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Black Friday não empolga consumidores em Portugal

Viver no país todos os dias nos dá pistas dessa ausência do consumismo entre os portugueses, e detalhes mostram o que tem valor para pessoas

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Rafaela Felicciano/Metrópoles
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1 de 1 Rafaela Felicciano/Metrópoles - Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Mesmo longe do Brasil, minha caixa de e-mails é inundada todos os dias com as ofertas da Black Friday brasileira. Os meus colegas publicitários sofisticaram a data e a ampliaram para o mês inteiro com suas variações de nome. Tem a Black Week, a Green Week, o Esquenta Black Friday, o Aperitivo Black Friday e o Novembro Negro, só para rivalizar com datas tão importantes como o Outubro Rosa e o Novembro Azul. O negócio é vender, vender, vender, com ofertas nem sempre tão verdadeiras assim. E na sequência, dá-lhe Natal, com os já esperados sorteios de carros, viagens e brindes de panetone.

Li recentemente que havia um movimento no Brasil que tencionava mudar a Black Friday para o final de outubro, para não atrapalhar as vendas do Natal. Esquecem que a Black Friday em tese ocorre sempre depois do Dia de Ação de Graças norte-americano (Thanksgiving Day). É hilário. Daqui a pouco vão querer mudar a data do Natal para não encavalar com o Ano Novo e postergar o Dia dos Namorados para não atrapalhar o Dia das Mães.

Enfim, em Portugal, haverá sim a Black Friday. Que ocorrerá, como o próprio nome diz… na sexta-feira que vem, apenas e tão somente. Os grandes sites de e-commerce, a par das ofertas normais da semana, anunciam discretamente, por meio de banners, a data que se aproxima. Mas nada de contagem regressiva ou grandes estardalhaços de varejo.

Por que essa calmaria toda no comércio?

Porque provavelmente, na sexta que vem, não haverá multidões nas filas durante a madrugada, esperando ansiosas a abertura das portas das lojas. Não haverá consumidores se estapeando para levar aquela pesada TV de 60 polegadas nos braços. Os sites de vendas não ficarão congestionados.

Tudo isso porque a relação dos portugueses com o consumo tem outra dimensão. Ninguém se endivida no cartão de crédito, parcelando as compras em 12 vezes sem juros, até porque não há essa opção nas lojas ou nos cartões. Compra-se à vista no cartão. Mesmo que os juros ao ano sejam menores aqui que os astronômicos juros ao mês brasileiros, as pessoas vão até onde a mão alcança.

A decisão de adquirir uma TV 4K de última geração não é uma compra por impulso. É uma escolha que certamente envolveu toda a família.

Os shoppings portugueses não farão promoções de Natal com sorteios e brindes para atrair os consumidores. O Papai Noel (ou o Pai Natal, como é conhecido aqui o Bom Velhinho), fiquem tranquilos, estará lá em seu trono, esperando as crianças e ofertando rebuçados (as balinhas, no nosso português brasileiro). A decoração será discreta, lembrando a data, mas sem aquele brilho que torna os shoppings brasileiros uma atração por si sós, independentemente das compras.

Interessante, porque a vida em Portugal todos os dias nos dá pistas dessa ausência do consumismo nos portugueses. São detalhes que mostram o que tem valor para as pessoas. Os apartamentos de luxo não têm quatro vagas nas garagens, simplesmente porque os seres humanos normais não têm quatro carros. Carros dos quais as pessoas cuidam de fato, uma vez que não se troca de automóvel todos os anos.

Você certamente conhece alguém que troca de celular assim que é lançada a nova geração. Só para ostentar, porque nas grandes cidades brasileiras não vai poder nem utilizá-lo nas ruas, com medo de ser assaltado.

Os armários das casas são pequenos, ou seja, foram feitos para guardar as roupas que são efetivamente usadas. Não há espaço para uma coleção de sapatos ou para uma dúzia de vestidos de verão. Lembrando que, para complicar a questão do espaço, os europeus precisam ter um guarda-roupa de verão e outro de inverno. Diferente da tropicalidade brasileira, que permite surfarmos as diferentes estações com poucas variações de temperatura.

A cultura popular diz que alguns peixes crescem conforme o tamanho do aquário. A sensação que eu tenho é que o Brasilzão nos tornou muito espaçosos e, quando vimos para Portugal, temos que nos adaptar às dimensões deste pequenino país.

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