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Consumidores de gás natural questionam ANP sobre vantagens à Petrobras

ANP autorizou aumento de até 30% no preço do transporte do gás natural que, segundo associações, beneficiam a estatal petroleira

atualizado

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Divulgação/NTS
Gasodutos da NTS - Metrópoles
1 de 1 Gasodutos da NTS - Metrópoles - Foto: Divulgação/NTS

A indústria do Sudeste que compra gás natural do Pré-Sal das Bacias de Campos e de Santos está em pé de guerra com a Agência Nacional do Petróleo (ANP). A agência autorizou aumento de até 30% nas tarifas de transporte da molécula pela Nova Transportadora Sudeste (NTS), que atende a região. O reajuste beneficia a Petrobras, segundo os empresários, e, por isso, representações setoriais falam em “caixa-preta” dos custos e questionam a falta de transparência do órgão regulador.

O anúncio do aumento de 30% foi realizado no final de maio. Depois de carta do Fórum do Gás (que representa 18 associações de indústrias da cadeia do gás) e de reuniões entre representantes da indústria e diretores da ANP, a agência recuou e, na sexta-feira (28/6), reduziu o percentual de aumento pela metade, para 15%.

Apesar do passo atrás da agência, os líderes empresariais continuam incomodados com o que chamam de falta de transparência da ANP e a suposta vantagem resultante para a Petrobras. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) endossou o Fórum do Gás e, em nota à imprensa, criticou a atuação do órgão regulador: “Este reajuste surpreendeu o mercado de gás natural, contrariando a expectativa de redução de 3% e levantando questionamentos sobre a transparência da ANP”.

Os empresários se movimentaram novamente nessa quarta-feira (3/7), ao enviar uma segunda carta à ANP e decidirem acionar o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) na próxima semana, conforme antecipado com exclusividade ao Metrópoles.

“Entendemos que isso pode ser um problema de defesa da concorrência e vamos enviar correspondência ao Cade para que investigue o que está acontecendo”, adiantou Adriano Lorenzon, diretor de Gás Natural da ABRACE Energia, associação que representa os grandes consumidores de energia.

Contratos legados

“A Petrobras deveria ser olhada com lupa pelo Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência pela sua posição dominante no mercado”, complementou Lucien Belmonte, coordenador geral do Fórum do Gás e diretor-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro). A Petrobras tem 80% de participação no mercado de gás natural.

Segundo Belmonte, não há motivos para o aumento do preço do transporte da molécula. “O gasoduto já está todo depreciado, então os custos deveriam ser somente os de operação e de manutenção. Virou uma ‘caixa-preta’ à qual ninguém tem acesso”, afirmou. De acordo com ele, o mercado quer transparência e previsibilidade, que seriam asseguradas pela implementação de uma regulação tarifária no transporte, considerando a metodologia de aplicação dos “contratos legados”, ou seja, os assinados antes da privatização dos gasodutos brasileiros.

A NTS, bem como a maior parte dos demais gasodutos, nasceu da privatização dos gasodutos da Petrobras, finalizada em 2021. A Nova Infraestrutura Fundo de Investimento em Participações Multiestratégia (um consórcio liderado pela Brookfield e que incluiu os fundos CIC, da China, GIC, de Cingapura, e British Columbia, do Canadá) detém 91,5% das ações e a Itaúsa é dona dos demais 8,5%.

A companhia opera 2 mil quilômetros de gasodutos no coração da indústria brasileira, ligando São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Ela faz ligação também com outros gasodutos, com os terminais de GNL e plantas de processamento de gás.

Resumo do caso

A Petrobras vendeu seus gasodutos, mas contratou, inicialmente, 100% da capacidade de transporte. Depois de um acordo com o Cade em 2019 e da Nova Lei do Gás, em 2021, a ANP estabeleceu uma metodologia para dar espaço para que outras empresas também contratassem capacidade dos gasodutos, operados pela NTS (sistema Sudeste), TAG (do norte fluminense até o Ceará) e TBG (Gasoduto Brasil-Bolívia), entre outras, dividindo o espaço com a estatal.

A crítica dos empresários é de que a metodologia da fórmula de cálculo da tarifa de transporte para os novos carregadores foi modificada sem ter havido uma discussão com o mercado. A ANP homologou a mudança e os empresários levantam a dúvida sobre a participação da Petrobras nesse movimento.

De acordo com eles, a nova metodologia faz com que a Petrobras pague menos pelo transporte da molécula e os privados, mais. O aumento médio seria de 12% no custo do transporte do gás, resultando num aumento de 2% no preço final da molécula em junho ante maio.

O Metrópoles procurou a ANP desde terça-feira (2/7). Após a publicação da reportagem, a agência enviou sua resposta. “A ANP, como vem sendo continuamente informado, vem tratando do tema desde o início, conforme evidencia o processo disponível para consulta no Sistema Eletrônico de Informações (SEI)”. Os documentos públicos “demonstram que a ANP vem tomando medidas relacionadas ao assunto”.

A nota cita o exemplo da alteração da capacidade máxima diária da Petrobras em parte do gasoduto da NTS (no Ponto de Recebimento Caraguatatuba) para 13 milhões de metros cúbicos diários em 2024 e que, com a medida, o “aumento tarifário caiu de 26% para 12%”. Por fim, afirmou que “a ANP segue acompanhando o assunto e avaliando possíveis medidas necessárias.”

A NTS informou que não vai comentar o caso.

A Petrobras informou que opera dentro dos acordos estabelecidos e que fez ajustes nos pontos em que tem autorização da ANP.

Leia, abaixo, a íntegra da resposta da Petrobras:

Sobre o alegado benefício para a Petrobras, esclarecemos que as premissas adotadas pela companhia para a reserva de capacidade nos pontos de recebimento de Caraguatatuba e Cabiúnas foram compartilhadas com a ANP e com a NTS. Vale destacar que a Petrobras não alterou tais reservas desde a celebração dos Acordos de Redução de Flexibilidade com a TAG e a NTS, em 2021 e 2022, respectivamente.

No caso do Ponto de Recebimento de Caraguatatuba, a reserva da Petrobras considera o fato de que a Autorização Especial da ANP 836/2020, que possibilita maior oferta de gás natural naquele local, estabelece a necessidade de avaliações quadrimestrais, podendo ser revogada. Como a referida Autorização vem sendo mantida desde então, a oferta naquele ponto tem sido superior ao volume originalmente considerado pela companhia. Nesse sentido, havendo a previsão de continuidade da citada autorização, foi implementado o ajuste da reserva da Petrobras.

 Já no caso do Ponto de Recebimento de Cabiúnas, a movimentação superior à reserva de capacidade indicada pela Petrobras decorre de a interconexão entre as transportadoras de gás TAG e NTS, naquela localidade, ainda não ter entrado em operação, o que leva a uma distorção dos volumes injetados nos sistemas da TAG e NTS. Cabe ressaltar que o somatório dos volumes de propriedade da Petrobras processados na Unidade de Tratamento de Gás de Cabiúnas (UTGCAB) e injetados nos sistemas de transporte da TAG e da NTS está coerente com o somatório das reservas de capacidade da Petrobras nos pontos de recebimento de Cabiúnas dos citados sistemas de transporte”.

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