Governo Bolsonaro escolhe nomes para confundir luta por direitos
Porta-vozes informais da nova ordem antiesquerdista podem ser de grupos socialmente vulneráveis, mas negam a luta por direitos igualitários
Luciana Lima
atualizado
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Uma das grandes armas do governo de Jair Bolsonaro tem sido a escolha de seus porta-vozes informais. Em meio à ideologia antiesquerdista da nova ordem, os nomeados para algumas das mais importantes funções no país e até em representações internacionais gozam de característica comum: representam grupos socialmente vulneráveis, como negros, mulheres e índios, mas negam a luta por direitos igualitários construídos por décadas no país.
As posições do novo presidente da Fundação Palmares, por exemplo, mostraram mais uma vez essa face. Sérgio Nascimento de Camargo é jornalista e militante de direita e assumiu a presidência do órgão responsável promoção da cultura afro-brasileira. Em sua face está estampada sua principal qualificação para o cargo: é negro.
Camargo, no entanto, defende posições de dar um nó na cabeça de quem luta por afirmação em uma sociedade na qual o cabelo crespo é “ruim”, que confina o negro em áreas periféricas das grandes cidades e que tem uma polícia que define, pela aparência, a culpa. Ele nega a existência do racismo, defende o fim do Dia da Consciência Negra, já disse que a escravidão foi benéfica para os descendentes e pregou a extinção do movimento negro.
Embora em áreas diferentes, Camargo cumpre para o governo Bolsonaro a mesma função que cumpriu a youtuber indígena Ysani Kalapalo, levada à Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas pelo presidente brasileiro, que usou sua imagem para legitimar a sanha de mudar as leis brasileiras que impedem a mineração em terras indígenas. Moradora de São Paulo, a “índia de Bolsonaro” também confunde olhares mais desatentos ao comungar com o fim das demarcações das terras para seu povo.
A mesma lógica se estende à ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, que ora ofende a luta pela igualdade entre os gêneros com a definição de “menina veste rosa e menino veste azul”, ora se coloca como vítima do silêncio imposto ao seu grupo social: o de mulher. Para denunciar a falta de voz, ficou calada justamente diante de microfones, gravadores e câmeras de TV, todos dispostos a ouvi-la na entrevista em que ela mesma, uma mulher com voz, convocou.