Adele se despede dos palcos com show memorável em Londres
Cantora britânica emociona, diverte e faz apelo aos quase 100 mil presentes no Estádio Wembley em possível último show da carreira
Samir Mello
atualizado
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Londres – 29 de junho. Estádio Wembley. O céu de Londres ainda estava claro quando, pontualmente, às 20h30, o segundo “Hello” mais famoso da música pop (ver Beatles, THE; 1967) preenchia o imponente estádio localizado na região Noroeste da capital inglesa. Os 98 mil presentes não tinham como saber, mas Adele, dona de uma das vozes mais poderosas e apreciadas que surgiram na última década, começava ali a sua despedida definitiva dos palcos.
Por si só, o show já representava uma ocasião especial. Era a segunda de uma série de quatro apresentações marcadas para celebrar o fim da turnê do álbum “25” — o terceiro e mais bem-sucedido da carreira — e a possível despedida dos palcos, como Adele confessou em carta escrita à mão, impressa no programa vendido às imediações do estádio. “Queria que meus últimos shows fossem em Londres, porque não sei se farei outra turnê novamente, então eu quero que minha última vez seja em casa”, revelou a cantora de 29 anos, nascida no bairro de Tottenham. No entanto, devido a danos nas cordas vocais, os últimos shows da miniturnê em Londres, batizada de “The Finale”, foram cancelados e não deverão ser remarcados, tornando o show do dia 29 o canto do cisne da artista.
Adele já havia tido problemas com a voz. Em 2011, chegou a fazer cirurgia devido a uma hemorragia na garganta. E, após 120 apresentações, é natural que uma voz tão exigida como a da cantora apresentasse sinais de sobreuso. No entanto, nada disso ficou evidente em seu último show.
Como não poderia deixar de ser, toda a estrutura que acompanhou Adele nos shows em Wembley foi idealizada para que sua voz brilhasse mais intensamente. A cantora utilizou todo o perímetro circular do palco para interagir com os fãs nas diferentes sessões do estádio, enquanto a sua banda, um nível abaixo, ficou praticamente escondida fornecendo arranjos minimalistas durante o set de 1h30. Acima, os telões alternavam imagens ao vivo com vídeos gravados para acompanhar o clima e a emoção transmitidos pelas músicas sobre términos e superação.
Intimismo
O bom uso da voz não ficou confinado apenas às músicas. Adele conseguiu transformar um show para quase 100 mil pessoas em uma ocasião intimista ao contar histórias sobre a vida pessoal, com total honestidade e humor. Entre os intervalos de praticamente todas as canções, ela compartilhou com o público o nervosismo de se despedir em Wembley, reconheceu a dificuldade em se lembrar das letras das músicas, pediu desculpas a avó pelos palavrões que saem com facilidade da boca, admitiu a dificuldade de entrar no vestido por ter ganhado peso e brincou sobre a sua verdadeira vocação na vida: “Eu nasci para costurar pompons!”
Nem tudo foi leveza, no entanto. Adele se mostrou capaz de falar sério ao relembrar o incêndio em Grenfell Tower, na região de North Kensington, em Londres, que causou cerca de 80 mortes. Envolvida na causa (a artista tem comparecido ao local para ajudar os sobreviventes) e claramente emotiva, ela pediu doações ao público antes de dedicar “Make You Feel My Love”, cover de Bob Dylan, aos ex-moradores do prédio: “Eles acham que ninguém liga para a situação. Portanto, se vocês têm condições de estarem aqui no meu show, vocês têm condições de doar 5 libras e mostrar que se importam”, apelou.
Ao cantar sobre mágoas com ex-namorados e ser tão aberta em relação às próprias falhas, Adele revela ser um tipo diferente de diva pop, que não faz questão de ser flawless, como Beyoncé, ou uma rockstar, como Lady Gaga. E se essa, de fato, foi sua despedida, ela se mostrou bem à vontade e confortável com a decisão, deixando para os fãs uma lembrança inesquecível da artista e do ser humano que ela é. “Agora, eu só quero beber um pouco de uísque, fumar uns cigarros e ser mãe”, ela disse, antes de entrar em um tradicional táxi preto londrino, e ir pra casa, onde o marido Simon Konecki e o filho Angelo, de dois anos, a esperavam.
*Samir Mello é jornalista, tradutor e mora atualmente em Londres, onde cursa mestrado pela City, University of London