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O que explica o tombo do agro e quais as perspectivas para 2023

Guerra na Ucrânia, escalada nos preços de fertilizantes, quebra da safra da soja e condições climáticas adversas prejudicaram setor em 2022

atualizado

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Michael Melo/Metrópoles
Atividade agrícola no Brasil (agronegócio)
1 de 1 Atividade agrícola no Brasil (agronegócio) - Foto: Michael Melo/Metrópoles

Principal motor da economia brasileira na última década, o agronegócio engasgou em 2022. No ano passado, com a escalada nos preços de fertilizantes e agrotóxicos, o clima desfavorável à produção em algumas regiões do Brasil, as incertezas causadas pelo período eleitoral e os efeitos da guerra entre Rússia e Ucrânia, o setor passou longe de reeditar o desempenho dos anos anteriores.

Segundo estimativas da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), maior entidade representativa do setor agrícola no país, o Produto Interno Bruto (PIB) do agro pode ter encerrado 2022 com uma queda de 4,1% em relação ao ano anterior. Para que se tenha uma ideia do tombo, o agronegócio avançou 8,3% em 2021.

De acordo com a entidade, o desempenho no ano passado foi duramente afetado pela quebra da safra de soja e pelo aumento dos preços dos defensivos e fertilizantes, que subiram mais de 100%.

“Tivemos um ano eleitoral no Brasil, o que sempre atrapalha um pouco, mas o principal foi a guerra na Ucrânia. Houve um aumento violento no preço dos insumos, principalmente nos primeiros meses do conflito”, afirma o empresário Antônio Cabrera, que foi ministro da Agricultura no governo do ex-presidente Fernando Collor (1990-1992), em entrevista ao Metrópoles.

Natural de São José do Rio Preto (SP), oriundo de uma família de produtores rurais do interior paulista, Cabrera conhece como poucos a realidade do agronegócio brasileiro. Para ele, os grandes obstáculos para o agro são os elevados preços dos fertilizantes.

“O principal motivo que levou a esse recuo, principalmente no último trimestre do ano passado, é a questão dos fertilizantes. É o ponto fraco do agronegócio hoje. A gente precisa ter uma política de independência, é uma questão de segurança nacional. Tomara que o novo ministro (Carlos Fávaro) encare esse problema de frente. O que a gente precisa é começar a ter uma política que valorize a produção de insumos para o agro, principalmente fertilizantes, como ureia, nitrato e fosfato”, diz Cabrera.

“A guerra na Ucrânia teve grande impacto nisso. Tivemos fertilizantes que quadruplicaram de preço. As commodities também subiram, mas não proporcionalmente ao preço dos insumos”, completa o ex-ministro.

Até setembro de 2022, a média de preços dos fertilizantes importados pelo Brasil era de R$ 3,39/kg, mais do que o dobro do valor praticado no mesmo período do ano anterior (R$ 1,64/kg).

A situação melhorou um pouco no fim do ano e, em dezembro, houve uma redução de 6% no preço médio dos fertilizantes, principalmente nitrogenados. Com a retomada da demanda e estoques mais ajustados, os preços dos fertilizantes fosfatados se estabilizaram, revertendo a tendência observada durante boa parte do ano.

“De forma geral, diante de tudo o que aconteceu no mundo, como a pandemia e depois a guerra, não acho que tenha sido uma queda tão significativa (do PIB do agronegócio)”, comenta Cabrera, que diz ter uma visão otimista em relação a este ano.

Retomada em 2023

Muito por causa de uma base de comparação fraca, após a queda expressiva do ano passado, o agronegócio brasileiro deve voltar a crescer em 2023, segundo especialistas do setor.

De acordo com projeções da CNA, o PIB do agro deve terminar este ano com alta de 2,5% em relação a 2022. A estimativa do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) é ainda mais ousada: crescimento de 8%. Se confirmado, será o maior do setor desde 2017 (14,2%). O Banco Santander, por sua vez, calcula uma expansão de 7,5%.

A retomada do agronegócio em 2023 deve ser impulsionada por um novo recorde da safra. Segundo o Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a safra brasileira de cereais, leguminosas e oleaginosas deve alcançar 296,2 milhões de toneladas – o que corresponderá a um aumento de 12,6% ou 33,1 milhões de toneladas de grãos.

A CNA, por sua vez, estima que a safra de grãos 2022/2023 registrará uma alta de 15,5% em relação à de 2021/2022, chegando a 313 milhões de toneladas, com aumento da área plantada e recuperação da produtividade da soja após a seca que castigou o Sul do país no ano passado.

Foi justamente a seca no Sul que provocou uma quebra na produção de soja, que despencou 11,4% na comparação com 2021. Mesmo assim, a produção foi recorde: 263,155 milhões de toneladas de grãos em 2022 (alta de 3,9%), de acordo com dados do IBGE.

Bruno Lucchi, diretor técnico da CNA, diz que o agro “continua muito importante para o país”. “Em 2020, nós crescemos em torno de 20% e, em 2021, 8%”, destaca.  Segundo a entidade, 2023 será um “ano de desafios, tanto no ambiente interno quanto no cenário externo” e “poderá haver uma margem de lucro menor”, com redução de receita para o produtor rural e alta dos custos de produção.

“Tenho uma visão otimista. Estou mais próximo desse crescimento de 8%”, aposta Cabrera. “As commodities devem voltar a aquecer a economia, principalmente com a reabertura e flexibilização da China em relação à Covid. Vejo um cenário mais positivo. O que não sei dimensionar é a questão política. Tomara que não atrapalhe, que não haja insegurança”, diz.

Retrocesso no Ministério da Agricultura

Com experiência na vida pública, Antônio Cabrera diz que o setor deve se unir em torno do ministro Carlos Fávaro, independentemente de posições políticas – o agronegócio, em sua ampla maioria, apoiou a candidatura de Jair Bolsonaro à reeleição –, mas alerta para mudanças “preocupantes” na configuração do Ministério da Agricultura.

O governo Lula decidiu tirar a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) do guarda-chuva da pasta e transferir o órgão para o recriado Ministério do Desenvolvimento Agrário, comandado pelo petista Paulo Teixeira (SP).

A Conab está presente em todas as regiões brasileiras, com superintendências nos 26 estados e no Distrito Federal. Segundo o governo, a função do órgão é “prover inteligência agropecuária e participar da formulação e execução de políticas públicas, contribuindo para a regularidade do abastecimento e formação de renda do produtor rural”.

“A unificação das políticas agrárias tinha sido um grande avanço. Agora isso se separou, o que é um retrocesso”, critica Cabrera. “A Conab era o centro de inteligência do Ministério da Agricultura. Hoje, vivenciamos o poder da informação. Sem essas informações, o ministério poderá ficar capenga”.

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