Casas na W3 Sul se enfeitam com grafite para evitar pichações
Dezenas de moradores têm contratado grafiteiros para trazer cor e arte às 700. Serviço custa, em média, R$ 500
atualizado
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Moradora da 706 Sul há 34 anos, a aposentada Maria Inês Kich já perdeu as contas de quantas vezes pagou para pintar o muro e o portão da casa onde vive com a família. Nem mesmo a cor marrom escura afastou os pichadores. No entanto, há dois anos e meio, não há mais palavrões, protestos ou rabiscos. O vandalismo deu lugar à arte.
A ex-bancária conta que teve a ideia quando estava passeando com o neto pela W3 e encontrou alguns grafiteiros desenvolvendo um trabalho. Cansada de lutar contra os pichadores, perguntou aos jovens o que precisava fazer para que eles também grafitassem o enorme muro de esquina da casa onde mora. Na época, os artistas pediram apenas que a aposentada comprasse a tinta. O resto era com eles.
A arte que ilustra as paredes de Maria Inês não é a única por ali. Pelo contrário. A reportagem do Metrópoles percorreu a W3 Sul, das quadras 703 até a 707, e percebeu como dezenas de outros moradores têm apostado no grafite na luta contra a pichação. Entre um rabisco e outro, sempre tem um muro ou um portão colorido contrastando com os atos de vandalismo.
No portão da garagem
A também aposentada Maria de Jesus Machado, 72 anos, conta que a princípio achou meio estranho a ideia da filha Juliana, 42, de trazer alguns amigos para desenharem nos portões da casa. Mas pensou bem e, cansada de pintar a entrada da residência após sucessivas pichações, resolveu ceder aos apelos da filha. “Até agora, vem dando certo”, conta, animada, posando em frente à pintura que mais gosta na garagem de casa. “Prefiro essas cores mais claras mesmo, mais discretas”.
Grafiteiros veem reconhecimento do trabalho
O grafiteiro Renato Moll, 29 anos, diz que a procura pela arte de rua em espaços privados tem aumentado nos últimos meses. “As pessoas se acostumaram com o grafite e hoje já sabem apreciar o nosso trabalho”, conta. Segundo ele, muitos profissionais ganham a vida desenvolvendo o trabalho, como se o grafite tivesse deixado as tesourinhas e as passarelas para invadir a vida e as casas das pessoas.
Foi isso que ocorreu com o escritor e amante das artes Ruy Godinho, 62 anos. O portão da casa onde mora, na 703 Sul, foi pintado recentemente. Ele ganhou de presente de aniversário das filhas, que pagaram cerca de R$ 500 pelo serviço. “Antes, o portão era todo pichado, um horror só. E como eu trabalho com arte, para mim, ver essa linda pintura por aqui é outra coisa.”
Eu saí de manhã para passear na beira do lago e, quando voltei, três horas depois, o trabalho estava praticamente pronto. Foi só finalizar. Em quatro horas, eles fizeram tudo
Ruy Godinho, escritor
Combate à pichação
Apesar de muitas famílias usarem o grafite como arma, há lugares que seguem sendo pichados em todo o Distrito Federal. Segundo a Secretaria da Segurança Pública e da Paz Social, foram registradas 158 ocorrências de pichação no DF em 2016. O número pode parecer pequeno, mas milhares de casos não são registrados nas delegacias.
A pichação é uma contravenção penal, prevista na Lei dos Crimes Ambientais (9.605/98). “Quem comete a prática está sujeito à pena de detenção de três meses a um ano, além de multa. Se a pichação for em monumentos tombados, como patrimônio artístico ou histórico, a pena mínima de detenção é de seis meses e a máxima permanece em um ano, além de multa”, esclarece a pasta.
Para combater o ato de vandalismo, a secretaria afirma que mantém, desde 2000, o programa “Picasso não Pichava” e que a Polícia Militar realiza rondas ostensivas para inibir a prática das pichações. “Quando há flagrante, os autores e os materiais utilizados são encaminhados à delegacia mais próxima ou à Delegacia Especial do Meio Ambiente (Dema) para registro da ocorrência”, completa.