Por que esta “superquarta” pode mudar a dinâmica da economia mundial
A esperada queda de juros nos Estados Unidos deve afetar o fluxo de dinheiro e até a cotação do dólar, principalmente em países emergentes
atualizado
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Não há exagero em dizer que esta quarta-feira (18/9) pode mudar a dinâmica da economia mundial em diversos aspectos. E isso como resultado de um só movimento – o corte de juros nos Estados Unidos. A expectativa é que a redução seja anunciada nesta tarde pelo Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês), do Federal Reserve (Fed, o banco central americano).
E quanto os juros americanos vão cair? De acordo com a ferramenta de análise CME FedWatch, um indicador de relevância para o mercado, existem 65% de probabilidades de o corte ser de 0,50 ponto percentual sobre a taxa em vigor, hoje no intervalo entre 5,25% e 5,50%. Uma queda de 0,25 ponto percentual reúne 35% de chances. O mercado nem sequer cogitava na manutenção dos juros no atual patamar.
Para dar uma ideia do que essa perspectiva de corte representa, a última redução dos juros nos Estados Unidos ocorreu em março de 2020, quando o Fed derrubou a taxa para perto de zero diante da ameaça da Covid-19. Depois disso, foram 11 elevações seguidas entre 2022 e 2023. O atual patamar – o maior desde 2001 – foi alcançado em julho de 2023.
Mudança apetite
Agora, o que os agentes econômicos esperam não é apenas a redução pontual da taxa neste mês, mas, como dizem os economistas, o início de um ciclo de queda dos juros, embora sua intensidade ainda seja uma incógnita. É essa a mudança que pode ter expressivo impacto no mercado global.
Um desses efeitos diz respeito à volta de um maior apetite por investimentos de risco. Com os juros historicamente altos nos EUA, a atratividade dos títulos do Tesouro americano, os Treasuries, considerados os mais seguros do mundo, aumentou de forma expressiva nos últimos anos. À medida que a taxa comece a cair, no entanto, os especialistas esperam que cresça o interesse por ativos de renda variável, como as ações negociadas em Bolsas de Valores.
Fuga do Ibovespa
O Ibovespa, o principal índice da Bolsa brasileira (B3), tem sofrido no cenário atual, com os juros altos nos EUA. Só em 11 de setembro, por exemplo, os investidores estrangeiros retiraram R$ 455,5 milhões em recursos da B3. Com isso, o saldo negativo nesse quesito no ano ficou em R$ 28,7 bilhões.
Gustavo Bertotti, economista-chefe da Messem Investimentos, observa que essa debandada não se deve apenas ao menor apetite global por ativos de risco, como as ações brasileiras. Para ele, a fuga de recursos da B3 também está relacionada a problemas locais, como o risco fiscal do país, dado pela relação entre receitas e despesas do governo. Mas o início de um ciclo de corte de juros por parte do Fed pode no mínimo atenuar o ritmo dessa saída.
Queda do dólar
Na avaliação dos especialistas, como a queda de juros nos EUA favorece um maior fluxo de capital para países emergentes, existe a tendência de desvalorização do dólar frente a outras moedas, embora essa reação não ocorra necessariamente num primeiro momento depois do corte.
O fato é que, com os juros altos nos EUA, o real vem acumulando perdas. Um levantamento feito em julho pela consultoria Elos Ayla mostrou que, entre 27 moedas, a brasileira foi a que mais se desvalorizou em relação ao dólar em 2024. Isso embora quase todas as demais tenham caído. Do total analisado, só a Libra esterlina (Inglaterra) e o rubro (Rússia) aumentaram de valor na comparação com a moeda americana.
Diferencial de juros
Os analistas de mercado consideram que, com o corte do Fed, um maior fluxo de dólares pode convergir para o Brasil por causa da diferença de juros entre os dois países (no jargão, o termo usado é “diferencial de juros”). Isso porque, como se viu até aqui, a taxa americana deve ser reduzida em 0,25 ou 0,50 ponto percentual.
Em contrapartida, o mercado espera que a taxa básica de juros do Brasil, a Selic, seja elevada em pelo menos 0,25 ponto percentual também nesta quarta-feira (18/9), daí o termo “superquarta”, após a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC).
Assim, em suma, a queda lá e a elevação dos juros por aqui tornam a remuneração dos ativos brasileiros ainda mais atraente para investidores estrangeiros.
Menor pressão global
Por fim, afirmam os especialistas como Enrico Cozzolino, sócio e líder de análise da Levante Investimentos, o corte de juros nos Estados Unidos também alivia a pressão do cenário global sobre a economia brasileira e de outros países emergentes. Em última instância, tal fator pode favorecer a queda de juros no Brasil, ainda que isso não ocorra num curto prazo de tempo.