Safra diz que dono da Gocil faz recuperação fake para blindar bens
Banco Safra também questiona crédito de R$ 325 milhões obtido junto ao BNB às vésperas de recuperação judicial, como mostrou o Metrópoles
atualizado
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O Banco Safra afirmou à Justiça nessa quinta-feira (26/10) que o empresário Washington Cinel, dono da Gocil, uma das maiores empresas de segurança privada do país, usou o pedido de recuperação judicial como uma “pueril tentativa de blindar” seu “multimilionário” patrimônio e “fraudar seus credores”.
A instituição financeira põe em xeque se o grupo de Cinel está realmente em crise econômica e questionou créditos contraídos pela empresa às vésperas do pedido de recuperação judicial (RJ).
Como mostrou o Metrópoles, Cinel pediu recuperação judicial com dívidas de R$ 1,76 bilhão à Justiça de São Paulo. O próprio empresário juntou ao processo cédulas de crédito firmadas junto ao Banco do Nordeste (BNB) que chegam à cifra de R$ 510 milhões.
Do total, R$ 325 milhões foram contratados dois meses antes do pedido de recuperação e R$ 32 milhões foram liberados a apenas oito dias da tentativa de entrar em RJ.
Uma fazenda foi dada como garantia do negócio. Como mostrou a coluna de Guilherme Amado, a fazenda havia sido comprada por Cinel em 2021, por R$ 42 milhões. Mesmo assim, foi avaliada em R$ 325 milhões pelo Banco do Nordeste para firmar uma cédula de crédito na mesma quantia, bastante discrepante do preço original.
O banco Safra afirma que a operação pode ter servido para blindar o patrimônio de Cinel, uma vez que o imóvel alienado em garantia a um banco não pode ser alvo de bloqueios da parte de outros credores, nem incluído na lista de ativos disponíveis para a quitação de dívidas da RJ.
O Safra afirma que “não é impossível cogitar que a cédula em questão tenha sido celebrada com o fito de impedir que os credores eventualmente obtivessem” o bloqueio da fazenda, que fica em Balsas, no Maranhão.
A dívida contraída dois meses antes da recuperação, segundo o Safra, também “corrobora com o cenário de absoluta incerteza quanto à real existência de crise econômico financeira” de Cinel e das demais empresas de seu grupo.
O Safra ainda afirma que a inclusão de um empréstimo do próprio banco no valor de R$ 15 milhões na lista de credores é uma forma de tentar impedir que o Safra, caso o deseje, promova a cobrança individual da dívida.
O banco também ressalta que o grupo alegou que a crise financeira tem relação com a expansão das fazendas e questiona os motivos que levaram à inclusão das empresas de segurança privada de Cinel , como a Gocil, no pedido de recuperação judicial. O banco pede para que a Justiça mande a perícia constatar se há real crise econômica na Gocil.
“A conduta do Sr. Washington desnuda a sua pueril tentativa de blindar seu multimilionário de seus legítimos credores, a qual, por sua vez, configura abuso de direito, na medida em que o Sr. Washington se utiliza, de forma fraudulenta, do pedido de recuperaçao para fraudar credores”, afirma o Safra.
O Banco do Brasil já havia também afirmado, logo no início da recuperação judicial, que Cinel “ostenta uma vida de luxo” e que quer viver às custas de seus credores. O banco pediu à Justiça paulista que obrigue o empresário a explicar seu patrimônio e que seja feita perícia para constatar se ele, de fato, está em crise que justifique a sua recuperação judicial.
Ex-PM e jantares com políticos
Washington Cinel foi policial militar em São Paulo e abriu a Gocil nos anos 1980 para prestar segurança privada, após atuar nessa área para a Rede Globo, na região de Bauru. O negócio expandiu-se para 11 estados ao longo dos anos e tem, hoje, 20 mil funcionários. Atualmente, além de vigilância, o grupo oferece serviços como jardinagem, limpeza, entre outros terceirizados a empresas e governos.
Só do governo paulista, a Gocil recebeu mais de R$ 100 milhões no ano passado, prestando serviço de vigilância em estações de trens da CPTM e em unidades habitacionais da CDHU.
Com o passar dos anos, a influência política de Cinel também cresceu. Foi na mansão dele nos Jardins, bairro rico paulistano, que o empresário promoveu o evento que lançou a candidatura de João Doria na eleição para prefeito da capital, em 2016, quando o então tucano e seu amigo foi eleito.
Durante o governo passado, Cinel também se aproximou de Jair Bolsonaro (PL) e foi o anfitrião de um jantar do ex-presidente com empresários paulistas, em 2021. Mesmo alinhado a Bolsonaro, ele não deixou de frequentar o Lide, grupo empresarial fundado por Doria e do qual já foi líder da área de segurança.
BNB diz que repassou R$ 32 milhões em 2023
O Grupo Handz, ao qual pertence a Gocil, afirmou que “seguimos com o nosso processo de Recuperação Judicial com lisura e transparência, dialogando com os credores em respeito a todos os envolvidos”.
O BNB afirmou que “não repassou R$ 510 milhões presentes nas cédulas de crédito às quais o Metrópoles obteve acesso às vésperas do grupo de Cinel entrar em recuperação judicial”.
Segundo o banco, “todo recurso efetivamente repassado pelo BNB somou R$ 188 milhões, sendo que R$ 156 milhões foram creditados em 2022 e R$ 32 milhões, este ano.” Ainda de acordo com a instituição, “todo o processo seguiu rigorosamente os trâmites legais e normativos estabelecidos”.
A reportagem do Metrópoles está baseada em documentos do próprio banco que foram anexados ao processo de recuperação judicial do grupo de Washington Cinel.