela Vida, o link do texto em inglês foi compartilhado com alguns trechos destacados em português. Até o dia 30 de agosto, a mensagem tinha 34,3 mil visualizações, 1.095 reações e 331 comentários.

O que diz o autor da publicação

O perfil do Telegram que publicou o conteúdo aqui analisado (“Médicos pela Vida”) não permite o envio de mensagens. A organização Médicos pela Vida foi procurada por e-mail para confirmar se possui alguma relação com o perfil que publicou o conteúdo, mas não houve retorno até o fechamento desta verificação.

Como verificamos

Primeiramente, foram feitas buscas no Google com parte da manchete apresentada no site Health Impact News (“6 Canadian Medical Doctors Died Within 2 Weeks After 4th COVID Booster Shots”) mais o termo “fact-checking”, para verificar se agências estrangeiras já haviam investigado o conteúdo. Os resultados direcionaram para verificações sobre o tema publicadas por ReutersPolitiFact e USA Today.

Também foram feitas buscas no Google com os nomes de todos os médicos citados pelo conteúdo aqui investigado. A partir dos resultados foi possível ler notícias da imprensa canadense sobre as mortes citadas e descobrir a quais hospitais ou autoridades sanitárias esses médicos estavam vinculados. Em seguida, as assessorias de imprensa desses hospitais e autoridades sanitárias foram procuradas por e-mail.

Para confirmar se as mortes tinham relação com a vacina e se a quarta dose da vacina era obrigatória para profissionais da saúde, a assessoria de imprensa da Agência Pública de Saúde do Canadá também foi procurada, mas não houve retorno até o fechamento desta checagem.

Por fim, o Comprova enviou e-mail para o endereço disponível no site Médicos pela Vida.

Os três médicos da mesma rede hospital morreram de câncer

Um dos pontos centrais do texto publicado no site “Health Impact News” menciona que três médicos de um mesmo hospital no Canadá faleceram num intervalo de menos de uma semana e relaciona isso com a aplicação de vacinas contra a Covid-19. Entretanto, as informações são falsas.

O Comprova encontrou várias reportagens de veículos do Canadá sobre as mortes dos três médicos. E elas não apontam nenhuma relação com as vacinas contra a Covid-19. Os profissionais não trabalhavam todos no mesmo local, mas sim na mesma rede hospitalar, a Trillium Health Partners. Numa reportagem do canal CTV, do Canadá, as mortes de Jakub Sawicki, Stephen McKenzie e Lorne Segall são atribuídas a outras causas, sem qualquer ligação com vacinas ou Covid-19.

A primeira morte ocorreu no dia 17 de julho deste ano. O Dr. Lorne Segall, de 49 anos, faleceu após lutar por cerca de um ano contra um “câncer de pulmão avançado”, conforme seu obituário. Segall era otorrinolaringologista no Credit Valley Hospital, na província de Ontário, parte do grupo Trillium Health Partners.

O segundo óbito foi no dia seguinte, 18 de julho. O neurologista Stephen McKenzie faleceu depois de um período em que esteve “gravemente doente”, aos 68 anos. Em um obituário publicado no site Legacy.com, a família de McKenzie diz que o médico morreu “após uma corajosa batalha contra o câncer”. O Legacy é um site que reúne publicações de obituários de jornais norte-americanos e de outros países, como o Canadá. A publicação foi feita na plataforma pelo The Globe and Mail, um dos maiores jornais canadenses.

O terceiro profissional que faleceu foi Jakub Sawicki, no dia 21 de julho. A esposa do médico, Iris Sawicki, disse à CTV que o marido tinha sido diagnosticado com um “câncer gástrico em estágio 4, numa das formas mais agressivas de câncer de estômago”, em agosto do ano passado. No site gofundme.com, Iris criou uma campanha de crowdfunding para arrecadar dinheiro que será convertido em bolsas de estudo para alunos de Medicina. No texto do site, a mulher cita que “ao longo de sua doença, ele (Jakub) foi capaz de encontrar alegria em suas paixões e hobbies e passar tempo comigo e com nosso filho recém-nascido”.

Procurada pelo Comprova, a assessoria de imprensa do Trillium Health Partners confirmou que não há qualquer relação entre o óbito dos três médicos e a vacina contra a Covid-19. A empresa também informou que requer de seus profissionais apenas duas doses da vacina contra Covid-19. O boato também já havia sido desmentido por agências de checagens dos Estados Unidos, como o USA Today, a Reuters e o PolitiFact.

Não há confirmação de que os outros médicos tenham morrido de causas relacionadas à vacina contra Covid-19

A publicação aqui verificada menciona ainda o nome de outros três médicos canadenses, que trabalhavam em hospitais diferentes, e que teriam morrido em função da vacina contra a Covid-19 recentemente: Candace Nayman, Paul Hannam e Shahriar Jalali Mazlouman. Em outra publicação do mesmo site, há um texto mencionando o que seria a sétima morte de um profissional da saúde do Canadá ocorrida em função da vacina contra a Covid-19: o médico Ryan Buyting.

Esses quatro profissionais de fato morreram no último mês de julho, porém, até o momento não há nenhuma confirmação de que qualquer um dos óbitos tenha relação com a vacina. No caso de Paul Hannam e Shariar Mazlouman, os hospitais e autoridades sanitárias aos quais estavam vinculados afirmaram ao Comprova que as causas da morte não eram relacionadas com a vacinação contra a Covid-19.

