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Socorro à Argentina: por que Haddad pediu ajuda a FMI e EUA

Governo brasileiro teme que crise econômica argentina afete a balança comercial entre os dois países; interesses políticos também pesam

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Fotos: Diogo Zacarias/MF
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O governo brasileiro levou a Argentina para a mesa de discussões do G7 Financeiro, no Japão. Nesta semana, ao participar como convidado do encontro que reúne lideranças econômicas dos sete países mais desenvolvidos do mundo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, discutiu a crise no país vizinho com representantes do Fundo Monetário Internacional (FMI) e dos Estados Unidos.

A prioridade dada pelo Brasil à delicada situação da Argentina até surpreendeu a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, como revelou o próprio Haddad depois de uma reunião na quinta-feira (11/5). No dia seguinte, o assunto foi debatido com a diretora-geral do FMI, Kristalina Georgieva.

Recentemente, o FMI se comprometeu com um programa de socorro ao país sul-americano que previa o pagamento de US$ 44 bilhões em 30 meses – tendo como contrapartida a adoção de medidas para combater a inflação. Até o fim do ano passado, haviam sido desembolsados US$ 23,5 bilhões. Desde a retomada da democracia na Argentina, em 1983, já houve 13 acordos com o FMI.

3º maior parceiro comercial do Brasil

Segundo economistas ouvidos pelo Metrópoles, o empenho brasileiro em tirar a Argentina do buraco se explica tanto por razões econômicas quanto políticas. O país é o terceiro maior parceiro comercial do Brasil, atrás apenas de China e EUA. Em 2022, o Brasil teve um saldo positivo de US$ 2,2 bilhões na balança comercial com os argentinos.

“Além de ser um grande parceiro comercial, para onde escoa boa parte das nossas importações de produtos manufaturados de alta complexidade, a Argentina é um parceiro estratégico no abastecimento de alimentos. É um dos principais produtores de trigo do mundo, além de uma gama de produtos minerais”, afirma André Galhardo, consultor econômico da Remessa Online.

A Argentina é a maior exportadora mundial de soja processada e a terceira maior exportadora de milho do mundo. Também é fornecedora de carne bovina e trigo. Os itens agropecuários corresponderam a 38% das exportações do país no ano passado.

Seca e inflação agravam a crise

A crise econômica foi agravada pela seca severa que atinge o país, a maior dos últimos 60 anos, que levou a uma queda de 74% nos embarques de grãos em fevereiro. O Brasil é o maior mercado para os embarques argentinos.

“O impacto da seca é muito grande. Primeiro, porque entram menos dólares no país. O preço do dólar fica mais alto, o que significa mais inflação”, explica o argentino Roberto Luis Troster, ex-economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que mora no Brasil há mais de 40 anos. “Outro ponto é que a agricultura na Argentina, como no Brasil, é uma cadeia. Você não vende só a carne, mas também frios, processados… Com a seca, toda a cadeia acaba produzindo menos.”

Galhardo, por sua vez, lembra que a Argentina sofre há tempos com a desvalorização do peso e a “dolarização” de sua economia, além da falta de reservas internacionais. “Eles não têm recursos suficientes para fazer frente às suas demandas”, afirma. “Parte do processo inflacionário na Argentina deriva da desvalorização cambial, que, por sua vez, é consequência desse problema nas contas externas.”

Segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos da Argentina (Inec), a inflação no país ultrapassou espantosos 108% no acumulado de 12 meses até abril. Está no maior patamar em 31 anos.

Questão política

Além da preocupação econômica, o governo brasileiro entende que interceder pela Argentina junto ao FMI cacifa o país a consolidar, perante o mundo, sua posição de líder do continente.

“O Brasil quer assumir o papel de líder geopolítico da América Latina. Para isso, é importante construir mecanismos que ajudem a economia doméstica e os seus parceiros”, diz Galhardo. “É claro que a afinidade político-ideológica contribui para essa reaproximação. Mas o governo brasileiro precisa agir de forma pragmática. Precisa entender que, acima dos seus interesses ideológicos, estão os interesses dos empresários e das famílias brasileiras”, pondera o economista.

As eleições presidenciais na Argentina, que acontecem em outubro, também estão no radar de preocupações do governo Lula. Impopular, o presidente Alberto Fernández decidiu não concorrer à reeleição, o que pulverizou ainda mais a coalizão governista. Com a economia em frangalhos, o nome do deputado Javier Milei, líder populista de direita que se apresenta com um discurso “antissistema” – semelhante à retórica do ex-presidente Jair Bolsonaro –, vem ganhando força e aparece liderando algumas pesquisas. A Lula, não interessa a vitória de um “Bolsonaro argentino”.

Tem solução?

Além de costurar um possível novo empréstimo do FMI à Argentina, o governo Lula estuda oferecer linhas de crédito para os empresários brasileiros que exportarem para o país vizinho. Embora importantes, essas medidas não seriam capazes, por si só, de resolver o problema.

“A Argentina já enfrentou crises mais difíceis, conseguiu superá-las e voltou a crescer. Depois, em diversos momentos, cometeu os mesmos erros e retrocedeu. É uma história que se repete”, lamenta Troster. Para o economista, no entanto, a crise só será superada com um “ajuste na política monetária e na política fiscal”.

Galhardo segue a mesma linha. “Um eventual empréstimo do FMI ou uma reaproximação da Argentina de órgãos multilaterais ajudariam de forma transitória”, diz. “O problema da Argentina é crônico, vem de muitos anos. É necessária uma reforma estrutural importante para aumentar o nível de reservas internacionais do país.”

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