A arte urbana sobe a rampa do Museu Nacional
Mostra “Mundez” mistura grafite ao acervo do complexo cultural
atualizado
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Enquanto pintam muros de cinza por aí, aqui no Museu Nacional Honestino Guimarães a questão ganha outras cores. Em cartaz até 4 de junho, a mostra coletiva “Mundez” promove um gentil assalto ao cânone das artes nacionais.
Diretor do Museu Nacional e curador da mostra, Wagner Barja conta que foi procurado, no início do ano, por grafiteiros do Distrito Federal e do entorno. Artistas urbanos como Flávio Soneka, Gilmar Satão e Guga Baygon pediram que a instituição apoiasse uma intervenção deles na praça do Conjunto Cultural da República.
Com o aniversário de Brasília no último dia 21, trazendo a marca de 10 anos de atividades do Museu, e o orçamento apertado da Secretaria de Cultura, tornou-se evidente uma solução caseira… A oportunidade para que eles subissem a rampa e ocupassem a (imensa) sala principal do prédio.
Também vieram a calhar as mais de duas mil obras que compõem os acervos do Museu Nacional e do Museu de Arte de Brasília. Um vasto arsenal periodicamente exposto em mostras rotativas. Para revisitá-las, agora sob nova orientação, Barja destacou algumas dessas peças e propôs aos artistas brasilienses um diálogo transgeracional.
Michelle Cunha, assim, amplia os campos floridos de Beatriz Milhazes. Gilmar Satão responde em grafite a um desenho de Alfredo Volpi. Antonio Delei busca o cubismo em Emiliano Di Cavalcanti. Mikael Omik reencontra o desalento de Orlando Teruz.
Os artistas convidados receberam carta branca. Para ser mais literal: eles receberam painéis brancos. As paredes móveis que recortam a amplidão de Oscar Niemeyer serviram como o próprio suporte para os trabalhos desenvolvidos ali mesmo, durante o par de semanas que antecedeu a exibição. “Esta é uma exposição mais processual e experimental do que um produto articulado”, elabora Barja.
Esse lado aberto – em processo – da mostra foi assumido não apenas pelos grafiteiros, que abordavam as paredes do Museu como se fossem os muros da cidade. Mesmo o pintor Josafá Neves aproveitou essa espécie de ‘work in progress’ coletivo para levantar uma tela sobre uma das paredes e criar, ali mesmo, uma imagem de Nossa Senhora Aparecida.
Nossa Senhora não dá pelota para os incrédulos – e grafite é arte? – sim, é – porque a todos ela acolhe e abençoa no Museu Nacional.
Os santos antropofágicos Oswald de Andrade e Mario de Andrade também lançam suas bênçãos aos novos modernos. Frases de efeito de modernistas de ontem e anteontem, pinçadas de poemas e manifestos, podem ser lidas pelas paredes do Museu, emprestando um lastro histórico, emocional e intelectual à geleia geral.
“Seja marginal, seja herói”, propõe – para sempre – Hélio Oiticica.
Objetos, esculturas, instalações e intervenções também pontuam o salão, repercutindo temas políticos e sociais que se recusam a parar de receber mais e mais significados com o passar dos anos, com o passar dos dias. Ernesto Neto e Bené Fonteles, por exemplo, aqui estão presentes em obras que se relacionam frontalmente com a questão indígena. Pois bem…
Povos indígenas de todo o país chegaram à Esplanada dos Ministérios esta semana para reivindicar seus direitos. Na terça-feira (25), eles se puseram a marchar rumo ao Congresso Nacional. Foram recebidos com gás lacrimogênio e bombas de efeito moral por parte da Polícia Militar do Distrito Federal.