Artistas de Brasília reinventam a paisagem entre quatro paredes
Nove artistas da cidade se juntam na exposição “À Vista – Paisagem em Contorno”
atualizado
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Cecília Bona divide ateliê com Raquel Nava na Babilônia Norte. Yana Tamayo é sócia de Cecília no espaço Nave. As três tinham sido colegas na Universidade de Brasília (UnB). Ali, conheceram Karina Dias. Quando surgiu a ideia de fazerem uma mostra trabalhando a noção de paisagem em diferentes materiais e linguagens, Cecília começou a ligar as pontas.
Karina Dias foi imediatamente lembrada, afinal, esse vem sendo o tema recorrente de seu trabalho poético e acadêmico. E assim seguiram as afinidades eletivas. Logo vieram Bruna Neiva, Iris Helena, Júlia Milward, Luciana Paiva e Nina Orthof, todas contemporâneas do Instituto de Artes da UnB.
“À Vista – Paisagem em Contorno”, a exposição que reúne elas todas na Galeria Fayga Ostrower da Funarte Brasília, abriu esta semana e segue em cartaz, de terça a domingo (10h às 21h), até 4 de junho. A curadoria é de Marília Panitz, professora aposentada da UnB.
Normalmente, o curador tem uma ideia e busca artistas para montar uma exposição em cima dessa concepção, mas aqui aconteceu exatamente o contrário. Elas que vieram atrás de mim
Marília Panitz
Marília, então, achou que devia aproveitar esse ambiente de confiança e intimidade ali criado. Propôs às nove artistas e à produtora Dani Estrella revisitarem uma dinâmica que tinha estabelecido em 2001, na ainda hoje celebrada mostra “Gentil Reversão”, que reuniu Ana Miguel, Chico Amaral, Elder Rocha, Gê Orthof e Ralph Gehre.
Daquela vez e agora surgiu um trabalho coletivo, todo pensado em progresso, com cada um dos artistas se deixando contaminar pelas ideias e pelas produções dos outros artistas.
Diagonal
Daí a heterogênea harmonia que se percebe dentro da Fayga Ostrower. Marília Panitz dá como exemplo, justamente, a presença das duas artistas que talvez, num primeiro momento, não tivessem uma obra tão claramente identificada com a ideia de paisagem que a exposição desenvolve. Raquel Nava trouxe uma série de insetos mortos e animais em taxidermia. Luciana Paiva, uma extração recente de seus trabalhos em texturas de páginas e impressões.
Jardineira Cecília, trabalhando diariamente por uma semana em sua obra e ajudando a montar as demais peças na exibição, teve bastante tempo para pensar no que se passava ao seu redor. “Nem sei se a Marília concorda com isso, é uma coisa minha, que fiquei pensando… Com a Raquel, a relação de nossos trabalhos fica muito evidente. Passa pelo orgânico. Mas, de minha parte, acho que a Luciana tem uma aproximação estética com o minimalismo. E eu tenho uma aproximação conceitual. Na questão da relação do espaço.”
O espaço aqui está sob controle absoluto. Atende ao rigor do cubo branco. Com a porta de entrada fechada, as quatro paredes sem janelas criam uma segunda natureza deixando esquecida, do lado de fora, a natureza primeira do Eixo Monumental, seus asfaltos, suas áreas verdes.
Horizontal
“Senti a necessidade de uma linha para poder pousar o olhar”, lembra Marília Panitz, certa feita incerta com as dimensões da sala. Daí a ideia de uma linha horizontal, azul bem clarinha, traçada a mão livre, dividindo as paredes ao mesmo tempo em que unia cada peça ali exposta, emprestando um horizonte a essas paisagens artificiais.
Da mesma forma, Marília foi afinando a luz, questão fundamental nessa coletiva que trabalha com diferentes linguagens: fotografias, objetos, esculturas, instalações, vídeos em projeção, vídeos em telas. A cada visita, ela foi afinando a luz de peça em peça. Suavizando a iluminação nas áreas da galeria que abrigam vídeos ou, num caminho contrário, intensificando e dramatizando os focos sobre as peças de chão.
Assim, apenas na hora da montagem, cada peça foi se deixando revelar por inteiro. E à luz das demais peças, cada uma foi encontrando seu lugar. Por isso, lá pelas tantas, o “Tatu Varrido” de Raquel Nava ganhou um montinho de areia sobre suas patas de vassoura. Um pequeno platô para que o tatu fizesse melhor companhia às batatas doces plantadas em vidro por Cecília em seu jardim.
Aliás, as batatas já cresceram um bocado.