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A grande oscilação do dólar frente ao real é o verdadeiro pesadelo para o setor produtivo quando o assunto é o impacto da moeda na economia real. Mais do que a cotação estar alta ou baixa, a mudança brusca de sinal e de velocidade é o que verdadeiramente atrapalha o dia a dia das indústrias que são afetadas de alguma maneira pelo preço da moeda norte-americana.
Em um mês, o dólar saiu de R$ 5,234, em 3/6, para R$ 5,665, no ápice, em 2/7, para ter dois recuos seguidos e fechar em R$ 5,487 nesta quinta-feira (4/7). Uma subida de 8,2% em um mês, com altos e baixos no caminho, e depois um recuo de 3,14% em dois dias.
As indústrias são afetadas nas duas pontas: na compradora, ao importar insumos, partes e peças, maquinários, entre outros; e na vendedora, ao exportar produtos industrializados.
Na ponta compradora o impacto parece óbvio: dólar mais alto, produto importado mais alto. E ainda que na exportação o impacto inicial seja positivo, ao se receber mais reais pelo produto vendido pelo mesmo preço em dólar, existe o impacto do hedge cambial, a proteção em moeda forte que as empresas fazem em caso de inadimplência, de problemas com as remessas, com o não-aceite do comprador, entre outros.
Essa proteção é feita pelas duas pontas envolvidas no comércio exterior, e para ambos o hedge cambial fica mais caro. Primeiro porque é feito na moeda da transação, no caso o dólar, que está mais caro. E segundo porque o spread, o valor que o agente financeiro vai cobrar pela operação, aumenta. O risco é maior, o custo se torna maior.
“A incerteza gera riscos para todo mundo. Para o importador, para o exportador e para o agente financeiro. Tudo fica mais caro”, explica Igor Rocha, economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Segundo ele, se forem movimentos momentâneos, de curta duração e principalmente de baixa intensidade, talvez não reflita na inflação. “Mas se muda toda hora, se sobe muito, se persiste a subida, isso reflete no custo da produção e os empresários uma hora têm de repassar para o preço dos produtos. É a sociedade quem sofre com a perda de competitividade”, define.
Marcelo Azevedo, gerente de Análise Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), diz que o grande problema do câmbio é a volatilidade. “As empresas passam a ter problemas para se planejar. Definir os preços começa a ser complicado”, afirma.
Ele conta que fechar contratos de exportação e de importação, e mesmo de compra e venda no Brasil, fica mais delicado por conta da indefinição do valor do dólar. “Os contratos e as formas de proteção (hedge cambial) ficam menos previsíveis, mais instáveis. As empresas entram em modo de proteção para tentar minimizar o prejuízo e isso nunca é bom”, constata.
Segundo ele, os reflexos se iniciam pelo faturamento das empresas (total de vendas), depois vão para a arrecadação de impostos (que encolhem com o faturamento mais baixo), passam para a produção (que caem se as vendas diminuem) e terminam no corte de empregos. “O emprego é o que demora mais a ser impactado, porque demitir também custa caro. Mas na retomada, também é o último a responder”, explica Azevedo.
Igor Rocha avalia que a recente turbulência tem mais a ver com ruídos de comunicação dentro do governo e captados pelo mercado do que com os fundamentos macroeconômicos brasileiros, que estão até bem avaliados pelos especialistas – inflação dentro da meta, crescimento do PIB na casa de 2,5% ao ano e situação de quase pleno emprego, com taxa de desemprego em 7,5% da População Economicamente Ativa (PEA). “Não vejo um ataque especulativo ao dólar, mas reações aos enfrentamentos entre agentes do governo. Mas as coisas tendem a se arrefecer”, prevê Rocha.
De acordo com ele, a Fiesp “rodou” quatro modelos de projeção para o dólar no final de 2024 e a média dos resultados foi de R$ 5,30.