Rumor sobre manobra tributária derrubou a ação da Ambev na Bolsa
CervBrasil, entidade que reúne concorrentes da Ambev, acusa a empresa de pagar menos imposto na produção de refrigerante. Disputa é antiga
atualizado
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As ações da Ambev, líder no mercado de cervejas e dona de marcas como Skol e Brahma, encerraram a quarta-feira (1º/2) com queda de 3,5%, na pior sessão diária em mais de duas semanas.
O motivo do pessimismo dos investidores foi um rumor sobre um suposto “rombo tributário” de R$ 30 bilhões que teria beneficiado a empresa de bebidas controlada pelos bilionários Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles, o mesmo trio que comandou a Americanas nos últimos 20 anos.
A Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CervBrasil) afirmou à coluna Radar, da revista Veja, que a Ambev teria se valido de uma manobra tributária para pagar bilhões a menos em impostos.
A associação, que representa concorrentes como o Grupo Petrópolis, chamou o arranjo de “ilícito tributário”, o que acendeu um alerta no mercado, uma vez que o trio de controladores da Ambev está no alvo de autoridades e de credores da Americanas, que buscam identificar os responsáveis pela maquiagem de R$ 20 bilhões em dívidas no balanço da varejista.
O tal “rombo tributário” apontado pela CervBrasil não é nenhuma novidade – tampouco é um rombo. Trata-se, na verdade, de uma discussão antiga sobre créditos tributários gerados na Zona Franca de Manaus por empresas que produzem na região.
A própria associação já tratou do tema anteriormente e, agora, enxergou uma janela de oportunidade, em razão do caso Americanas, para ressuscitar a discussão.
Fabricantes de concentrados de refrigerantes (uma espécie de xarope que serve de insumo para a produção da bebida final) têm direito a receber parte do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em forma de crédito tributário. A fábrica de refrigerantes da Antártica dentro do polo de Manaus garante à Ambev esse direito.
Briga antiga
Há anos, a Receita Federal tenta discutir a validade da aplicação desses créditos tributários, uma vez que, por terem fábricas localizadas na Zona Franca, as empresas de bebidas já são isentas do IPI na produção do concentrado de refrigerantes. Ou seja: elas recebem 8% do IPI, na forma de créditos tributários, sem ter pagado o imposto integral.
A CervBrasil alega que tal manobra de planejamento tributário causaria um prejuízo ao governo, por representar uma arrecadação menor de impostos. Embora a alegação seja verdadeira, o arranjo fiscal feito pela Ambev está previsto em lei.
“Os R$ 30 bilhões mencionados no artigo (da Veja), na verdade, referem-se às estimativas da Receita Federal do Brasil relacionadas a impostos acumulados e reivindicações em disputa entre o fisco e as empresas de bebidas. A parte eventualmente relacionada à Ambev é indiscutivelmente muito menor”, escreveram analistas do banco BTG Pactual, em relatório divulgado a clientes na tarde desta quarta-feira.
Outras empresas, como a Coca-Cola, também produzem na Zona Franca e têm direito aos mesmos créditos tributários – em volume até superior, uma vez que o negócio principal da Ambev é a produção de cerveja, não de refrigerantes.
Os analistas do BTG dizem que é possível que tais créditos sejam revisitados nas discussões da reforma tributária que o governo Lula promete aprovar ainda no primeiro semestre, mas que uma eventual mudança não deve gerar impacto significativo nas receitas da fabricante da Skol e Brahma, marcas que pertencem à Ambev.
Conforme a situação ganhou contexto pelas explicações, o movimento de venda das ações da Ambev na bolsa diminuiu. Pela manhã, os papéis da empresa chegaram a cair quase 6%, em razão do burburinho.
Em nota, a Ambev afirmou que “as acusações da CervBrasil não têm qualquer embasamento”.
“Calculamos todos os nossos créditos tributários estritamente com base na lei. Nossas demonstrações financeiras cumprem com todas as regras regulatórias e contábeis, as quais incluem a transparência do contencioso tributário. A Ambev está entre as 5 maiores pagadores de impostos no Brasil”, disse a empresa, no comunicado.