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Uma madrugada de trabalho no Grupo EmpreZa

Os artistas têm causado um impacto forte nas artes contemporâneas brasilienses

atualizado

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Bernardo Scartezini/Metrópoles
primeira gal 2
1 de 1 primeira gal 2 - Foto: Bernardo Scartezini/Metrópoles

Está combinado que nada acontecerá antes de meia-noite. Que ninguém ali no Grupo EmpreZa é pelego. De modo que apenas nos primeiros minutos do sábado 29 de abril, após uma sexta-feira de #GreveGeral por todo o país, enfim, engrena esta edição do projeto “Fuga”.

Trata-se de uma ocupação artística promovida pela Alfinete Galeria no mui peculiar ateliê de Valéria Pena-Costa, numa casa um tanto malcuidada na QI 26 do Lago Sul. O local funciona como um ciclo de eventos quinzenais, sexta-feira sim, sexta-feira não, abrindo campo de ação para além das paredes da pequena galeria de arte. E trazendo convidados a cada evento.

Dentro do calendário do “Fuga”, esta é uma data aguardada com especial interesse, por conta do impacto que o coletivo de performances EmpreZa vem provocando na arte contemporânea brasileira (e não apenas) ao longo de uma década e meia de atividades.

Meia-noite e quinze, ao tanger de um berrante na madrugada do Lago Sul, bem no sovaco da Ponte JK, o grupo dá por iniciados os serviços de seu “Serão EmpreZa”.

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Performance do Grupo EmpreZa com João Angelini e Thiago Lemos
Performance do Grupo EmpreZa com João Angelini e Thiago Lemos
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Performance do Grupo EmpreZa com João Angelini e Thiago Lemos

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Performance do Grupo EmpreZa com João Angelini e Thiago Lemos

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O rígido dress code do EmpreZa estabelece calças de linho e ternos escuros, camisas sociais brancas e gravatas. E assim trajados, seus integrantes iniciam o expediente da madrugada com uma sessão de descarrego. Completando a usual vestimenta, sacos de estopa na cabeça, com ossos de animais ornando o conjunto. Ao som do pandeiro de João Angelini, num banho de sal grosso no chão e num espalhar de incenso no ar, os jardins e a casa da QI 26 são destrancados espiritual e artisticamente.

Logo, João Angelini e seu colega corporativo Thiago Lemos assumem posição de embate. Eles se postam sob focos de luzes no jardim. Um de frente para o outro, dois pistoleiros num duelo. Ao lado de ambos, um par de bacias cheias de munição: centenas de corações de galinha. Com estilingues, um atira no outro, uma víscera por vez. Por quase uma hora. Sem trocar palavra. Até que as bacias se esvaziem. Já exaustos dos bodoques, lá pelas tantas, eles passam a atirar com as próprias mãos.

“Plec”. É o som úmido de um coração de galinha estilingado contra um corpo humano a uma distância de vinte metros.

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Performance do Grupo EmpreZa com Marcela Campos e Rava Monique
Performance do Grupo EmpreZa com Marcela Campos e Rava Monique
Performance do Grupo EmpreZa com Marcela Campos e Rava Monique
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Performance do Grupo EmpreZa com Marcela Campos e Rava Monique

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Performance do Grupo EmpreZa com Marcela Campos e Rava Monique

Enquanto isso, mais para o fundo do lote, no menor dos cômodos de uma casa caindo aos pedaços — literalmente, pois entregue aos cupins e com as paredes rachadas — tem prosseguimento o serão.

Marcela Campos e Rava Monique, ali dentro, repetem a dinâmica de Angelini e Lemos do lado de fora. Sobre uma pilha de livros, uma vela demarca o território entre Marcela e Rava. Cada uma delas carrega caixas de fósforos (note o plural) e a seu turno acende a vela. Só para que a outra a apague num sopro. Repetidamente. Indefinidamente.

Uma janelinha basculante serve para, mal e mal, arejar o ambiente. Com o passar dos minutos, ao longo da noite, o ar se torna mais e mais pesado — um fósforo por vez.

