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Macri prometeu e não cumpriu, logo perdeu as prévias na Argentina

Para evitar o Efeito Orloff, não bastará a Bolsonaro dizer que está fazendo o certo, é preciso que o povo sinta que sua vida está melhorando

Autor Hélio Doyle

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Elza Fiuza/Agência Brasil
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1 de 1 EF_Mauricio_Macri_Argentina_Entrevista_04122015_007 - Foto: Elza Fiuza/Agência Brasil

A frase de James Carville, o consultor de Clinton, já está batida e surrada, mas resume o que ocorreu na Argentina nesse domingo (11/08/2019), com a estrondosa vitória dos peronistas da chapa Fernández-Fernández (47%) sobre o presidente Maurício Macri (32%), que busca a reeleição: “É a economia, estúpido”.

Os maus resultados da política econômica, o corte de gastos sociais, o crescente empobrecimento da classe média e dos segmentos mais vulneráveis da população e a deterioração da sociedade argentina derrotaram o projeto neoliberal de Macri.

É verdade que o candidato a presidente Alberto Fernández e sua vice, Cristina Fernández de Kirchner, ainda não estão eleitos, pois essas foram apenas eleições prévias para definir os candidatos a diversos cargos de cada coligação. Mas a diferença de 15 pontos que os separa de Macri e de seu vice, o peronista renegado Miguel Ángel Pichetto, muito dificilmente será superada na eleição para valer, em 27 de outubro. Se tiver mais de 45% dos votos ou 40% com uma diferença de 10 pontos sobre Macri, Fernández será eleito no primeiro turno.

Os resultados das prévias mostram a polarização entre peronistas e macristas. Em 2015, Macri ganhou fazendo oposição a Cristina, desgastada após dois mandatos como presidente da República. As muitas expectativas criadas por Macri se frustraram e, agora, os peronistas levaram a melhor. O terceiro colocado nas prévias, Roberto Lavagna, que foi ministro da Economia do peronista Nestor Kirchner, teve apenas 8,2% dos votos.

Bolsonaro perde também

A derrota de Macri e de seu projeto neoliberal é também uma derrota política e diplomática para o presidente Jair Bolsonaro. Contrariando, como tem feito, a boa norma das relações internacionais de não interferir em assuntos de outros países, Bolsonaro manifestou-se mais de uma vez a favor da reeleição de Macri e criticou asperamente, ao seu estilo, Cristina e os peronistas. Em resposta, Alberto Fernández veio ao Brasil e visitou o ex-presidente Lula na prisão de Curitiba.

Bolsonaro também se enredou na polarização da política argentina: entre a direita e a esquerda, é claro que apoia a direita. Deveria, porém, ter ficado calado, pelo bem de Macri e do Brasil. Macri não é da extrema-direita e o apoio de Bolsonaro o incomoda e o prejudica, pois os argentinos rejeitam massivamente a ditadura militar que vigorou no país e não têm simpatia pelo presidente brasileiro. O candidato argentino que mais se aproxima das ideias de Bolsonaro, Juan José Gómez, teve apenas 2,64% dos votos.

A provável eleição dos peronistas, além de quebrar a hegemonia da direita na América Latina (especialmente se a Frente Ampla for vitoriosa no Uruguai e Evo Morales for reeleito na Bolívia), poderá afetar as relações do Brasil com a Argentina – o que não é bom para nenhum dos dois países.

Se Bolsonaro insistir em seguir a linha sectária de Olavo de Carvalho e Ernesto Araújo nas relações com o possível futuro governo argentino, como já fez nesta segunda-feira, ficará mais difícil para Fernández recorrer ao pragmatismo político para não prejudicar as relações com o Brasil e garantir sobrevivência ao Mercosul.

O “mercado” não resolve tudo

O que as eleições prévias na Argentina também mostraram é que os chamados ajustes fiscais e medidas de austeridade têm, em uma democracia, de considerar não apenas o que pensa e quer o “mercado”, mas também o atendimento às necessidades da população, especialmente dos mais pobres. A pretensa racionalidade dos formuladores das políticas econômicas e sociais, que imaginam não haver soluções fora de seus conceitos, dogmas e certezas, esbarra na insatisfação popular com a falta de resultados concretos e melhorias reais em suas vidas.

Macri prometeu muito, deu esperanças ao povo, e pouco cumpriu. O desemprego e a pobreza aumentaram, há mais miséria, os serviços essenciais caíram de qualidade, os investimentos estrangeiros não apareceram e a economia estagnou. Sua justificativa, a mesma de todos os governantes que não conseguem resolver os problemas, é de que a herança foi pesada e a oposição não o deixou fazer tudo o que precisava ser feito. Há os que o criticam por não ter ido a fundo nas políticas neoliberais – como se Macri fosse imperador, não presidente.

São argumentos que, além de autoritários, não pegam na maioria da população, pois partem do princípio de que apenas um grupo sabe o que é bom e o que é ruim para o país e, por isso, as propostas alternativas devem ser deixadas de lado. Só que, quando não veem resultados no que o governo faz, é natural que os eleitores busquem novos caminhos. Como fizeram os portugueses, com sucesso nos resultados para o país e para a população, ao substituir o governo de centro-direita pelo de centro-esquerda. A vida em Portugal, agora, está bem melhor.

Afinal, o que prevalece mesmo é a economia, e Bolsonaro deve ter cuidado com o Efeito Orloff, aquele do “eu sou você amanhã”.

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