Selic nas alturas: o que muda na sua vida com novo aumento dos juros
Remédio eficaz para conter inflação, aumento da Selic encarece empréstimos e financiamentos, reduz nível de consumo e pode afetar o emprego
atualizado
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Pela quarta vez consecutiva, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) aumentou a taxa básica de juros da economia em reunião concluída nessa quarta-feira (29/1), elevando a Selic em 1 ponto percentual, para 13,25% ao ano, dentro das expectativas do mercado.
Foi a primeira reunião do colegiado em 2025 e também a primeira desde a posse do economista Gabriel Galípolo, ex-diretor de Política Monetária do BC e ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda, na presidência da autarquia. Galípolo foi indicado ao posto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e sucedeu a Roberto Campos Neto, que havia sido indicado por Jair Bolsonaro (PL).
Segundo a edição mais recente do Relatório Focus, do BC, divulgada na segunda-feira (27/1), os analistas do mercado financeiro estimaram a Selic para o fim de 2025 em 15% ao ano, mesma projeção da semana anterior. Para 2026, a expectativa é que os juros fiquem em 12,25%.
O que é a taxa Selic
- A taxa básica de juros é o principal instrumento do Banco Central (BC) para controlar a inflação. A Selic é utilizada nas negociações de títulos públicos emitidos pelo Tesouro Nacional no Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic) e serve de referência para as demais taxas da economia.
- Quando o Copom aumenta os juros, como agora, o objetivo é conter a demanda aquecida, o que se reflete nos preços, porque os juros mais altos encarecem o crédito e estimulam a poupança. Assim, taxas mais altas também podem conter a atividade econômica.
- Ao reduzir a Selic, por outro lado, a tendência é a de que o crédito fique mais barato, com incentivo à produção e ao consumo, reduzindo o controle da inflação e estimulando a atividade econômica. Não é o que se deve esperar neste momento.
- Em dezembro do ano passado, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial do país, ficou em 0,52%, o que representou uma alta de 0,13 ponto percentual em relação a novembro (0,39%). No acumulado de 2024, a inflação no país foi de 4,83%.
- Segundo o Conselho Monetário Nacional (CMN), a meta de inflação para o ano passado era de 3%. Como havia um intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo, a meta seria cumprida se ficasse entre 1,75% e 4,75% – o que não ocorreu.
- Desde que o sistema de metas de inflação foi implantado no Brasil, em 1999, foi a oitava vez que o alvo para o IPCA não foi alcançado. Para 2025, a meta de inflação também é de 3%.
Qual o impacto da Selic na sua vida
Os impactos da nova elevação da Selic são múltiplos e atingem diversos setores da economia, com os efeitos distribuídos entre empresas e o cidadão comum – que sente no bolso e no dia a dia os efeitos do juro alto.
Como a Selic é uma taxa de referência para o custo das linhas de crédito, a tendência é a de que, quando ela sobe, empréstimos e financiamentos se tornem mais caros.
Em outras palavras, o aumento dos juros leva bancos e outras instituições financeiras a cobrarem juros mais altos nesse tipo de operação. Em sentido contrário, quando a Selic cai, os juros do crédito ficam mais baratos.
“O aumento da taxa de juros acaba impactando, principalmente, aqueles setores cujas vendas dependem do crédito. Quando a taxa de juros está mais alta, você acaba inibindo parte da intenção de compra de veículos e imóveis, por exemplo. O setor de construção civil e alguns segmentos do setor do comércio varejista são muito afetados”, observa André Galhardo, consultor econômico da plataforma de transferência internacional, cartão e conta global Remessa Online.
“Isso se estende também para setores que precisam de crédito para capital de giro e investimentos, como a indústria, principalmente a indústria de transformação. O setor de construção civil e a indústria de manufatura devem ser ainda mais impactados com a elevação da Selic”, explica Galhardo.
Consumo, empréstimos e financiamentos
Os efeitos da alta dos juros sobre o crédito, que atingem diretamente empréstimos e financiamentos, afetam, por tabela, o nível de consumo da população. Com o aumento dos custos de produtos e serviços, é natural que as pessoas comprem menos. Em contrapartida, quando há queda da Selic, o consumo tende a crescer.
“A maior parte da população brasileira não tem poupança, não tem reservas. Então, acaba se utilizando muito de crédito para fazer seu consumo ou um investimento. Nós vamos ver esse encarecimento batendo no bolso de imediato. A parcela de habitação ficará mais cara, o cartão de crédito também ficará mais caro, e isso pegará direto nos financiamentos e investimentos”, aponta Hugo Queiroz, sócio e diretor da L4 Capital.
