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“Lula está cumprindo o que prometeu”, diz ex-ministro de Bolsonaro

Para Adolfo Sachsida, governo Bolsonaro deixou “belo legado” na economia, que permitirá ao Brasil atrair investimento externo e crescer

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1 de 1 Imagem colorida de Adolfo Sachsida - Foto: Anderson Riedel/PR

Aos 50 anos, o economista Adolfo Sachsida está de volta à iniciativa privada após um período intenso em Brasília, no qual exerceu papel importante durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Braço direito do ex-ministro da Economia Paulo Guedes, Sachsida ocupou a Secretaria de Política Econômica (entre 2019 e 2022), teve uma rápida passagem pela chefia da Assessoria Especial de Assuntos Estratégicos do Ministério da Economia e terminou a gestão como ministro de Minas e Energia.

Em entrevista ao Metrópoles, Sachsida defende o legado econômico do governo passado, mas evita críticas mais duras ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Para o economista, o petista vem cumprindo os compromissos que assumiu durante a campanha  – o que significa mais gasto público e um Estado mais inchado.

“Eu prefiro que tenhamos mais iniciativa privada, mais investimento privado, mais privatizações, mais concessões, menos tributos e menos gasto público. Mas eu pertenço a um grupo que foi derrotado nas eleições. É natural que quem venceu a eleição implemente sua agenda econômica e me parece que isso está sendo feito”, afirma.

Sachsida refuta a tese propagada pelo PT de que o governo Bolsonaro teria deixado ao sucessor uma “herança maldita”. “Nós fomos o primeiro governo com um ciclo de quatro anos a terminar o mandato gastando menos em relação ao PIB do que quando entramos. O governo gastava 19,4% do PIB. Quando saímos, o gasto era de 18,3%. Quando assumimos, a relação dívida/PIB estava em torno de 78%. Quando saímos, ela estava em 72,9%”, diz o ex-ministro.

“Quando você olha o agregado dos indicadores, fica evidente que deixamos um belo legado e fizemos um grande trabalho. E não fizemos isso sozinhos. Nós seguimos uma agenda que começou em 2016 (no governo de Michel Temer) e teve sucesso. É assim que um país cresce: quando aquilo que está certo é mantido e o que está errado é corrigido.”

Na entrevista, Adolfo Sachsida elogia o trabalho do ministro da Fazenda, Fernando Haddad; projeta uma discussão mais longa sobre a reforma tributária no Senado; afirma que a Petrobras deveria ser privatizada; e diz que o atual governo erra ao questionar no Supremo Tribunal Federal (STF) a privatização da Eletrobras, aprovada pelo Congresso Nacional em 2021.

“Quando o governo começa a se meter demais no setor privado, isso gera uma série de instabilidades que vão diminuir o investimento e o crescimento econômico no longo prazo”, critica.

Leia os principais trechos da entrevista concedida por Adolfo Sachsida ao Metrópoles:

Em 6 meses de mandato, o governo Lula aprovou o novo marco fiscal na Câmara e no Senado e a reforma tributária na Câmara. Qual é a sua avaliação sobre o trabalho da equipe econômica até aqui?

É um governo que está sendo consistente com aquilo que prometeu durante a campanha. Nesse sentido, acredito que está fazendo um bom trabalho em relação às promessas que foram feitas. Eu pertenço a um grupo de pessoas que prefere um Estado menor. Entretanto, a agenda que saiu vitoriosa das eleições prega outra coisa. Dentro dessa perspectiva, as promessas que foram feitas ao longo da campanha pelo presidente Lula estão sendo cumpridas. Eu respeito e desejo sucesso. Todos nós queremos o sucesso do Brasil. É uma questão de visão de mundo. Eu prefiro que tenhamos mais iniciativa privada, mais investimento privado, mais privatizações, mais concessões, menos tributos e menos gasto público. Mas eu pertenço a um grupo que foi derrotado nas eleições. É natural que quem venceu a eleição implemente sua agenda econômica e me parece que isso está sendo feito.

No início do ano, havia muita desconfiança do mercado em relação à condução da economia em um novo governo do PT, mas essa avaliação melhorou. O senhor considera que o ministro Fernando Haddad tem surpreendido positivamente?

Eu tinha certeza de que ele faria um bom trabalho. Nós temos de separar a vida das pessoas antes e depois de assumirem determinados cargos públicos. Quando você está na academia, é natural que seja um pouco mais agressivo no debate de ideias. Mas quando você assume um cargo público de relevância, não está mais defendendo apenas as suas ideias, mas um projeto de governo. Eu já esperava que haveria muita serenidade e prudência por parte do ministro Haddad. Nós temos de respeitar a agenda vitoriosa nas eleições. É uma agenda que implica, necessariamente, mais gasto público. Se vai gastar mais, vai ter de tributar mais. É o que nós temos visto. Acredito que o mercado esteja aprovando essa consistência: já que o governo vai arrecadar mais, vai aumentar a carga tributária. Eu apenas reitero que pertenço a um grupo que prefere menos gasto público, menos tributos, mais investimento privado, mais privatizações.

