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Furacão em Portugal provoca menos estragos do que a política no Brasil

Apesar do alerta dos meteorologistas, passagem do Leslie não afetou a rotina dos portugueses e nem mereceu registro no Brasil

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1 de 1 furacão - Foto: iStock

Não sou daqueles muito chegados a assistir ao noticiário na televisão. Já os portugueses curtem mesmo, tanto que é comum em restaurantes e lanchonetes haver monitores sintonizados para os clientes. Pois na sexta-feira passada, dia 12 de outubro, uma noite quente em Lisboa, passando diante de um restaurante brasileiro de rodízio de carnes, eis que as telas dentro do salão estampavam: “Furacão Leslie chega amanhã a Portugal”. Forcei a vista como se isso me fizesse enxergar melhor através dos óculos e estava lá: “Leslie se aproxima da Ilha da Madeira”, junto daquele mapinha que só os meteorologistas entendem, cheio de cores e com um redemoinho em cima do Atlântico.

Não entendi nada. Se fosse na Flórida, as pessoas já estariam se preparando para uma guerra, estocando comida e água, colocando sacos de areia diante das portas e alertas espalhados por todos os pontos das cidades. Em Lisboa, total calmaria. As ruas cheias de turistas, verdadeira Torre de Babel. Cruzando as ruas a nova febre da cidade: patinetes (que aqui se chamam trotinetes) elétricos, que você aluga por meio de um aplicativo e pode largar em qualquer ponto da cidade.

No sábado, o dia fatídico do Leslie amanheceu com céu claro e nenhum sinal de tragédia. A previsão era da passagem do furacão entre as 22 horas e as quatro da manhã já no domingo. De novo, o dia transcorreu como se todos os moradores da cidade fossem alienados em relação às notícias. Nenhum pânico, nenhum alerta. Até levei as crianças a uma festinha infantil. Tentando puxar assunto, comentei com o pai da aniversariante: “E o furacão, hein, preparado?” Ele deu de ombros: “Que nada. Só uma tempestadezinha tropical. Um bocadinho de vento e é tudo. Assistes à CMTV? A coisa é deste tamanhinho e eles fazem deste tamanhão”. Ele fazia com os dedos quase juntos e abria os braços para exemplificar. E quem seria eu para discordar.

Deixei as crianças em casa e, imbuído do espírito de caçador de furacões, peguei o carro e dirigi para uma praia onde imaginei que a agitação já tivesse começado. Eram ainda oito da noite, mas o vento fortíssimo, a chuva fininha e as ondas altas impediam de ficar muito tempo a contemplar o “espetáculo”. Voltei para casa e, no caminho, alguns restaurantes já fechados, o centro da vila onde moro quase deserto e os policiais já desviando o trânsito para quem tentava seguir pela orla.

De volta à segurança da casa, o jeito era abrir um vinho e acompanhar os efeitos da passagem do Leslie pelo noticiário da TV. Do lado de fora, observava as árvores se curvando ao vento, que zunia pelas frestas das janelas. Confesso que se eu estivesse totalmente alienado, apenas acharia que estava ventando demais.

Não fiquei acordado até as quatro da manhã, mas os efeitos do furacão fizeram sentir-se mais ao norte de Portugal. Pelo balanço das autoridades, nada catastrófico, apesar de este ter sido um fenômeno incomum, uma tempestade pós-tropical no jargão técnico, a ser estudada pelos cientistas. Um morto, 27 feridos, 61 desalojados, 324 mil pessoas sem luz.

Para nós, brasileiros, nada diferente do que qualquer temporal forte em São Paulo ou Rio de Janeiro é capaz de causar. No domingo de manhã, acordei, cedo e espiei pela janela. Tudo no lugar, algumas folhas a mais caídas no jardim. Só isso. Saí para comprar pão e tudo estava tranquilo. Visito os portais de notícias brasileiros e me frustro. Nenhuma notinha sequer sobre o furacão português. Entendo: o furacão na nossa política certamente tem o poder de causar maior destruição.

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