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E se esse governador existisse?

Imagine um gestor com coragem para dizer “não” aos pedidos de contratação de protegidos e parentes de autoridades de outros Poderes

Autor Rômulo Neves

atualizado

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Toninho Tavares/Agência Brasília
Palácio do Buriti, Plano Piloto, Brasília, DF, Brasil 28/7/2017 Foto: Toninho Tavares/Agência Brasília.
1 de 1 Palácio do Buriti, Plano Piloto, Brasília, DF, Brasil 28/7/2017 Foto: Toninho Tavares/Agência Brasília. - Foto: Toninho Tavares/Agência Brasília

E se o Distrito Federal tivesse um governador que, além de ser considerado simpático e, até onde se sabe, não envolvido em nenhum caso de corrupção, também tivesse a coragem de inovar e romper com as velhas políticas?

E se esse governador fictício tivesse coragem, em nome das prioridades da população, de implementar políticas públicas inovadoras, sem se importar em perder o apoio das tradicionais lideranças políticas e dos financiadores de campanha, que teriam seus interesses contrariados? Um governador que colocasse o interesse coletivo à frente do pessoal, de reeleição.

E se houvesse um governador com coragem para implementar – de verdade – políticas de economia de recursos em todas as áreas, sem privilegiados, focando os gastos essenciais e prioritários? Um governador que tivesse coragem, por exemplo, de diminuir o valor das funções comissionadas para servidores de carreira, pelo menos no nível do governo federal, que é de 60% do valor cheio.

E se houvesse um governador que tivesse coragem de diminuir o valor dos cargos comissionados, a começar pelo seu próprio? Que tivesse coragem de ter entrado com ação direta de inconstitucionalidade contra os aumentos dados de maneira irregular, para não haver risco de o próximo governo pagar aumentos em razão de derrotas em ações judiciais isoladas, com o risco de criar jurisprudência para a concessão coletiva desses aumentos no futuro. Que diminuísse, a fim de reverter para outras áreas, os gastos com publicidade e tivesse liderança suficiente para cobrar isso também da CLDF.

E se houvesse um governador com coragem para assumir, de verdade, a prioridade com a educação, revisando as políticas de gastos nas áreas de cultura e esporte, por exemplo, para que fossem subordinadas à educação, com vistas à implementação do ensino em tempo integral, a partir dessa parceria?

E se houvesse um governador que tivesse coragem de propor a alteração do uso dos recursos do FAC, para esse fim? Que tivesse coragem de colocar, nos centros esportivos, educadores e profissionais da área e não obreiros religiosos. Que compreendesse que esporte e cultura não são peças isoladas, de cunho eleitoral, e que deveriam estar integradas às políticas de educação e segurança pública.

E se houvesse um governador que compreendesse que a solução para a saúde passa pela inversão dos investimentos no setor, com a valorização urgente, imediata e consequente da saúde primária, mais barata e mais eficiente no médio prazo, por meio de programas como o Saúde da Família, no qual o DF continua tendo a menor cobertura do Brasil? Que não reproduzisse o conceito “hospitalocêntrico”, de investimento em alta complexidade, passível de fraudes e desvios. Que não aceitasse, nessa área tão sensível, nenhum colaborador com histórico ou suspeita de desvio de recursos e de mau comportamento.

E se houvesse um governador com coragem de inovar na área da mobilidade? Um governador que tivesse coragem de contrariar os interesses dos donos das empresas de ônibus, revendo a licitação das linhas. Que tivesse coragem de contrariar os interesses de grandes detentores de licenças de táxis, propondo o fim da modalidade, com o ressarcimento das “chapas” aos titulares limitado a uma restituição por CPF. Que tivesse a coragem de implementar um serviço de transporte individual unificado, baseado na oferta e na procura, não no monopólio, com o justo pagamento de impostos ao Estado, mas sem a parafernália da regulação desse serviço, que funciona como feudo e serve para chantagem política, cabide de empregos e venda de facilidades. Um simples aplicativo de identificação e GPS seria o bastante.

