Jorge Laffond: o artista que iluminou os palcos, o samba e as telas
Jorge Laffond completaria 72 anos de idade em 29 de março: ator e dançarino merece todas as homenagens
Rodrigo França
atualizado
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No dia 29 de março, o ator e bailarino Jorge Laffond completaria 72 anos de idade. Qualquer homenagem ainda será pouco pelo tanto que ele contribuiu para o cinema, televisão, dança e pelo teatro no Brasil.
Conheci Jorge quando eu tinha 14 anos. Eu estava começando a minha carreira de ator. Era no saudoso Teatro Suam, em Bonsucesso – zona norte do Rio de Janeiro. Aquele homem com quase dois metros de altura brilhava. Era um artista sério, comprometido. Chegava cedo e ficava concentrado no camarim. O ponto forte era ele mesmo passando o aparelho de barbear descartável para ficar careca. Era seu ritual.
Jorge tinha uma respeitável carreira acadêmica. Estudou balé clássico e dança africana, chegando a trabalhar com Mercedes Batista – primeira bailarina negra do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Formou-se em Artes Cênicas pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ) e em Educação Física pela Universidade Castelo Branco.
No cinema, em alguns filmes, como Rio Babilônia, Bete Balanço e Leila Diniz, sua presença cativante brilhou em papéis que ganharam vida, encantando plateias e imortalizando momentos que perduram nas telas. Cada cena que habitou foi enriquecida pela sua paixão, talento e entrega, mostrando que o cinema brasileiro deveria reverenciá-lo.
Na televisão, sua figura carismática atravessou as telas e se instalou nos lares brasileiros, levando humor, emoção e uma energia contagiante. Reza a lenda que quando Laffond entrava em cena com a sua personagem Vera Verão no programa A Praça é Nossa aumentava três pontos de audiência. Uma drag queen feita por um ator negro retinto e gay nos anos 1990, em um programa para chamada família tradicional brasileira. Jorge era deliciosamente subversivo. No Carnaval, tornou-se uma lenda, um ícone da folia brasileira. Com sua presença marcante, seus trajes exuberantes (muitas vezes nu ou seminu) e sua alegria contagiante, Jorge Laffond brilhava nos desfiles, nas festas, nos corações dos foliões que viam nele não apenas um artista, mas um símbolo da festividade e da diversão que o Carnaval representa.
Em uma pesquisa para o espetáculo Jorge Pra Sempre Verão, onde assino a direção, seus colegas da televisão, dança e teatro sinalizaram as mesmas coisas – Jorge chegava com o texto decorado, cumpria brilhantemente tudo que tinha que fazer e ia embora. Sem fofocas de bastidores. Sempre muito gentil e generoso. A dramaturga e produtora Aline Mohamad, que assina a dramaturgia com Diego do Subúrbio, era prima do Jorginho. Apelido carinhoso que usa no texto teatral. Mohamad escreveu uma personagem que representa todos nós: a sociedade. Nos mostra o quanto a homofobia nos distancia daqueles e daquelas que se retirarmos o filtro do preconceito poderemos enxergar penitência, afeto. Jorge era assim.
A tal família brasileira, em sua contradição, amava na TV aquela figura de salto altíssimo, vestido e batom, mas xingava usando os nomes “Laffond” e “Vera Verão” para ofender aqueles que eram negros e que não performavam um comportamento heteronormativo. Hoje, vejo muitos jovens que só conheceram Jorge pela internet e se orgulham em serem chamados de “Vera Verão”. Diversos coletivos, grêmios estudantis, centro acadêmicos foram batizados de “Jorge Laffond”. Sim, ele ultrapassou gerações, mesmo a sua partida tendo sido em 2003.
Seu legado transcende o tempo, inspirando que levemos a vida, apesar dos pesares, com paixão, autenticidade e alegria, assim como ele fez em cada momento de sua vida dedicada à arte.
Jorge Laffond para sempre em nossos corações, eternizado na história da cultura brasileira como um dos grandes mestres.
P.S.: O espetáculo teatral “Jorge pra sempre Verão” finalizará no dia 30 de março a sua temporada no Teatro Correios Léa Garcia, no Rio de Janeiro, quinta a sábado às 19h. Entrará em turnê pelo país. Em cena Alexandre Mitre, Aretha Sadick e Erika Marinho e Noemia Oliveira.