Para economistas, inflação na meta não muda ritmo de corte de juros
Embora expectativa do mercado sobre alta de preços esteja “ancorada”, cenário externo e questão fiscal ainda impedem maior redução da Selic
atualizado
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Nesta segunda-feira (16/10), aconteceu uma mudança pela qual os agentes econômicos esperavam há um bom tempo. O Relatório Focus, divulgado pelo Banco Central (BC), mostrou que o mercado reduziu a estimativa de inflação para este ano de 4,86% para 4,75%. Com isso, a expectativa em torno da taxa ficou dentro do limite superior da meta de inflação estabelecida para 2023 – os exatos 4,75%.
Não se trata de um dado irrelevante. Em janeiro, a estimativa de inflação captada no mesmo Focus era de 5,62% para 2023. Em março, ela subiu ainda mais, alcançando 5,93%. “No início do ano, parecia impossível que a inflação ficasse dentro da meta, mesmo considerando seu limite superior”, diz o economista Emerson Marçal, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EESP). “Por isso, atingir esse patamar agora não deixa de ser uma vitória.”
Para Marçal, uma vez que a expectativa de inflação foi “ancorada”, ou seja, que ela ficou dentro da meta, o Banco Central “tem um caminho mais seguro para sustentar a redução” dos juros básicos do país, a Selic. Em agosto, o BC cortou a taxa em 0,5 ponto percentual e anunciou que poderia fazer mais duas reduções do mesmo tamanho até o fim do ano. Isso levaria a Selic dos atuais 12,75% para 11,75% ao ano.
Na avaliação do economista da FGV, o fato de a inflação estar na meta não significa, porém, que cortes maiores de juros podem ser feitos pelo BC ainda neste ano. “O quadro atual, principalmente em relação ao cenário externo, ainda não permite que pensemos em reduções mais expressivas”, diz Marçal. “Mas o fato de as expectativas estarem dentro da meta tira o foco dos problemas do curtíssimo prazo, o que já representa um alívio para o BC e para a economia em geral.”
Front externo
A mesma opinião é compartilhada pelo economista André Braz, coordenador de índices de preços do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). Ele afirma que os juros não devem cair de forma mais rápida neste ano, mesmo depois da nova estimativa presente no Relatório Focus. “Na verdade, há alguns especialistas afirmando que o contrário pode ocorrer. Ou seja, que a segunda e última redução da Selic neste ano pode ficar em 0,25 ponto percentual e não em 0,5 ponto porcentual como se imagina”, diz.
Braz observa que redução e 0,5 para 0,25 não ocorreria por causa de uma piora dos números da inflação, mas, sim, como resultado de um agravamento do cenário global. “Grandes países estão mantando taxas de juros bastante altas e, agora, veio conflito no Oriente Médio que aumenta a instabilidade no quadro internacional”, afirma. “No Brasil, também temos incertezas sobre a questão fiscal (a relação entre gastos e receitas do governo). Somado, tudo isso pode pesar contra uma redução do tamanho do corte da Selic.”
Mesmo assim, nota Braz, o impacto negativo desses fatores, mesmo que muitos deles sejam confirmados, não deve ser sentido nos juros em 2023. “Acho que não vai dar tempo disso acontecer”, diz. “Acredito que os dois cortes de 0,5 ponto percentual ainda vão ocorrer em 2023. Mas essa talvez seja uma preocupação que tenhamos de levar para 2024.”
Queda da inflação
Entre os fatores que fizeram com que o mercado reduzisse a estimativa de inflação em 2023, Marçal, da EESP FGV, destaca o papel exercido pelo Banco Central nesse processo. “O BC teve o mérito de subir os juros na hora certa e de resistir a pressões para baixá-los no momento errado”, diz. “Além disso, o Ministério da Fazenda também criou as regras do marco fiscal, que estão muito longe de serem perfeitas, mas não chegam a ser uma tragédia. Tivemos ainda uma excelente safra agrícola que puxou para baixo o preço dos alimentos.”
Daí, afirma Marçal, a queda da previsão para 4,75% ao ano. De acordo com o Conselho Monetário Nacional (CMN), a meta de inflação para 2023 é de 3,25%. Como há um intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo, ela será cumprida se ficar entre 1,75% e 4,75%.