Mercado reprova fala de Lula e vê tentativa de pressão sobre BC
Segundo analistas, impacto de declarações de Lula é mais político do que econômico; petista quis mandar recado ao BC para redução de juros
atualizado
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As declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante entrevista à GloboNews na quarta-feira (18/1), na qual classificou a autonomia do Banco Central (BC) como “bobagem” e disse que a atual meta de inflação atrapalha o crescimento econômico, preocupou o mercado financeiro, fez o dólar subir e deve mexer com a Bolsa de Valores nesta quinta-feira (19/1).
Analistas ouvidos pela reportagem do Metrópoles afirmaram que o mercado recebeu mal a fala de Lula, mas minimizaram o impacto prático do que disse o presidente. Segundo economistas, o petista quis mandar um recado ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, deixando claro que o novo governo considera muito alta a taxa básica de juros da economia (Selic), hoje em 13,75% ao ano, o que não significa que a autonomia do BC ou o regime de metas fiscais estejam ameaçados.
“Para o mercado, em um primeiro momento, é muito ruim. Gera temor de que possa ser um governo altamente populista que mexeria nos pilares da economia. Mas temos que sair um pouco deste momento de calor e olhar pelo lado político. A discussão ali é muito mais para colocar pressão na discussão sobre a redução da taxa de juros”, explica Hugo Queiroz, estrategista-chefe e diretor do TC.
“O mercado não precisa acreditar nesse discurso de que ele colocará a independência do BC em debate porque isso não vai acontecer. É um discurso muito mais político”, afirma Queiroz. “O mercado não deveria olhar por esse ponto de vista de reversão de reformas estruturais, mas pelo foco político. De fato, o nosso juro real é muito alto. Daria para ir para um patamar mais baixo.”
Segundo os analistas, apesar de, possivelmente, não representar riscos imediatos à autonomia do BC ou ao regime de metas de inflação, as declarações de Lula transmitem uma péssima sinalização ao mercado.
“Eu recebi com perplexidade as declarações do Lula. Ele foi claramente infeliz”, afirma Benito Salomão, doutor em economia pelo PPGE-UFU. “A independência do BC é um fato evidente na literatura econômica: BCs independentes têm mais facilidade de perseguir metas de inflação com aperto monetário menor”, diz o economista.
“Um outro ponto que causa preocupação é a suposição de que a meta de inflação pode ser revisada. É uma sinalização muito ruim. Você passa o recado de que o BC não consegue perseguir essa meta”, prossegue Salomão.
“Para o agente que fixa preço, qual é a conclusão? Se o BC não é capaz de entregar uma inflação na meta de 3,25% ou 3,5%, por que seria capaz de entregar em uma meta maior do que essa? Você corrói a credibilidade da política monetária. O regime de metas de inflação, para funcionar bem, depende da credibilidade.”