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O pior da crise passou? Como será a nova fase das startups brasileiras

Ainda há dinheiro para startups no Brasil, garantem especialistas. Mas momento é de consolidação de modelos e mais critério nas apostas

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Ilustração colorida de mãos segurando notas de dinheiro ao redor de uma lâmpada, que simboliza uma ideia - Metrópoles
1 de 1 Ilustração colorida de mãos segurando notas de dinheiro ao redor de uma lâmpada, que simboliza uma ideia - Metrópoles - Foto: oxygen/Getty Images

O mercado brasileiro de startups viveu, nos últimos anos, um momento como nunca antes: o dinheiro jorrou para as companhias locais, com mais de US$ 20 bilhões aportados em quatro anos. O tombo, porém, veio de forma dolorosa desde o ano passado, com guerra, juros altos e investidores pisando no freio.

O cenário levou à queda de mais de 50% nos aportes de capital de risco (o chamado venture capital) em 2022 e no primeiro semestre deste ano. Sem acesso ao dinheiro farto de até então, startups das grandes às pequenas fecharam frentes de negócio e demitiram equipes.

Agora, alguma melhora começa a ser vislumbrada, afirmam fontes do mercado, e o setor pode adentrar uma nova fase.

No cenário macroeconômico, a recessão global prometida não veio, o fim da alta de juros está mais próximo e a inflação tem desacelerado no Brasil e no exterior. Embora longe dos valores do pico em 2021, os investimentos em venture capital saíram do fundo do poço vivido em março após a quebra do Silicon Valley Bank. Em junho, o montante subiu pelo terceiro mês seguido, segundo relatório do Distrito, que monitora o setor.

“O momento segue sendo de apertar os cintos para todas as companhias. Enxergamos que as empresas devem continuar aproveitando [o que já foi captado] para sobreviver a esse momento mais difícil economicamente”, diz Eduardo Fuentes, head de Research do Distrito.

“Mas o mercado de tecnologia continua existindo e será significativo. Há oportunidades em setores como inteligência artificial, a bola da vez, mas também energia, mobilidade e outros”, diz.

Aceitar o risco, mas nem tanto

O cenário, ainda assim, seguirá diferente no médio prazo, com investidores mais seletivos.

“Os fundos têm dinheiro para fazer alocação, muitos se capitalizaram nos últimos anos”, diz Gabriela Morais Toribio, da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP) e diretora na Wayra Brasil e Vivo Ventures.

Mas ela diz que há menos “FOMO”, o termo em inglês para o “medo de ficar de fora” (ou fear of missing out), que deu o tom do mercado até 2022. “Quando olhamos custo-oportunidade, há menos esse medo agora”, diz.

A maioria das startups costuma operar por anos em prejuízo, abaixo do chamado break even. Os investidores topam esse risco e buscam os negócios que julgam mais promissores com a esperança de que, no futuro, ocorra a chamada “saída”, quando sua fatia na empresa é vendida ou a startup abre capital na bolsa.

Investidores esperam retornos de até 100 ou 200 vezes para investimentos que foram feitos em startups ainda em estágio inicial – o múltiplo é menor para as startups maiores, nas quais o investimento é menos arriscado porque o negócio já está mais consolidado.

Para cada startup que “dá certo” e gera uma saída, no entanto, dezenas de investidas não dão o resultado esperado. No Brasil, mais de dois terços das startups fecham antes de completar 20 meses, segundo cálculo da Associação Brasileira de Startups (Abstartups).

Até a crise, as empresas que conseguiram criar serviços populares aproveitaram o momento de bonança para levantar recursos milionários. Levantamento do Distrito feito a pedido do Metrópoles mostrou que os maiores aportes individuais foram para Nubank (que captou mais de US$ 1,1 bilhão em duas rodadas em 2021, antes de abrir capital na bolsa) e iFood (US$ 500 milhões em 2018).

Na lista dos 15 maiores, figuram ainda Loft e QuintoAndar, do mercado imobiliário, Gympass, de passes em academias e Creditas, Ebanx e Neon, do setor financeiro, além da argentina Decolar.com. Esse grupo recebeu os maiores aportes do histórico brasileiro, com rodadas de US$ 200 milhões ou mais. Ainda assim, todas viveram cenário de demissões e reestruturação desde o ano passado.

Consolidação

Mesmo com alguma recuperação no mercado, o tempo de recorrer aos “mega-aportes” ficou para trás: as rodadas acima de US$ 100 milhões caíram de 30 em 2021 para 12 em 2022 – e somente uma até junho de 2023, segundo o Distrito.

Para as startups, o novo momento tem demandado fechar a torneira, adiar apostas em novos negócios e buscar cada vez mais operar com caixa próprio. Startups em estágios iniciais, por sua vez, terão agora de provar melhor seu modelo antes de angariar os primeiros recursos.

“Mudou-se o patamar de exigência”, diz Fuentes, do Distrito. “E temos visto muitos casos de um mercado ‘do meio’ endereçado pelos investimentos, por exemplo. Não necessariamente vai trazer um retorno tão grande, mas talvez fique entre cinco e 10 vezes, o que pode ser melhor do que tomar risco maior para um retorno gigantesco”, diz.

Nesse novo momento, há ainda boas perspectivas para o modelo do chamado venture capital corporativo (CVC), em que grandes empresas fazem aportes de risco em startups. O venture capital corporativo chegou a US$ 2,5 bilhões alocado em fundos do tipo no Brasil, parte do dinheiro ainda a ser usado.

O VC corporativo já participa de um quarto das rodadas no Brasil, pelas estimativas de Toribio, da ABVCAP. E há espaço para mais, na visão da executiva, que é responsável pelos investimentos dos braços de CVC de Vivo e Telefônica.

“Em CVC, há outras avenidas de valor além do retorno financeiro. A depender do caso, podemos ter startups que não estão performando tão bem, mas que geram valor para a companhia investidora”, diz. “Antes isso era feito sobretudo por estrangeiras, mas vemos hoje empresas brasileiras também estruturando seus fundos, como CSN, Embraer e Vivo”, diz.

Toribio avalia que o cenário desafiador no universo das startups é natural, mas que o mercado não está parado – apenas se movimentando para uma consolidação. “Em termos de investimento minoritário, vimos também muitas aquisições, com várias startups de base tecnológica se juntando. É algo cíclico, mas sempre superamos a volatilidade de alguma forma”, diz.

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