Qual é a sua avaliação sobre a proposta de reforma tributária aprovada pela Câmara? Ainda há muitos ajustes a serem feitos no Senado?

Nós temos de separar a discussão em abstrato da discussão em concreto. Em abstrato, o Brasil vem discutindo uma nova reforma tributária há mais de 20 anos. Em teoria, já debatemos bastante esse assunto. A crítica que alguns fizeram é mais no aspecto concreto, com o texto escrito. Alguns parlamentares reclamaram do pouco tempo que tiveram para analisar o projeto. Agora, eu acredito que essa discussão ainda vai longe. Acho difícil que a reforma seja aprovada definitivamente antes de novembro. Vai para o Senado e acredito que a questão do Conselho Federativo provavelmente sofrerá mudanças e o texto terá de retornar à Câmara. Com isso, haverá mais tempo para o debate, que poderá ser feito com maior tranquilidade. É importante lembrar que a PEC da reforma tributária é apenas um primeiro passo. Depois disso será necessária aprovação de uma série de leis complementares. É um tema que ainda permanecerá na agenda legislativa pelo menos até o ano que vem.

Mas o senhor vê problemas na reforma que foi aprovada?

Respeito muito as pessoas que formularam essa PEC. São profissionais de altíssimo gabarito que montaram um arcabouço tributário que tem vários méritos. Mas eu venho de uma tendência mais conservadora, que não gosta de grandes mudanças. Prefiro pequenas mudanças marginais porque, se dá algo errado, é fácil corrigir. Quando são feitas grandes mudanças, a chance de dar um problema mais sério é muito grande e fica mais difícil corrigir. De novo, é uma questão de visão de mundo. Eu preferiria uma reforma tributária mais parecida com aquela que nós estávamos tentando fazer no governo passado. Reduzir tributos, reduzir as obrigações acessórias, simplificar o processo, usar tecnologia para facilitar a arrecadação de tributos e avançar no IVA federal, juntando apenas PIS e Cofins. Esse tipo de arcabouço tributário já seria um enorme ganho para a economia brasileira.

O cenário econômico externo tem se mostrado menos turbulento do que se esperava no início do ano, quando a recessão nos Estados Unidos era dada como certa. O “boom” das commodities e a safra agrícola recorde também têm ajudado. Lula é um homem de sorte?

Eu não gosto de olhar por aí, não. Temos de olhar o que cada um tem feito. Você pode aprovar ou não aprovar o presidente Lula, mas não dá para negar que ele está cumprindo aquilo que prometeu. Ele prometeu que não privatizaria empresas e está cumprindo. Ele prometeu que mudaria a regra do teto de gastos e está cumprindo. Ele prometeu uma tributação que desse sustentação ao aumento de gastos e está cumprindo. Sorte é uma coisa que vai e vem. Mais importante é olhar a consistência e esse governo é consistente. Ele está seguindo uma linha da qual eu discordo, mas que eu respeito. Agora, acho que o ambiente externo ainda inspira certos cuidados. Esse aumento global das taxas de juros vai trazer consequências. Quando você observa o endividamento das famílias e das empresas que ocorreu em decorrência da pandemia e, logo depois, o aumento da taxa de juros, isso vem gerando efeitos na China, na Alemanha e em vários países da Europa.

O governo acionou o STF para tentar aumentar seu poder de voto na Eletrobras. Como o senhor avalia os questionamentos da União à privatização da empresa?

Novamente, me parece que o presidente Lula está cumprindo uma promessa de campanha. Ele avisou, durante a campanha, que faria isso. Nesse sentido, ponto para o presidente Lula. Quando você vota em um candidato, quer que ele cumpra aquilo que prometeu. Mas é claro que eu apoio uma agenda oposta a essa. Quando o governo começa a se meter demais no setor privado, isso gera uma série de instabilidades que vão diminuir o investimento e o crescimento econômico no longo prazo. Do ponto de vista estritamente econômico, eu prefiro que não se mexa naquilo que já foi decidido.

A Petrobras mudou a política de preços dos combustíveis, acabando com a vinculação das tarifas à flutuação do valor praticado no mercado internacional. O que o senhor achou dessa medida?

Vou responder da mesma forma: o presidente Lula está cumprindo com suas promessas de campanha. Ele foi muito enfático dizendo que mudaria a política de preços da Petrobras e que interromperia as vendas das refinarias. É o que ele está fazendo. Ele falou que faria isso. E não falou uma ou duas vezes, mas várias. Do ponto de vista pessoal, eu acho que não é o melhor caminho.

