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Projeto no Nordeste do Brasil inspira programa contra seca na África

Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação lança iniciativa que prevê 1 milhão de cisternas na região do Sahel

Autor José Graziano da Silva

atualizado

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seca na áfrica
1 de 1 seca na áfrica - Foto: null

Neste fim de semana estarei na região de Dargue, no Niger, uma das áreas mais pobres da África e, muito provavelmente, do mundo. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) tem trabalhado incessantemente, em conjunto com o Programa Mundial de Alimentos (PMA) e o Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (Fida), para combater a fome e ajudar comunidades rurais a vencer as secas prolongadas, exacerbadas pelos catastróficos efeitos da mudança do clima.

Como parte desses esforços, lançaremos a primeira unidade das 1 milhão de cisternas para o Sahel, projeto inspirado na bem-sucedida experiência que temos presenciado no semiárido nordestino desde o início dos anos 2000. O Sahel é uma região situada entre o deserto do Saara, ao norte, e a savana do Sudão, ao sul; e entre o Oceano Atlântico, a oeste, e o Mar Vermelho, a leste.

Naquela época, uma cena era muito comum no Nordeste: mulheres carregando sobre a cabeça, durante horas a fio, baldes pesados de água coletada em represas que ficavam a longas distâncias de suas casas. Na maioria das vezes, essa água não era segura para ingestão e também não era suficiente para suprir outras necessidades das famílias durante os longos períodos de seca.

Para solucionar o problema, organizações locais, como a Articulação do Semiárido (ASA), elaboraram a ideia de captura e armazenagem de água pluvial em cisternas durante o período chuvoso. A água da chuva ali depositada fica à disposição das famílias nos períodos de estiagem, que duram até seis meses por ano.

Assim nasceu o projeto de construir 1 milhão de cisternas na Região Nordeste do Brasil. Era uma solução sustentável e relativamente barata – uma cisterna custa cerca de US$ 2 mil, pouco menos de R$ 8 mil. Concebida pela população local, a ideia das cisternas foi impulsionada pelo conceito de “sertanejo”, que significa “conviver com o semiárido” em vez de simplesmente tentar combatê-lo.

Como costuma dizer o ex-presidente Lula, “a gente não pode evitar uma seca, mas pode evitar que ela traga fome e force as pessoas a migrarem”.

Por meio do Programa Fome Zero, o governo brasileiro abraçou o projeto logo que foi implementado, em 2003, e o financiou, trabalhando em parceria com as organizações locais e fortalecendo as potencialidades da população rural. Em 2014, o primeiro milhão de cisternas foi atingido.

Políticas públicas
Esse objetivo foi cumprido como parte de um conjunto de políticas públicas que garantiram melhores condições de vida para os brasileiros, incluindo o Bolsa Família e o apoio à agricultura familiar, com o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e o Programa Garantia Safra.

O resultado disso é que, mesmo quando é afetada pela seca severa, como aconteceu em 2012, a região não experimenta mais os efeitos catastróficos do passado, como a migração em massa, saques e mortes.

E as mulheres não precisam mais passar horas coletando água, podendo estar disponíveis para procurar melhores empregos, empreender, cuidar de si mesmas e de seus filhos.

Combate à desertificação
No ano passado, o Programa Brasileiro das Cisternas foi premiado como uma das políticas públicas mais relevantes no combate à desertificação, em parceria da World Future Council com a Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação (UNCCD).

Na África, o desafio é ainda maior. Precisamos do apoio de toda a comunidade internacional para alcançarmos a meta das 1 milhão de cisternas. Trata-se de passo crucial para que aquelas famílias consigam reunir condições mais duradouras de conviver com as secas e de, assim, construir um verdadeiro Sahel sertanejo.

*José Graziano da Silva é diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO)

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