A lição do Real é provar que o Brasil é maior do que os problemas (por Helder Barbalho)
A estabilidade dos preços é realidade. Temos a primeira geração que conviveu desde a infância sem saber o que é hiperinflação
Helder Barbalho
atualizado
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Transformações decisivas na história de um país são tão profundas que possuem esse condão: depois de acontecerem, criam uma nova realidade tão remodelada que parece ter sempre existindo, enquanto as agruras do passado ficam esmaecidas na imaginação. É o caso do plano Real.
Há exatos 30 anos, o Brasil finalmente debelou o dragão do pior e mais cruel tributo que se pode cobrar dos desassistidos, o imposto inflacionário, a hiperinflação. A escalada dos preços corroía o valor dos salários de maneira galopante e a o país era outro.
As atuais gerações não conseguem conceber o que era aquela alucinação coletiva: máquinas de remarcar preços passavam nas prateleiras dos supermercados diversas vezes, todos os dias, como sintoma perverso da chaga da inflação que o país e o nosso povo não sabiam como se livrar.
Os mais pobres pagavam a conta mais pesada, pois não tinham como se proteger da ciranda dos preços em seu galope frenético. A economia vivia a indexação, ou seja, os preços eram reajustados com base na inflação e se retroalimentavam em índices que procuravam proteger o valor das mercadorias e dos serviços. No final, apagava-se fogo com gasolina e o incêndio só aumentava.
Ninguém via saída. Vários planos econômicos foram tentados. É de se destacar a coragem e a ousadia do presidente José Sarney ao lançar o plano Cruzado, a primeira tentativa ambiciosa e ampla de estabilização da moeda, em 1986.
Seriam necessários ainda mais 8 anos de protótipos, frustrações, erros e aprendizados, até que a equipe liderada por Fernando Henrique Cardoso, sob a presidência do discreto e impetuoso Itamar Franco, lançassem o Plano Real.
Estabilidade
Passados 30 anos, a estabilidade dos preços é uma realidade. Temos a primeira geração que conviveu desde a infância sem saber o que é a calamidade do descontrole de preços.
O plano Real mostra a importância de valores que hoje muitas vezes são renegados: a política, a democracia, as instituições. Foram graças a esses fatores que o Brasil se livrou de seu nefasto período de hiperinflação, sinônimo de concentração de renda e aumento das desigualdades sociais.
Logo, combater a inflação foi um dos maiores programas sociais do país e um dos grandes méritos do presidente Lula foi assumir, como oposição, e garantir a continuidade dessa conquista tão importante para os brasileiros. Era uma época em que as diferenças nunca eram maiores do que a convergência sobre o fundamental.
Hoje, assistimos a debates em relação ao futuro do país e a escalada dos juros. O Brasil não consegue escapar de armadilha das altas taxas arbitradas pelo Banco Cenral e pelo mercado.
Como no passado da herança inflacionária, parece um problema insolúvel e aqueles que acreditam que uma solução é possível são vistos como visionários ou sonhadores.
O que o plano Real nos ensina é que temos de enfrentar nossos desafios e nunca podemos acreditar que a resposta para os problemas é a ausência de soluções. Saídas sempre existem.
O mais raro são líderes capazes de nos conduzirem a elas. São eles que fazem as transformações e sempre irão faze-las e não os acomodados ou conformados. Porque o Brasil, o Real provou, sempre tem jeito.
- Helder Barbalho é governador do Pará