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Vaca louca: retomada de exportações de carne para China pode levar até 2 meses

A avaliação é do professor de patologia veterinária Claudio de Barros, um dos maiores especialistas do país na doença da “vaca louca”

atualizado

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1 de 1 imagem colorida claudio de barros patologista veterinario - Foto: Divulgação

O professor Claudio de Barros lecionou por 40 anos patologia veterinária na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Rio Grande do Sul. Depois disso, obteve o PhD na Colorado State University, nos Estados Unidos, e o pós-doutorado na Justus Liebieg Universität, na Alemanha.

Com tais credencias, é considerado a principal referência no Brasil quando o tema é a Encefalopatia Espongiforme Bovina (EEB) ou, dito de outra forma, o “mal da vaca louca”.

A doença ganhou notoriedade após um surto avassalador, iniciado na Grã-Bretanha, nos anos 1990, quando provocou o abate de mais de 180 mil cabeças de gado e a morte de cerca de 200 pessoas na Inglaterra.

Na avaliação de Barros, porém, tudo indica que o caso do mal da vaca louca descoberto nesta semana, em Marabá, no Pará, nem de longe terá consequências com esse grau de dramaticidade. “O problema até pode afetar as exportações brasileiras de carnes por uns dois meses”, diz. “Mas parece se tratar de uma versão ‘atípica’ da doença, cujos impactos serão muito menores.” Por quê? É o que Barros explica, a seguir, em entrevista ao Metrópoles.

O que pode ser dito sobre o caso do animal diagnosticado com o mal da vaca louca, descoberto nesta semana, no Pará?

Não temos todos os dados ainda. É preciso fazer um diagnóstico exato do problema, mas tudo indica que se trata de uma forma atípica do mal da vaca louca, cujo risco é mínimo tanto para o rebanho como para as exportações brasileiras de carne.

Se for assim, quanto tempo pode demorar para que esse episódio seja esclarecido e a exportação de carnes para a China, hoje interrompida, volte ao normal?

Não se pode dizer ao certo, mas como hipótese, acredito que tudo volte ao normal em cerca de dois meses (o governo brasileiro acredita que normalização pode ocorrer em abril). Na última vez que um caso desse tipo foi registrado no Brasil, em Nova Canaã do Norte, no Mato Grosso, em 2021, a retomada das exportações demorou mais tempo (foram 100 dias, na ocasião).

O que é essa doença?

A doença, em geral, ocorre tanto em pessoas como em animais. Em bovinos, ela apareceu na Inglaterra em meados dos anos 80. Como alguns animais contaminados ficavam agressivos, ela passou a ser chamada de mal da vaca louca. Nos laboratórios, os especialistas observaram que as células do cérebro do gado tinham uns furinhos, o que lhes conferia um aspecto de esponja. Daí, o nome técnico de Encefalopatia Espongiforme Bovina.

E como ela se propagou de uma forma tão intensa?

Na Inglaterra, o gado morto era levado para frigoríficos para a produção de ração animal. Ou seja, os bois se alimentavam dos restos dos bichos contaminados. Na Europa, essa ração também era vendida para países como Espanha, Holanda e França. Depois, foi para os Estados Unidos e para o Canadá. Com as medidas de restrição à produção desse tipo de ração, o problema terminou. Mas foi dramático.

O senhor estava lá nessa época?

Sim. Estudamos a doença e também vimos coisas impressionantes. Por volta de 1996, ocorreram casos de transmissões para humanos. Um problema genético influenciou nessa contaminação e perto 200 pessoas, todos jovens, morreram. Eram ingleses ou gente que havia passado pela Inglaterra. Isso me assustou porque eu morava lá e comia carne bovina. E aconteceram fatos muito curiosos.

Como quais?

Havia, por exemplo, uma empresa que fazia funerais para cães, nos quais eles eram incinerados. Quando veio a doença e o gado começou a ser abatido, o dono desse estabelecimento ganhou muito dinheiro. Ele tinha um dos poucos lugares em condições de incinerar tantos bois. Os cachorros ficaram em segundo plano.

Depois desse surto na Inglaterra, houve outro problema?

Sim. Um novo caso foi descoberto na Itália, em 2004. Mas foi bastante diferente, pois atingiu um animal que vivia no campo, não comia ração e era mais velho. Tinha oito anos, enquanto na primeira leva, na epidemia, os mais jovens também eram atingidos pelo mal da vaca louca.

A partir de quantos anos o gado é considerado velho?

Acima de 8 anos é velho. E foi nessa época, a partir do caso da Itália, que os patologistas passaram a chamar essas versões, digamos, de casos isolados, de forma “atípicas” da doença. Isso até para diferenciá-la da forma “clássica”, que provocou todo o problema nos anos 1990. No Brasil, o primeiro caso ocorreu em 2012 (no total, somam seis). Até agora, todos foram atípicos. Note-se que, no caso do animal recém-descoberto no Pará, ele também era velho, tinha 9 anos.

Além do problema na Inglaterra, outras epidemias atingiram humanos?

A incidência do problema em humanos é muito baixa. É de cerca de um caso para um milhão. Mas, por volta de 1920, houve uma epidemia numa ilha de Papua-Nova Guiné (na Oceania). Ali, nos funerais, havia um ritual que incluía o canibalismo dos mortos. Isso propagou o problema entre a população local. Na prática, o que ocorreu na Inglaterra, nos anos 1990, não foi muito diferente. Os bovinos eram alimentados com restos de animas mortos e contaminados.

Como o senhor avalia o controle de doenças desse tipo atualmente no Brasil?

As autoridades sanitárias internacionais elogiam o Brasil. Não há como evitar o problema, mas ele pode ser contido e analisado com cuidado. Parece que foi isso que aconteceu no Pará. Agora, um teste definitivo do animal morto, que vai definir se o caso foi atípico ou não, será feito no Canadá (no laboratório da Organização Mundial de Saúde Animal, em Alberta). Acredito que esse resultado deve sair em cerca de dez dias. Mas, como disse, tudo indica que será um caso atípico.

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