E se houvesse um governador que tivesse a coragem de profissionalizar a administração do metrô, que cobrasse um plano claro de ampliação e ganho de eficiência, e que não aceitasse a perda de recursos não aplicados? Que compreendesse que esperar o ônibus por uma hora não é aceitável.

E se houvesse um governador que tivesse legitimidade bastante para negociar com o Ministério Público e pudesse, a partir do diagnóstico de que um dos principais problemas do DF e do Entorno é a falta de vagas de emprego, propor a criação de um polo industrial no eixo Taguatinga-Samambaia-Ceilândia-Águas Lindas, com algumas políticas de incentivo, com claros efeitos sobre a empregabilidade, a mobilidade, o crescimento da economia e a segurança?

E se houvesse um governador que desse atenção aos problemas da gestão e, no período de transição, se informasse sobre os problemas e soluções do DF, e não perdesse tanto tempo com as velhas negociatas por cargos e espaços dentro do governo? Que conhecesse o seu próprio plano de governo e que tivesse uma visão de mundo para apresentar aos seus interlocutores e, por isso, tivesse a legitimidade – e a coragem – para montar uma base de apoio na CLDF sustentada nesse plano e não nos interesses imediatos dos deputados.

E se houvesse um governador que tivesse coragem para dizer “não” aos pedidos de contratação de protegidos e parentes de autoridades de outros Poderes, do Judiciário, do Tribunal de Contas, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, da CLDF e de onde quer que fosse? Que dissesse: “Não, Excelentíssimo, meu governo vai ser outra coisa”.

E se houvesse um governador que tivesse coragem – e legitimidade – para dizer “não” a demandas exageradas das forças de segurança pública? Que tivesse legitimidade para dizer claramente que a remuneração da Polícia Civil não deve ser equiparada à da Polícia Federal, porque faz muito mais sentido que a equiparação fosse com as polícias civis de outros estados

E se houvesse um governador que pudesse dizer claramente que o Fundo Constitucional é para ser usado na educação, saúde e segurança, e não apenas na última, e que não faz sentido aumentos de salário numa situação de penúria da saúde? Que pudesse dizer com propriedade e segurança que há demandas da PM que são exageradas, considerando o resto da população. E que pudesse dizer tudo isso com o apoio da população, porque teria apresentado de maneira clara suas prioridades.

Mas esse governador precisaria dar o exemplo e ser firme em todas as ocasiões, para que todos os seus interlocutores soubessem que ele não estaria blefando, tampouco beneficiando desigual ou injustamente outros grupos, porque o que mais irrita as pessoas, de modo geral, não é terem seus interesses contrariados, mas serem injustiçadas.

Ninguém quer ganhar menos ou ter um pedido de aumento de salário ou recursos contrariado, mas as pessoas querem ainda menos que o interesse exagerado de outro seja priorizado sobre o seu. Se todos enfrentam as mesmas restrições e sabem que isso é acompanhado de responsabilidade na gestão, é mais fácil de as pessoas compreenderem e aceitarem.

E se tivéssemos um governador com autoridade e legitimidade para dizer não a todos os interesses escusos, exagerados ou improdutivos, em nome do bem coletivo?

E se houvesse um governador que tivesse credibilidade e liderança de quem costuma cumprir suas promessas e de quem tem palavra, porque sabe dizer “não”, porque sabe explicar suas prioridades, sabe aonde quer chegar e conhece os debates, os gastos e os temas, a ponto de não se deixar influenciar pelas demandas e sugestões impróprias de amigos?

E se houvesse um governador que colocasse as demandas da população e da sociedade acima de seu interesse próprio, a começar pelo desespero para garantir sua reeleição? Que, frente à crise do Estado – e ela é real e tende a se aprofundar –, tivesse coragem de tocar em problemas estruturais e não perdesse tempo com a perfumaria.

E se esse governador existisse?

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