Projeção semelhante é feita por Galhardo, para quem “a taxa brasileira de juros já é muito elevada há muito tempo”, antes mesmo do aperto monetário recente do Copom. “O crédito nunca foi barato no Brasil, mas esse aumento da Selic promete encarecer ainda mais aquilo que já estava praticamente insustentável. Isso deve representar uma diminuição no ritmo de concessão de empréstimos e financiamentos”, afirma o economista.
“As pessoas podem ficar mais expostas à inadimplência, já que a taxa de juros está subindo e isso reduz a oferta de emprego e põe um freio na economia”, alerta Galhardo. “Muitas pessoas começam a usar linhas de crédito mais caras, como o cheque especial ou cartão de crédito, para uso em um consumo mais cotidiano de bens de primeira necessidade, como alimentos e combustíveis.”
Emprego
Apesar do efeito positivo de conter a escalada da inflação, uma das consequências do aumento da taxa de juros é o esfriamento da atividade econômica – o que pode resultar em diminuição de contratações ou mesmo no corte de vagas por parte das empresas, afetando o emprego.
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o desemprego no país foi de 6,1% em em novembro do ano passado (último dado divulgado), o menor índice da série histórica iniciada em 2012. O resultado fechado de 2024 será divulgado na sexta-feira (31/1).
“A alta dos juros acaba se desdobrando para a população em geral. Quando os empresários dos segmentos mais afetados projetam esses impactos, começam a contratar menos pessoas e a diminuir o ritmo de produção”, diz André Galhardo. “Embora o aumento da taxa de juros represente, pelo menos na teoria, uma diminuição da inflação, por outro lado ele impacta o nível de emprego.”
Além de possíveis reflexos em contratações e demissões, a Selic mais alta afeta as decisões de investimento das empresas. “É claro que empresas têm patrimônio e geração de caixa maior do que as famílias. Mas o custo de crédito também sobe, o que encarece a despesa financeira”, observa Hugo Queiroz, da L4 Capital.
“Há forte impacto na decisão das empresas. Com uma taxa de juros mais alta, as companhias geralmente postergam seu investimento. A consequência do juro mais alto, portanto, é travar o crescimento econômico de forma geral, tanto pelo lado do consumo das famílias quanto pelos investimentos das empresas”, explica Queiroz.
Renda fixa e renda variável
Os brasileiros que possuem investimentos no mercado também devem ser impactados pela decisão do Copom de subir os juros. Grosso modo, o aumento da Selic beneficia os investimentos de renda fixa, cuja remuneração oferecida é baseada nos juros. Entre esses investimentos, estão os títulos públicos do governo federal, os CDBs emitidos pelos bancos, letras de crédito e debêntures.
Em períodos de juros elevados, todos esses papéis costumam ter uma rentabilidade maior. Por outro lado, quando a Selic cai, o retorno também tende a diminuir.
“Na média, há benefício para quem investe em renda fixa, especialmente nos títulos pós-fixados [como Tesouro Selic, CDB, LCI, LCA, debêntures e Tesouro IPCA+]. Os pré-fixados [Tesouro Direto Prefixado, CDB Prefixado, CRI ou CRA] sofrem um pouco nesse cenário de alta de juros. Mesmo o investidor em renda fixa tem de ter esse cuidado”, afirma Hugo Queiroz. “Já na parte de renda variável [ações, fundos imobiliários, BDR, ETF, câmbio, commodities e criptomoedas], há o efeito oposto. Na maior parte dos ativos, há uma desvalorização.”
Próximas reuniões do Copom
O Copom se reúne a cada 45 dias. No primeiro dia de reuniões, são feitas apresentações técnicas sobre a evolução e as perspectivas da economia no Brasil e no mundo, além do comportamento do mercado financeiro. No segundo dia, os membros do comitê definem a taxa Selic.
O Copom tem mais sete reuniões programadas para este ano para definir a taxa básica de juros do país. O próximo encontro do colegiado com essa finalidade acontecerá nos dias 18 e 19 de março. Nessa quarta, o comitê sinalizou que deve elevar a taxa básica de juros em mais um ponto percentual. Com isso, chegará a 14,25% ao ano, o mesmo patamar de julho de 2015, durante a crise no governo Dilma Rousseff.