Paul Hannam era o chefe de medicina de emergência e diretor médico do programa do Hospital Geral de North York. Ele tinha 50 anos e morreu após ter desmaiado enquanto corria no último dia 16 de julho, conforme informou o Toronto CTV News. Em contato com o Comprova, a assessoria de imprensa do Hospital Geral de North York afirmou que o óbito não tem qualquer relação com a Covid-19 ou com “vacinas de qualquer tipo”. O hospital ainda enviou um link para um texto do obituário do médico Paul Hannam. O texto menciona que ele morreu após uma “insuficiência cardíaca súbita” no início de uma corrida e não faz menção a qualquer efeito colateral da vacina.

Na mesma resposta, o Hospital de North York informou que exigia que os profissionais vinculados à instituição estivessem vacinados com duas doses da vacina contra a Covid-19. “Para garantir um ambiente seguro aos pacientes e a população vulnerável, duas doses da vacina contra a Covid-19 são obrigatórias para todos os funcionários do hospital. Acreditamos que esta é a coisa certa a se fazer e é consistente com a direção tomada por muitos hospitais em nossa jurisdição”, escreveram.

Shahriar Jalali Mazlouman, de 44 anos, foi encontrado morto em uma piscina local na cidade de Regina, na província de Saskatchewan, no dia 23 de julho, conforme noticiou o Regina CTV News, que em outro conteúdo sobre o tema classificou a morte como “repentina”. Mazlouman trabalhava na Clínica Médica da cidade de Melville e no pronto socorro do Centro Regional de Saúde da cidade de Yorkton.

Em contato com o Comprova, a autoridade de saúde de Saskatchewan informou que a morte de Shahriar Jalali Mazlouman não teve qualquer relação com a vacina contra a Covid-19 e que, “em respeito à sua família, nenhuma outra informação seria fornecida”. A assessoria de imprensa do órgão ainda enviou um link de uma publicação feita no último mês de julho sobre o caso. Na publicação, a autoridade de saúde de Saskatchewan apenas presta condolências à família de Mazlouman e informa que ele era um médico de família da cidade de Melville, que “faleceu inesperadamente no último dia 23 de julho”.

Candace Nayman era médica residente de pediatria no McMaster Children’s Hospital, vinculado à Universidade de McMaster, na cidade de Hamilton, e morreu após participar de uma competição de triatlo na cidade de Toronto, que aconteceu em 24 de julho, conforme noticiaram os sites canadenses CBC e Toronto Sun. Candace desmaiou enquanto nadava durante uma das provas, foi socorrida e levada ao hospital. Ela faleceu no dia 28 de julho.

Em contato com o Comprova, a assessoria de imprensa do McMaster Children’s Hospital informou que, por razões de privacidade, não estava autorizada a responder aos questionamentos enviados sobre a causa da morte de Candance e se ela havia sido vacinada contra a Covid-19. Na resposta, o hospital apenas enviou um link para uma declaração conjunta do Hamilton Health Sciences e da Universidade de McMaster sobre a morte da médica. Essa declaração descreve que Candace estava no seu terceiro ano de residência médica na McMaster University, preparando-se para se tornar pediatra, e que ela morreu aos 27 anos. Sobre a causa da morte, a declaração cita apenas que ela “sofreu uma parada cardíaca durante uma competição de triatlo e morreu”.

O Comprova não conseguiu informações em relação à suposta sétima vítima, o médico Ryan Buyting. Pesquisas na internet com o seu nome retornaram apenas para a publicação do “Health Impact News”, de outros sites negacionistas que relacionam sua morte com a vacina contra a Covid-19 e de um site que publica obituários. Essas publicações afirmam que Buyting, de 26 anos, fazia residência médica no sistema de saúde da região de Alberta, no Canadá, e morreu no último dia 26 de julho. O Comprova não conseguiu contato com o sistema de saúde da região de Alberta.

O site que publicou as informações

O “Health Impact News” foi fundado em 2011 e se apresenta como um site para “combater desinformação sobre vacina” a partir da discussão de assuntos que, segundo o site, são “rotineiramente censurados pela mídia corporativa”. Entre outras coisas, na aba de apresentação do site, o “Health Impact News” chama as vacinas contra a Covid-19 de “armas biológicas” utilizadas pelas grandes corporações médicas. Boa parte do conteúdo veiculado hoje no site versa sobre a pandemia de Covid-19 e as vacinas. Publicações do site já foram alvo de verificações da Reuters em setembro e novembro de 2021 e do site Poynter em dezembro de 2021.

Por que investigamos

O Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre a pandemia de Covid-19, eleições presidenciais e políticas públicas do governo federal que viralizaram nas redes sociais. Conteúdos como este aqui verificado, que colocam em dúvida a vacinação contra o coronavírus, são perigosos porque podem influenciar a população a não se imunizar, o que impacta diretamente no combate à pandemia.

Outras checagens sobre o tema

Outras iniciativas de checagem de fatos já identificaram como a falsa a afirmação que três médicos do Trillium Health Partners tenham morrido em decorrência da vacina contra a Covid-19, como o Fato ou Fake, do portal G1, e os sites USA TodayReuters e o PolitiFact.

O Comprova também já verificou outras publicações relacionadas à pandemia, como um texto que engana ao dizer que estudo de Harvard comprovou eficácia de hidroxicloroquina na prevenção da Covid-19 e alegações falsas de uma médica que trata vacinação da Covid em crianças como “assassinato em massa”. O Comprova também já mostrou que não há relação entre casos de mal súbito em atletas e vacinas contra Covid e que post engana ao relacionar mortes no esporte à vacinação contra a Covid-19.

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