La Tambouille preserva legado de Bolla, mas ainda não decolou
Os preparos do chef italiano fazem-se presente no cardápio, porém, casa precisa aprimorar alguns pontos
atualizado
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Por sua pompa arquitetônica inspirada no espírito romano, o La Tambouille parece-me o restaurante mais deslocado do Espaço Gourmet do ParkShopping. Há uma sisudez e uma finesse que pouco dialogam com seus pares de filiais paulistas abrigadas na praça de alimentação ostentatória do centro de compras. Por ser uma casa aparentemente com menor rotatividade dentre as demais – aplicando preços mais altos também –, sinto certa sensação de abandono diante da parede de samambaias, dos espelhos enormes, colunas e bustos imperiais.
Porém, pode ser uma impressão brasiliense. A história do La Tambouille em São Paulo é antiga e, certamente, propõe outro diálogo com a cidade. Algo como nossa relação com o velho Roma. Naturalmente, aqui há mais classe e mais esmero no preparo. Volto ao restaurante pela primeira vez desde a partida do prestigioso chef Giancarlo Bolla, em 2014. Sob o comando da filha, a restauratrice e chef Carla Bolla, pouca coisa mudou.
Antes, o cardápio dividia-se entre pratos franceses e italianos, agora, o menu propõe uma unidade maior. Sábia decisão, evitando os feudos das duas mais clássicas cozinhas do Velho Mundo e abrindo-se para a relação de mútua influência entre ambas. Em Brasília, a formação do cenário gastronômico do comércio local surgiu pelas mãos dos italianos e dos franceses, com participação eventual dos árabes e dos portugueses.
O que me surpreendeu na visita foi saber que o chef Kenis Henon, responsável pelas caçarolas no início da operação brasiliense do La Tambouille, em 2011, está de volta ao comando, com novidades. A melhor delas vem com o frescor dos tentáculos de polvo muito macios, bem temperados e grelhados sob um olhar mediterrâneo com homus e folhas precoces e rabanete (R$ 51). Porém, as frutas cítricas prometidas no menu foram esquecidas, bem como o molho exibido nas fotos de divulgação. Ainda assim, uma formidável combinação, pois o limão-siciliano aparece misturado à pasta de grão-de-bico.Com um atendimento muito cortês e solícito – o que não é nada demais, pois havia apenas duas mesas para atender –, logo providenciaram uma prova do prato, menor, tal como deveria ser. Os gomos de limão sugam a essência da refeição, anulando o sabor do polvo.
Para além desse percalço, os pratos mais clássicos de Bolla foram servidos conforme me recordava de sete anos atrás. Uma ótima paleta de cordeiro desossada (R$ 88), com molho saboroso, tinha como acompanhamento o famoso tagliolini da casa, que dispensaria a insistente manteiga trufada.
Percebo que ampliaram a oferta do óleo de trufas. De repente, nesse mercado gastronômico da (mal)dita “alta” gastronomia, estão substituindo temperos naturais por essências capazes de matar o sabor original do produto in natura (as trufas) e dominar por completo o prato.
Ainda bem que os camarões ao molho de champanhe continuam graúdos, tenros e saborosos, complementados por um caviar de boa qualidade, servidos na companhia de um simplório arroz no mesmo molho (R$ 161).
Fora do menu, por R$ 38, o garçom sugeriu como entrada um clássico italiano muito bem-feito: ragu de linguiça toscana sobre polenta cremosa. O tipo de preparo que vale entrar para o time titular.
Das massas, optei pela Fantasia de pasta recheada. Só pelo nome. O cardápio tem de saber vender também. Acredito ter sido um tanto acertado. Trata-se de um prato de várias provas de raviólis da casa. São quatro sabores, unificados por sálvia crocante e pelo ótimo molho de tomate, servido à parte: brie, mussarela de búfala, cordeiro e cogumelos (R$ 61).
Da próxima vez, vou arriscar provar algum risoto. Vocês, a essa altura, devem conhecer minha birra com esse clássico italiano. Em Brasília, geralmente, chega à mesa sem sabor e ao ponto de papa.
Dessa vez, acertei em cheio nas sobremesas.
É muito difícil encontrar em Brasília uma musse de chocolate tecnicamente tão bem-feita como a do La Tambouille. Aveludada, aerada, com açúcar equilibrado, sem deixar transparecer o retrogosto dos ovos. Foram R$ 18 muito bem gastos. Outra bola dentro veio com o tiramisu (R$ 26). Correto, sem invenções tolas, sem parecer uma torta gelada como encontramos por aí. Melhor que essa só o do Gero mesmo (acrescente mais uns R$ 20).
O importante de se notar no La Tambouille seria o legado de Bolla. Como um bom italiano, respeita o valor da massa fresca, das técnicas e da diversidade de ingredientes ofertados, embora sinta falta de mais presença de vegetais dentre as possibilidades de guarnições. Vencida a barreira de toda aquela pomposidade burguesa dos tempos de outrora, encontra-se ali hospitalidade e uma comida muito boa… se souber escolher.
La Tambouille
ParkShopping, Espaço Gourmet, Guará. Telefone: (61) 3047-5925. Das 11h30 às 15h e das 19h à 1h. Sábado sem intervalo; domingo só almoço até as 18h. Ambiente interno. Estacionamento. Manobrista: R$ 25 (shopping). Wi-fi. Aberto em 2011