Veja o que pode atrapalhar a queda da Selic em 2024
Para os economistas, há ao menos três fatores de risco para a redução dos juros no Brasil. Todos têm potencial de elevar a inflação do país
atualizado
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O ano de 2023 já terminou para a taxa básica de juros do país, a Selic. Nesta quarta-feira (13/12), ela foi fixada em 11,75% pelo Banco Central (BC). Para o fim de 2024, as projeções apontam para 9,25%. Os agentes econômicos, porém, já estão de olho no que pode comprometer – ou melhorar – essa projeção. E a lista de eventuais vilãs da Selic nos próximos 12 meses inclui três fortes candidatos: o El Niño, o petróleo e uma eventual deterioração do quadro fiscal brasileiro, dado pela relação entre gastos e receitas do governo.
Na prática, todos os fatores que exercem pressão de alta na inflação atrapalham a queda dos juros. Mesmo porque a Selic é a principal ferramenta de política monetária usada pelo Banco Central para conter o aumento de preços na economia nacional.
Daí, na avaliação do economista André Braz, coordenador de índices de preços do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), a presença do El Niño entre os elementos de risco para a redução da Selic. “Os meteorologistas dizem que o fenômeno climático vai se manter forte até abril do ano que vem”, afirma Braz. “E isso pode prejudicar a safra de diversos produtos, embora ainda seja cedo para falar em prejuízos ou mesmo em elevações significativas de preços.”
El Niño no Brasil
O El Niño, que modifica o padrão de circulação atmosférica no Oceano Pacífico, é responsável por alterar a distribuição de umidade e as temperaturas em várias áreas do planeta. No Brasil, ocasiona secas prolongadas no Norte e Nordeste, mas chuvas intensas e volumosas no Sul.
Por enquanto, nota o economista, os efeitos do fenômeno restringem-se a alimentos in natura, como produtos encontrados em feiras livres, caso de batatas, tomates e cebolas. “Esses preços estão subindo, mas têm impacto no curto prazo. Eles avançam na primavera e no verão, mas caem no outono e no inverno”, afirma Braz. “O problema será se o El Niño atrasar o plantio de grãos como soja e milho, resultando em perdas maiores para a economia.”
Questão fiscal
Os técnicos observam que a questão fiscal, reflexo da relação entre despesas e receitas da administração federal, é outro ponto sensível dos juros em 2024. O não cumprimento por parte do governo da meta de zerar o déficit em 2024, considerado certo por analistas, pode ter impacto no câmbio, o que prejudica a inflação.
“Além disso, gastos públicos mais elevados podem estimular o consumo, o que também favorece o aumento de preços”, diz o economista Mauro Rochlin, professor de MBAs da Fundação Getulio Vargas (FGV). “Acredito que o mercado até aceitaria um aumento da meta de déficit de 2024 para algo como 0,5%. Mas isso se for para realmente cumprir esse resultado e não para servir de desculpa para ir além disso.”
O economista e consultor Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, também considera que a trajetória do gasto público em 2024 está entre os maiores pontos de alerta para a Selic. “Se adicionarmos um novo impulso fiscal, vai ser difícil manter a convergência da inflação à meta, mesmo para horizontes mais longos”, diz. Para o próximo ano, a meta de inflação fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) é de 3%.
Petróleo
Para os economistas, os conflitos entre Israel e o Hamas, de forma mais acentuada, ou mesmo, entre a Rússia e a Ucrânia, em menor grau, também podem atrapalhar a queda Selic. Nesse caso, o problema ocorreria como resultado de uma eventual elevação do petróleo no mercado internacional, o que provocaria um efeito em cascata sobre os preços de produtos. “Ainda que esses confrontos já estejam mapeados pelo mercado, há sempre o risco de agravamento do problema”, diz Braz.
O que pode ajudar
Mauro Rochlin, observa que, apesar das ameaças, há fatores que colaborariam com a queda da Selic no próximo ano. Eventualmente, acentuando-a. Um deles é a redução dos juros nos Estados Unidos, por parte do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). “O mercado acredita que o Fed deve iniciar um ciclo de baixa de juros em maio”, diz o economista. “Se isso realmente acontecer, com certeza terá reflexos positivos nos juros no Brasil.”
Nesta quarta-feira (13/12), o Fed deu sinais claros de que o ciclo de alta de juros nos EUA está prestes a acabar. Depois da reunião dos membros do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês), similar ao Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC) brasileiro, nenhum membro do órgão apontou a necessidade de taxas de juros mais elevadas. Com isso, a Bolsa brasileira (B3) disparou.
Espaço para a queda
Na avaliação da economista Carla Beni Menezes de Aguiar, professora de MBA da Fundação Getulio Vargas (FGV), porém, caso não haja um choque externo relevante, há espaço para que os juros cedem no Brasil, num ritmo mais rápido do que o mercado prevê para 2024.
Ela observa que a taxa real de juros no país, que é dada pela Selic menos o IPCA, já está num patamar alto. “Hoje, ela é de cerca de 7%”, diz. “Para dar uma ideia do que esse número representa, basta dizer que a média histórica do Brasil é de 4% a 4,5% ao ano. Ou seja, os juros básicos ainda estão elevadíssimos.”
Para o fim de 2024, nota a economista, as projeções indicam uma taxa real de 5,3%. “Ela é menor do que a de 2023, mas, ainda assim, bastante alta”, afirma. “Assim, mesmo dentro da atual estrutura orçamentária e fiscal, e sabendo do peso que o Banco Central dá para esse tema, não há justificativa para a manutenção de taxas reais tão altas no Brasil.”