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Performance do Grupo EmpreZa com Aishá Kanda
Performance do Grupo EmpreZa com Aishá Kanda
Performance do Grupo EmpreZa com Aishá Kanda
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Performance do Grupo EmpreZa com Aishá Kanda

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Performance do Grupo EmpreZa com Aishá Kanda

Aos integrantes do EmpreZa é eventualmente permitido fugir do dress code. Completamente nua, enquanto os colegas trocam estilingadas e acendem fósforos, Aishá Kanda surge solitária no alpendre da casa. Também sem dizer nada, ela se posta de cócoras sob a luz embaçada.

Aishá tem mãos fortes e a habilidade de dar tapas certeiros. Começando dos pés e chegando ao pescoço, ela vai subindo cada palmo de seu próprio corpo aos tapas. Sem demonstrar dor ou aflição, ao contrário de parte da audiência que lentamente abandona o alpendre. Risos nervosos e olhares de soslaio.

Mas Aishá não tem pressa. Suas palmadas são compassadas, e ecoam até o jardim. Cada vez tirando um som diferente, dependendo de a mão acertar uma parte do corpo mais ou menos rígida.

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Performance do Grupo EmpreZa com Helô Sanvoy e Babidu
Performance do Grupo EmpreZa com Helô Sanvoy e Babidu
Performance do Grupo EmpreZa com Helô Sanvoy e Babidu
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Performance do Grupo EmpreZa com Helô Sanvoy e Babidu

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Performance do Grupo EmpreZa com Helô Sanvoy e Babidu

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Performance do Grupo EmpreZa com Helô Sanvoy e Babidu

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Num crescendo de tensão e desconforto gerais, o grande final cabe a uma performance já consagrada do repertório do Grupo EmpreZa. Helô Sanvoy entra no alpendre iluminado instantes depois de Aishá, com o corpo todo vermelho, deixá-lo. Sanvoy tira a roupa e a amontoa próximo à parede. E ali se debruça a esperar.

Babidu toma a cena. Ele tira o cinto e se arremessa sobre Sanvoy. Atinge o corpo nu com golpes de cinto, varando o ar como chicote, num flagelo continuado. Quando já está esbaforido de tanto bater, Babidu fixa na parede um cartaz que anuncia a promoção da noite: R$ 1,99 por uma cintada. “Vamos lá”, ele apregoa, exortando o respeitável público a tomar parte da cena. “Nunca mais vai ser tão fácil bater assim em alguém. Nem mais barato.”

Tem quem pague.

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Instalação de Kabe Rodríguez
Ambiente criado por Kabe Rodríguez
Ambiente com instalação sonora de Alan de Lana
Ambiente criado por Valéria Pena-Costa
Detalhe de ambiente criado por Valéria Pena-Costa
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Escultura de Marcos Antony

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Instalação de Kabe Rodríguez

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Ambiente criado por Kabe Rodríguez

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Ambiente com instalação sonora de Alan de Lana

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Ambiente criado por Valéria Pena-Costa

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Detalhe de ambiente criado por Valéria Pena-Costa

Este cinto não tem fivela, Babidu esclarece diante da repugnância de muitos ali. Mas, sim, já teve fivela. Para o bem da integridade física e da paz de espírito dos integrantes, ela foi deixada de lado após eventuais excessos de membros da audiência.

Esta madrugada, na QI 26, o público é mais acostumado à linguagem da performance, preparado para suas provocações e ciente de seus acordos tácitos. Mesmo assim, neste punhado de 30, 40 pessoas, muitos preferem percorrer os jardins e os quartos da casa enquanto os performers se submetem aos martírios da arte contemporânea.

Há muito a ser visto nesta “Fuga”. A casa e o terreno inteiro são pontuados por instalações, intervenções e ambientes criados por artistas convidados. Nossa anfitriã Valéria Pena-Costa se espalha pela sala principal da casa. Alan de Lana e o coletivo Trespe assumiram os quartinhos. No jardim, a ocupação continua com Marcos Antony, César Becker, Mayra Miranda, entre outros.

A ideia dos organizadores Dalton Camargos e Luciana Paiva é que, no próximo turno do projeto “Fuga”, a ser intitulado “Movimento 2”, a partir de três de junho, novos artistas assumam estes mesmos espaços, até mesmo interferindo e dialogando com o que foi feito e ali deixado. E assim sucessivamente a cada nova temporada.

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