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D’Lurdes preserva o espírito caseiro da tradição mineira

Funcionando exclusivamente em Águas Claras, estabelecimento começou servindo feijoada e hoje expande seu cardápio para pratos diversos

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1 de 1 05052014_DLurdes_0090 - Foto: Divulgação

Por ter sido fundada por um mineiro e compartilhar de semelhante bioma, Brasília deve muito à formação de sua culinária às tradições de Minas Gerais. Dos quitutes de fazenda (biscoitos, petas, bolos) à galinhada e o torresmo, todo esse repertório é facilmente assimilado pela ainda jovem cultura brasiliense. É de se espantar, portanto, como há tão poucos restaurantes de excelência dedicados a esta gastronomia.

Um desses, cujo tempero ainda está à altura da melhor memória de infância, de casa, da roça, é o D’Lurdes, um dos almoços mais badalados do Guará na última década e que, há mais de um ano, deixou o endereço original para funcionar exclusivamente na segunda unidade fundada em Águas Claras há três anos.

A comida simples, mas bem temperada de dona Lurdes Nunes Cardoso, não perdeu muito de sua cancha com a mudança de localidade. Preservou a maior parte da sua essência e se abriu para uma certa gourmetização. O cardápio que começara apenas com a feijoada, vendida em marmitas a preço popular pela janela da casa de Dona Lurdes por iniciativa de seu filho e sócio Carlos Augusto, hoje ostenta costela suína ao barbecue, salmão ao molho de alcaparras e sempre algum prato com mais salada e grãos para aderir à demanda fitness.

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Embora tenha aberto espaço para as cozinhas internacional e funcional um tanto genéricas por força do negócio, o D’Lurdes conseguiu manter um certo espírito roceiro, ainda que sob a batuta do chef Anderson Ferreira, quem está há alguns anos à frente dos fogões da casa. Mas cozinhar é transmissão de saberes. E isso Lurdes fez muito bem para sua brigada.

Havia uma característica mais genuína da casa (literalmente) de dona Lurdes no Guará. Parecia mais acolhedora, afinal repastávamos na sala da anfitriã, que era quem estava na cozinha. Em Águas Claras, o esforço foi de mimetizar as características do interior com móveis de madeira de demolição, panos coloridos e decoração alusiva às antigas casas de fazenda.

Numa cidade tão plastificada como Águas Claras, nascida da especulação imobiliária e de crescimento improvisado, entrar no D’Lurdes confere uma tímida sensação de fuga da cidade grande, como se ao redor não houvesse tantos espigões de concreto.

Acerca do cardápio, a cozinha de D’Lurdes ainda entrega uma costela ao barbecue tecnicamente bem feita, apesar do molho industrializado. Não voltaria ao restaurante por esses modismos aos quais aderiu. Ficaria muito mais feliz se este mesmo corte suíno viesse fritinho sobre uma canjiquinha, por exemplo.

É aí que a experiência de se comer no D’Lurdes se torna algo muito mais genuíno e interessante – e ainda bem que muito preservado. Como o menu muda a cada dia (sempre com cinco opções), é importante ficar atento para o calendário. Quarta-feira é, certamente, o dia de minha predileção. Há poucas coisas tão bem elaboradas quanto a rabada de dona Lurdes. Cozido em caldo muito temperado, sem invenção, é servido com agrião novo, um angu absolutamente aveludado, sem falar no feijão feito do jeito certo: grão inteiro e caldo espesso.

A comida farta também é outro indicativo de que o raio gourmetizador não chegou a fazer um estrago na evolução da cozinha de D’Lurdes. Lembro quando ainda no Guará II comi pela primeira vez a feijoada de Lurdes, prato inaugural do empreendimento. Era quase que um rodízio. Havia aquela informalidade no atendimento em que os garçons deixavam o cliente à vontade para solicitar reposição de qualquer prato.

Hoje, o serviço profissionalizou-se e não há mais esta cortesia (ao menos não anunciada). Há, certamente, um lado positivo na qualificação do empreendimento outrora familiar. As panelinhas em que as porções são servidas à mesa, a rapidez e prontidão no atendimento e a variedade dos produtos ofertados conferem à D’Lurdes muito mais expressão. Ora, a nova casa teve o luxo de agregar para si um café, com pastel, tapioca, sequilhos, bolos e demais quitutes para se levar para casa.

Mas permanece no cardápio de D’Lurdes o item suprassumo da hospitalidade mineira: Tiquim de cada. Por R$ 119 você recebe à mesa uma porção reduzida de todos os pratos do dia. Serve bem quatro pessoas e enterra de uma vez aquele arrependimento de se escolher um prato e desejar o do vizinho. A grama é verde para todos.

De noite, D’Lurdes já se torna uma experiência para glutões e quem está interessado apenas em fartura a baixo custo. Desde o Guará era assim. Paga-se a bagatela de R$ 29 para um rodízio que inclui uma babel de sabores: os ótimos caldos da casa, mas também pizza, massas (até yakissoba) e risotos.

Colocando na balança, D’Lurdes é uma casa que se esforça para se ater à identidade da comida mineira tradicional, com uma mão boa para o tempero, mas que se dispersa um bocado ao oferecer demasiada variedade. É algo que pode ser muito bom para a sustentabilidade do restaurante enquanto negócio. Por outro lado, corre o risco de esconder aquilo que faz com excelência.

D’Lurdes Delícias de Minas
Avenida Castanheiras, Rua 33/34 Norte, Ed. Beverlly Hills Plaza, Águas Claras. Tel: (61) 3204-3283. Das 11h às 15h e 18h às 23h. Ambiente interno e externo. Wi-fi. Estacionamento. Desde 2008

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