Quem poderá ser responsabilizado pelo rombo de R$ 20 bi na Americanas?
Especialistas dizem que presidente, diretores, conselheiros e até sócios da Americanas poderão ser punidos se houver indícios de fraude
atualizado
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O retrato, por enquanto, parece ser este: R$ 20 bilhões em dívidas foram maquiados no balanço contábil da Americanas durante quase uma década. Ainda há muito a ser respondido para entender como uma quantia tão grande de débitos passou despercebida por executivos da empresa, acionistas e até pelas diferentes empresas de auditoria contábil responsáveis por avalizar a situação financeira da varejista.
Se ficar comprovado que os R$ 20 bilhões desapareceram do balanço por fraude, por uma tentativa de esconder uma situação de endividamento que era (e agora é ainda mais) preocupante, será o pior escândalo desse tipo na história do mercado brasileiro. Para se ter ideia, a fraude contábil que faliu o banco Panamericano era de R$ 4 bilhões.
Nas próximas semanas e meses, as investigações que correm na Justiça e nos órgãos de fiscalização de mercado devem responder a essa e a muitas perguntas. Uma delas, e talvez a principal, é: quem são os responsáveis pelo rombo no balanço da Americanas?
“Caso seja confirmada a hipótese de manipulação do balanço, a fraude estaria caracterizada e sujeita a uma responsabilização nas esferas civil, administrativa e penal”, diz Fernando Zanotti Schneider, sócio do escritório Abe Advogados.
Processos
Por enquanto, estão em curso dois processos para apurar a atuação da empresa. O primeiro, na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), é um processo administrativo. Ou seja: caso as apurações iniciais indiquem fraude ou manipulação contábil, a CVM pode abrir uma investigação e punir os executivos da empresa com sanções administrativas – principalmente multas.
A autarquia pode decidir, também, encaminhar o resultado da investigação para que a Polícia Federal e o Ministério Público tomem providências.
Já há uma apuração do tipo em curso, mesmo antes de a CVM concluir as apurações dela. Foi aberto, ontem (13/1), um procedimento inicial pelo Ministério Público Federal de São Paulo (MPF-SP) para averiguar a possível prática de insider trading (uso de informação privilegiada) por executivos da Americanas.
Um levantamento exclusivo feito pelo Metrópoles revelou que a diretoria da varejista vendeu R$ 223 milhões em ações meses antes de o rombo ser levado a público.
Caso o MP comprove que houve crime, os executivos estarão sujeitos a penas de 1 a 5 anos de reclusão e multa de até três vezes o valor da vantagem ilícita obtida em decorrência da informação privilegiada. A promotoria poderá investigar, ainda, a eventual prática de fraude contábil e de manipulação de mercado.
Diretores e executivos são os principais alcançados
Especialistas ouvidos pelo Metrópoles avaliam que, caso comprovados os atos ilícitos, os primeiros a serem responsabilizados serão os diretores estatutários da Americanas que estavam no cargo quando as irregularidades foram cometidas. A diretoria estatutária é composta pelos executivos eleitos pelo conselho de administração para tomar as decisões estratégicas da empresa.
“Pela Lei das S/A (Lei das Sociedades Anônimas), os administradores podem ser responsabilizados pelos prejuízos às companhias. É papel dos diretores e executivos agir de acordo com dever fiduciário de lealdade e de diligência. Se esses deveres forem descumpridos, os administradores estatutários estarão sujeitos a penalidades”, diz Ivo Bari, sócio do escritório BVZ Advogados e professor do Insper.
Para Andréa Seco, sócia do escritório Almeida Advogados, não só os diretores e presidente estarão sob o alcance das penalidades. Como o conselho de administração e o conselho fiscal aprovam os balanços e dão aval aos exercícios financeiros, é possível que os conselheiros sejam também citados em ações judiciais.
“Se ficar comprovada a violação de conselheiros fiscais a seus deveres fiduciários previstos na legislação societária, não há dúvidas de que estes poderão ser responsabilizados, seja frente a própria companhia, acionistas ou mesmo a terceiros lesados”, diz Seco.
Ainda será preciso investigar também o papel das auditorias. Por lei, todas as empresas de capital aberto devem ser auditadas por empresas independentes. No caso da Americanas, a responsável por checar o balanço nos últimos anos foi a empresa PwC, que aprovou todos os exercícios sem ressalvas.
Em nota enviada ao Metrópoles, a PwC disse apenas que não comenta casos de clientes.