New Koto: a melhor e mais completa cozinha japonesa do DF
A casa carrega o fardo de representar toda a tradição da cultura nipônica na capital
atualizado
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Quando da imigração japonesa ao Brasil, 110 anos atrás, Brasília não passava do sonho de Dom Bosco. Após sua construção e a instalação de embaixadas na então nova capital, os japoneses que vieram foram por décadas conhecidos por suas contribuições à produção e ao comércio de hortifrúti. Se encontramos caqui facilmente por essas bandas, devemos isso a eles.
A gastronomia japonesa, por outro lado, levou muito mais tempo para ser aceita comercialmente em Brasília. Peixe cru era temido até os anos 1990, quando devia haver apenas dois ou três restaurantes dedicados a essa especialidade por aqui, entre os notórios Nippon, Kosui e Ichiban. Hoje, há uma profusão de sushibars. Porém, com o fechamento dos últimos dois e adesão às generalidades ocidentais nas receitas clássicas praticadas pelo Nippon, sobra-nos apenas um único restaurante japonês a praticar uma cozinha completa e primaz na capital: o New Koto.
É claro que a Alice Yamenish (ex-Kosui) faz um trabalho belíssimo no Yuzu-an (Clube Nipo), dedicado à cozinha japonesa mais tradicional, informal e caseira – sem sushis. Mas a reflexão de hoje é sobre o enorme fardo que carrega o New Koto, personificado na figura do herdeiro do saudoso Ryozo Komiya e hoje o itamae da casa, Cristiano.
Para começo de conversa, o New Koto é um das raras casas com um serviço de balcão correto. É preciso identificar as diferentes ocasiões para se repastar num restaurante japonês. O balcão é o lugar de comer sushi e, de preferência, realizar a experiência de omakase (algo próximo ao menu degustação). No New Koto, este item aparece fora do cardápio, ao custo de R$ 250.
Ali no balcão é onde a mágica acontece. Mas apenas para iniciados. Não adianta sentar-se lá para se entupir de salmão e atum (aqui não tem tilápia, este engodo fomentado pelo fast-food japonês de praça de alimentação). O repertório é amplo e o ideal é que se abra a ele. Às quintas, chega a maior variedade. Encontra-se facilmente pargo, peixe-serra, katsu, cavala, vieira, enguia, minilula, além dos básicos robalo, salmão, atum, polvo, kanikama, camarão. De vez em quando pinta também ouriço, buri e marisco japonês.
O New Koto é o lugar que não sucumbiu ao movimento colonizatório da gourmetização ocidental, com intragáveis porções de sashimis maçaricados, melados com cream cheese, regados a azeite de trufa ou afeitos aos exageros das combinações com foie gras, pesto e outros hábitos de consumo eurocêntricos. Mas também não passou totalmente ileso.
Para se saborear da forma certa um niguiri (pares a partir de R$ 14, a depender do peixe ou marisco escolhido) é preciso ser um japonês, um nissei ou um atento e pedir para que se inclua o necessário tempero de wasabi sob a fatia de peixe antes de moldá-la ao redor do arroz. Neste quesito, New Koto também apresenta um diferencial notório e que pouquíssimos outros sushibars conseguem respeitar: guarda a proporção de peixe para arroz e observa a temperatura dos ingredientes. Afinal, niguiri não pode levar o grão gelado, jamais!
Recomendo que toda a experiência seja feita no balcão. Para uma refeição mais parruda, New Koto apresenta todos os mais clássicos preparos – realizados sem as concessões à brasileira. Desses, devo ressaltar a qualidade dos caldos do sukiyaki (cozido de carne, macarrão e legumes em molho levemente adocicado) e dos sobas (macarrões). Há complexidade, valorização dos ingredientes e equilíbrio.
Um dos meus novos favoritos da casa surge com o soba frio (R$ 41), um macarrão integral servido em molho à base de molho hoisin superleve, mas com uma adstringência típica dos caldos japoneses. De virar a cuia. O udon (R$ 68), tiras mais abauladas e grossas de macarrão, tradicionalmente não adere muito ao caldo. Bem-feito, mas com tempero de pouca presença.
Aliás, caldo é a definição básica da comfort food japonesa. Aqui não aparecem os lámens (pratos mais populares que Cristiano deve preparar apenas para o bar que está em obras ao lado do restaurante). Mas um dos melhores mimos é a sopinha de ovo com cogumelos, servida em um recipiente de porcelana japonesa. Destampe, prove e terá uma das sensações mais acolhedoras dessa culinária.
Repassando item a item do New Koto, percebe-se muito rigor no preparo de cada porção, mas também muitos pequenos vacilos, sobretudo se a casa estiver muito cheia (o que não é raro). As robatas (espetinhos) de camarão chegam superbem temperadas e no ponto correto, a desmanchar na boca. Mas as gyozas nem sempre estão exibidas com aquele fundo caramelizado da panela.
É impossível exigir da cena de Brasília uma condição semelhante à de São Paulo, porto maior da imigração japonesa, ou de qualquer outro lugar. A característica da capital é esta mesmo. Um lugar que abriu caminho para os cruzamentos nikkeis e muita licença poética (para não falar outra coisa) no que se entende por comida japonesa. E por isso é que Komiya carrega tão grande fardo, de sustentar-se como uma das únicas cozinhas autênticas do país. Não é o caso de condenar os outros, mas de reconhecer o lugar do New Koto para o fomento da cultura que representa.
New Koto
Na 212 Sul, Bloco C, Loja 20. Telefone: (61) 3346-9668. De terça a sábado, das 12h às 15h e das 19h às 23h. Wi-Fi. Ambiente interno. Desde 2009
