Democracia interna faz falta aos partidos
Paula Bennett e outros candidatos a deputado federal são vítimas do caciquismo político
Hélio Doyle
atualizado
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A assistente social e ativista Paula Benett filiou-se ao PSB e trabalhou intensamente, nos últimos meses, para ser candidata a deputada federal. Seria, aliás, a primeira transexual a disputar uma eleição para a Câmara em Brasília. Mas, perto do prazo para registro de candidaturas, foi informada por seu partido que não haveria lugar para ela na lista. A alternativa será disputar a eleição para distrital.
O advogado Carlos Inácio e os gestores públicos João Francisco e André Rafael também estavam preparados para concorrer a uma cadeira de deputado federal. Os dois primeiros pela Rede e o outro pelo PDT. Mas seus nomes não foram incluídos nas listas desses dois partidos e a Carlos e João também foi dada a possibilidade de disputar a eleição para deputado distrital. Há inúmeros outros casos como os dos quatro, em diferentes legendas e alianças.
É natural que nem todos os pré-candidatos consigam integrar as listas formadas pelos partidos e coligações para as eleições proporcionais. Há um limite de candidatos – 16 para federal e 48 para distrital – e nem todos os pretendentes conseguem uma vaga, especialmente quando as legendas se coligam e é preciso dividi-las entre eles. Foi o que aconteceu com Paula, Carlos, João e André: a aliança entre suas siglas reduziu o número de candidatos de cada uma.
Além da frustração, os muitos pré-candidatos a deputado federal que tiveram de optar pela disputa por uma cadeira na Câmara Legislativa têm de enfrentar um complicado problema. A maioria já tinha se organizado e se preparado para a eleição “federal”, e feito acordos e dobradinhas com postulantes a distrital. Agora, estão disputando com eles e alguns vão concorrer na mesma faixa do eleitorado.
Os partidos têm o direito de decidir quem serão seus candidatos, em eleições majoritárias e proporcionais, e se há coligação é de esperar que as vagas destinadas a cada um sejam reduzidas. A questão, porém, é como é tomada essa decisão: por um pequeno grupo de dirigentes partidários, quando não por uma só pessoa, com critérios que só eles conhecem e que, muitas vezes, não podem mesmo revelar – a não ser como confissão de, no mínimo, infração à ética.
Critérios
Esses dirigentes vão dizer que o critério é a votação que cada candidato traz à coligação. Pode ser. Mas como estimar os votos que eles receberão? Geralmente, diz-se que o fulano teve x votos na última eleição, e a partir daí se calcula o quanto essa votação teria aumentado em quatro anos. Mas há inúmeros casos de votações que caíram de uma eleição para outra e é muito difícil prever quantos votos terá um postulante que nunca se candidatou.
Mais uma vez se cai em um dos maiores problemas do sistema eleitoral brasileiro: não há democracia nos partidos, salvo poucas exceções. Os filiados não têm oportunidade de se manifestar e participar da formação das chapas e as convenções são reuniões que apenas formalizam as decisões das cúpulas dirigentes, que ainda recebem delas mandato para mudar as listas depois, sem prestar contas a ninguém.
É assim que os partidos vão perdendo representatividade e prestígio, com dois movimentos opostos: aumenta a distância entre eles e os eleitores; e diminui a diferença entre eles próprios, cada vez mais parecidos uns com os outros. O resultado dessa conta é o constante afastamento das legendas da realidade social e a indiferença dos cidadãos diante deles. PSB, Rede e PDT, que se dizem progressistas, são hoje exemplos de caciquismo explícito e partidos sem expressão em Brasília.
A falta de democracia interna só faz piorar a rejeição aos partidos, e este é um bom tema para 2019: como democratizar as decisões partidárias e, acompanhando a tendência mundial, retirar dos partidos o monopólio da representação política e do lançamento de candidaturas. Mas essas são decisões que dificilmente serão tomadas pelo Congresso a ser eleito, pois candidatos que poderiam significar renovação, como Paula, Carlos, João e André, não estarão lá. Os caciques preferem os que nada vão mudar e os que até podem prometer mudanças, para nada mudar.