Movimento global nos faz refletir: afinal, quem faz as nossas roupas?
Você já parou e se perguntou quem fez suas roupas? Como foi feito o cultivo do algodão e o uso da água empregada na fabricação de tecidos e vestimentas? Quais as condições de trabalho das pessoas envolvidas nessa cadeia produtiva? Essas reflexões foram o centro do debate da Semana Fashion Revolution, realizada ao redor do […]
Iara Vidal
atualizado
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Você já parou e se perguntou quem fez suas roupas? Como foi feito o cultivo do algodão e o uso da água empregada na fabricação de tecidos e vestimentas? Quais as condições de trabalho das pessoas envolvidas nessa cadeia produtiva? Essas reflexões foram o centro do debate da Semana Fashion Revolution, realizada ao redor do mundo – e também aqui em Brasília – entre os dias 23 e 29 de abril.
O Fashion Revolution, como o próprio nome sugere, dedica-se a uma revolução na moda. Trata-se de um movimento global presente em 92 países, formado para questionar e discutir os impactos dessa indústria na vida das pessoas e para lutar por uma transformação no mercado fashion. A iniciativa foi criada após a tragédia causada pelo desabamento do edifício Rana Plaza, em Daca, capital de Bangladesh, em 24 de abril de 2013.
O prédio abrigava diversas confecções. Houve mais de 1 mil mortos, em especial mulheres e crianças, e 2,5 mil feridos. O desastre fez cidadãos de todo o mundo olharem com mais atenção para a cadeia de produção da moda, o modelo fast fashion e as pessoas por trás das roupas que vestimos.
Para marcar os cinco anos do trágico episódio, a campanha Fashion Revolution de 2018 trouxe este tema: cinco anos após Rana Plaza. Como representante do movimento no Distrito Federal, minha missão neste ano foi tecer uma rede de apoio e mobilizar a cidade, durante programação construída por uma teia de parcerias engajadas, comprometidas e talentosas.
Elaborada por várias mentes e mãos, a agenda teve um propósito: democratizar a discussão sobre moda consciente, envolvendo, pelos quatro cantos deste quadradinho, familiares e colegas de trabalho, academia, escola, universidade, postos de combustível, restaurantes… Se você usa roupa, faz parte desse debate. Assim, as atividades se desenrolaram em cinco regiões do Distrito Federal: Plano Piloto, Águas Claras, Guará, São Sebastião e Taguatinga. Foram realizados dois seminários, quatro sessões do documentário River Blue, cinco rodas de manualidades, duas mobilizações populares, 10 oficinas, duas trocas, um brechó e o concurso Miss Catadora.
Da “Rodô” ao Congresso
E a programação começou logo por um dos pontos mais democráticos do Distrito Federal, por onde passam, diariamente, moradores de todas as regiões brasilienses e também do Entorno. A primeira atividade ocorreu no dia 23 de abril, das 11h às 13h, na Rodoviária do Plano Piloto, com mobilização popular na plataforma inferior e roda de manualidades com bordado, tricô e crochê.
Lá na “Rodô” montamos um “lambe-lambe” Fashion Revolution. Passageiras e passageiros puderam conhecer o movimento e tirar uma foto com nossa plaquinha “Quem Fez Minhas Roupas?”. Na terça, 24 de abril, das 8h às 9h, repetimos a dose na estação central do Metrô de Brasília.
Se tem gente que torce o nariz para a política, acredito nela como via única para a transformação. Por isso, fiz questão de levar o movimento também ao Congresso Nacional. Nenhum político apareceu, nosso quórum foi baixo, não tivemos transmissão ou registro na íntegra em audiovisual, nem mesmo em internet, nos diversos veículos da Câmara e do Senado. Ainda assim, o balanço é positivo. A chegada do Fashion Revolution ao parlamento brasileiro é um símbolo importante. Chega de muros. Precisamos de pontes.
Ao longo de semanas, eu tentei uma agenda com o presidente do Senado Federal, senador Eunício de Oliveira. Infelizmente, não tive sucesso. Gostaria de ter falado, em nome do Fashion Revolution Brasil, sobre o PLC 105/2014. A matéria está pronta para ser incluída na pauta de votação do plenário e busca informar e conscientizar a população sobre a necessidade de adequação das tendências da moda e de vestuário à sustentabilidade ambiental.
Ainda com viés político, tivemos aqui em Brasília, na tarde de 25 de abril, o Seminário Mercado Local da Moda Consciente, realizado em parceria com a presidência da Câmara Legislativa do Distrito Federal e que contou com participação de empreendedores e especialistas no mercado de moda consciente do DF. Houve painéis sobre moda circular (brechós, armários compartilhados e aluguel de roupas), mercado autoral (histórias de marcas, tingimento natural, manualidades e iniciativas sociais), negócios colaborativos (lojas colaborativas, suporte a criadores e coworking) e mercado local.
Miss Catadora
Contudo, entendo a moda como ferramenta de transformação social e empoderamento feminino. Por isso, a atividade dessa Semana Fashion Revolution 2018 da qual mais me orgulho é o concurso Miss Catadora (foto em destaque). Trata-se de verdadeiro exercício de reúso de elementos que são lixo para muitos e meio de vida para tantos outros, especialmente mulheres.
Fruto de uma parceria com o projeto Reciclando o Futuro, tocado por Renata D’Aguiar, o “concurso” possibilitou a catadoras de material reciclável a oportunidade de mostrar talento e criatividade com a produção de roupas a partir do “lixo”. A final ocorreu no encerramento da semana, no dia 29 de abril, no MimoBar. A vencedora foi Gisele Santos, brasiliense de 30 anos que transformou em roupas caixas de ovos, lacres de latas de alumínio, papéis, vasilhames de plástico, garrafas PET e fitas VHS. Ela ganhou uma bolsa integral para o curso de costureira na unidade de Ceilândia do Senac-DF.
Durante a Semana Fashion Revolution 2018 em Brasília, teve início uma atividade que prosseguirá no meu blog ao longo do ano: o mapeamento de costureiras do Distrito Federal. A ideia é mostrar quem são as mulheres que participam desse processo e trazer mais transparência e consciência, de forma a ampliar o reconhecimento e a valorização de quem se dedica à arte da costura.
Estou recebendo fotos e vídeos de costureiras (alfaiates também!) para mostrar quem, afinal, produz as nossas roupas. Se quiser contar a sua história, envie e-mail para iara.vidal73@gmail.com.
* Iara Vidal é jornalista, mantém o blog Consumo Consciente e é representante do Fashion Revolution em Brasília