Reação do governo acalma ânimos, mas estrangeiro vê risco em golpismo
Para analistas, reação firme do governo e STF reduzem nível de risco para a economia local, mas investidor estrangeiro monitora novos atos
atualizado
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Quando surgiram as primeiras notícias sobre uma invasão de golpistas ao Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal e Palácio do Planalto, uma das dúvidas que surgiu foi como o estrangeiro enxergaria o ambiente político no Brasil.
A sessão da Bolsa de Valores desta segunda-feira (9/1) parece ter respondido, em partes a essa pergunta. O Ibovespa, principal índice de ações do mercado local, encerrou o dia praticamente estável, contrariando as previsões de uma debandada de investidores estrangeiros.
“Somos um mercado emergente que depende mais de 50% do volume de operações do investidor estrangeiro. A percepção de uma instabilidade institucional pode afastar esses investidores. O panorama vai depender da capacidade de resposta do atual governo”, disse Lorena Laudares, head de estratégia da Órama.
O desfecho positivo, portanto, parece estar relacionado à capacidade do governo de responder aos atos antidemocráticos. Ao longo de ontem, mais prisões de supostos envolvidos na quebradeira em Brasília foram realizadas, e governos locais atuaram no desmonte de acampamentos golpistas em frente a quartéis generais em diversos estados.
Embora as investigações estejam só no começo, com a Justiça prometendo buscar os possíveis financiadores dos atos violentos, a primeira reação pública pareceu acalmar os ânimos dos estrangeiros. A visão é de que, ainda que não tenha sido eficiente em evitar que os atos golpistas escalassem para tal nível, o poder público respondeu de maneira firme e ágil.
“Economias como o Brasil dependem do bom funcionamento das instituições democráticas. São essas instituições que mantêm sistema judicial e o respeito aos contratos em atividade. Os investidores monitoraram com atenção o que aconteceu. Isso dito, a resposta do governo parece ter dissipado as notícias negativas”, avaliou Victor Candido, economista-chefe da gestora RPS.
Novos atos
Apesar de o dia ter acabado em relativa calmaria, investidores observam com atenção o cenário local. O risco de novos atos democráticos não está totalmente descartado.
“Os rumos dos mercados nos próximos dias serão definidos pela capacidade das instituições brasileiras de conseguir evitar novos atos de vandalismo, e também não permitir a adesão de categorias importantes, como os caminhoneiros”, pondera Laudares, da Órama.
Apesar de a população ter se mostrado contra os atos terroristas em Brasília, conforme mostrou uma pesquisa da Quaest, movimentos pontuais não estão descartados. Sabendo disso, o governo deverá evitar temas espinhosos e potencialmente impopulares.
“Lula assumiu a Presidência com uma clara preocupação sobre seus níveis de popularidade, dada a polarização do país. Esse foi o contexto da decisão para postergar a volta da cobrança de impostos federais sobre os combustíveis. Os pontos expostos podem fazer com que o presidente esteja menos aberto a tomar medidas que impactem negativamente sua popularidade”, alerta a Eurasia, em relatório.
A equipe de análise da consultoria política global acrescenta que alguns acontecimentos podem ativar gatilhos no atual momento de instabilidade. Um deles é a eventual adoção de medidas impopulares, como já citado, e o outro seria uma eventual responsabilização de Jair Bolsonaro pelos atos de ontem (8/1).
“Se, por um lado, é improvável que o Supremo Tribunal Eleitoral retire os direitos políticos de Bolsonaro, é seguro dizer que as chances de isso acontecer aumentaram. Se isso acontecer, o risco de agitação social será maior”, alerta a Eurasia.
Fiscal no segundo plano
Enquanto muitas dessas questões seguem em aberto, espera-se que conforme o assunto seja superado, o mercado volte a olhar para os problemas que ocupavam a pauta antes dos atos antidemocráticos eclodirem.
“Ao longo do tempo, é provável que o impacto negativo seja dissipado, e o foco voltará a ser o debate sobre a política econômica”, avalia Marcelo Sá, analista do Itaú BBA, em relatório.
Se o governo ceder nas intenções de não entrar em searas negativas, é provável que o mercado volte a demonstrar sinais de preocupação. O déficit nas contas públicas projetado para 2023 é da ordem de R$ 231 bilhões, e pode crescer para acomodar novas despesas, inclusive as com a própria reforma dos prédios públicos depredados no domingo.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, prometeu levar ao Congresso a proposta de um novo arcabouço fiscal, substituto do teto de gastos, em abril. A instauração da intervenção na segurança do Distrito Federal até o final de janeiro e o foco dos parlamentares em medidas de apuração dos culpados possivelmente prorrogará as discussões do Congresso com a equipe econômica.
Nessa hipótese de o fiscal ficar em segundo plano, seria esperada uma queda da Bolsa e alta do dólar, diz o especialista do banco.