O senhor defende a privatização da Petrobras?

Sim. Aliás, era o que eu havia prometido enquanto ministro. Nós começamos o processo para a venda dos contratos da PPSA (Pré-Sal Petróleo, empresa pública federal vinculada ao Ministério de Minas e Energia). Nós, inclusive, mandamos um projeto de lei para o Congresso Nacional e iniciamos os estudos para a privatização da Petrobras. É uma privatização que geraria competição. Não era só privatizar. Era privatizar a Petrobras e gerar um ambiente de competição no setor de petróleo e gás no Brasil.

Lula costuma dizer que o governo de Jair Bolsonaro deixou uma “herança maldita”, mas os números do fim do ano passado mostram um cenário mais positivo na economia do que faz crer o discurso do PT. Afinal, o legado deixado por Bolsonaro e Paulo Guedes é positivo ou negativo?

Melhor do que acreditar em mim é acreditar nos dados, nos números. Nós fomos o primeiro governo com um ciclo de quatro anos a terminar o mandato gastando menos em relação ao PIB do que quando entramos. O governo gastava 19,4% do PIB. Quando saímos, o gasto era de 18,3%. Quando assumimos, a relação dívida/PIB estava em torno de 78%. Quando saímos, ela estava em 72,9%. Nós reduzimos 13 tributos de maneira permanente e, ainda assim, a arrecadação federal bateu recorde. Nós reduzimos o gasto com Previdência, com pagamento de juros e com a máquina pública. Além disso, aprovamos uma série enorme de marcos legais, como os do saneamento, do gás, de ferrovias, de cabotagem, cambial, de securitização e de garantias. Aprovamos a autonomia do Banco Central e a modernização dos registros públicos. Houve uma série de reformas microeconômicas que dinamizaram o PIB e a geração de empregos no Brasil. Nós criamos 14 novos instrumentos financeiros e o número de brasileiros investindo em bolsa aumentou em seis vezes entre 2018 e 2022. O volume transacionado em renda variável aumentou em 7,5 vezes nesse período. O número de brasileiros trabalhando chegou a quase 100 milhões. A inflação no Brasil foi menor que a dos Estados Unidos. O nosso crescimento econômico foi maior que o da China. Quando você olha o agregado dos indicadores, fica evidente que deixamos um belo legado e fizemos um grande trabalho. E não fizemos isso sozinhos. Nós seguimos uma agenda que começou em 2016 (no governo de Michel Temer) e teve sucesso. É assim que um país cresce: quando aquilo que está certo é mantido e o que está errado é corrigido.

Esse legado está ameaçado pelo atual governo?

Não tenho essa impressão. Nos últimos 10 anos, o Brasil tem sofrido com muito ruído. Mas, quando a gente separa o ruído do que efetivamente vem acontecendo, é possível observar que o país tem avançado muito. Honestamente, eu acredito que o Brasil é hoje o grande porto seguro dos investimentos. Está havendo uma grande alocação de capital no mundo. Basta que nós diminuamos um pouquinho os ruídos e esse dinheiro virá para o Brasil. Setor de mineração, de energia, petróleo e gás, as concessões que já foram feitas de ferrovias, rodovias… temos uma grande perspectiva de que os investimentos podem ser feitos no Brasil. Acredito que a economia brasileira está em um bom momento. Basta insistir no que está dando certo e corrigir alguns erros para que nós tenhamos boas taxas de crescimento.

Recentemente, o senhor retornou à iniciativa privada, trabalhando na empresa de tecnologia Teckey Solutions, que atua no setor de crédito. Como tem sido sua nova rotina profissional?

Estou muito feliz. O mercado brasileiro de crédito dará um grande salto. Quando você olha os números, o crédito está em torno de 52% em relação ao PIB no Brasil. Em países com o mesmo padrão de desenvolvimento do Brasil, a relação crédito/PIB vai a 80%, 85%. Nos países desenvolvidos, é de 95%, 100%. Com a aprovação dos novos marcos legais nos últimos seis anos, acredito que o crédito terá uma forte expansão. Com esse grande aumento de crédito, você vai ter uma demanda enorme por novas tecnologias de combate a fraudes e por novas tecnologias de registro de contratos, por exemplo. E é justamente isso que a Teckey faz. É uma empresa muito focada no ciclo do crédito.

O senhor pretende assumir novamente algum cargo público no futuro?

Eu acho que já dei a minha contribuição. Confio muito em Deus e peço a Deus que sempre me oriente, mas realmente acredito que, depois de três anos na Secretaria de Política Econômica e um ano no Ministério de Minas e Energia, eu dei a minha contribuição para o setor público. Agora é foco no setor privado, trazendo essa experiência do trabalho que fizemos em Brasília.

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