Extradição de ex-CEO da Americanas preso em Madri deve ter resistência
Governo brasileiro precisa pedir à Espanha extradição de Miguel Gutierrez; ex-CEO da Americanas preso em Madri tem cidadania espanhola
atualizado
Compartilhar notícia
Preso nesta sexta-feira (28/6), em Madri, na Espanha, o ex-CEO da Americanas Miguel Gutierrez pode ser extraditado para o Brasil. O processo passa por um pedido do governo brasileiro que deve ter sua legalidade analisada por autoridades espanholas. Segundo apurou o Metrópoles, há chance razoável de esse pedido ser rejeitado pelo governo espanhol.
Quando um brasileiro é alvo de um mandado de prisão no Brasil, mas está no exterior, cabe à Polícia Federal (PF) pedir cooperação com o país estrangeiro para prendê-lo. Essa etapa já foi cumprida.
A extradição, ou seja, o envio de Gutierrez para cumprir a medida cautelar no Brasil, depende do aceite do governo da Espanha. Usualmente, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), órgão ligado ao Ministério da Justiça (MJ), precisa fazer um pedido ao governo espanhol.
Segundo apurou o Metrópoles, até a tarde desta sexta-feira (26/06), o governo brasileiro ainda não havia feito esse pedido. Fontes no Ministério da Justiça (MJ) afirmam que pode haver dificuldade de conseguir o aval do governo espanhol porque Gutierrez tem cidadania espanhola. Cabe à Espanha decidir se aceita ou não a extradição de Gutierrez para o Brasil.
Ao Metrópoles, o advogado criminalista Odel Antun, afirma que existe “grande possibilidade” de o governo espanhol rejeitar o pedido do governo brasileiro. “Tem acordo bilateral entre os dois países, por meio do qual os países podem se negar a extraditar seus cidadãos. Se ele for brasileiro e tiver cidadania espanhola, ele é um cidadão espanhol. E o governo espanhol pode usar essa cláusula para não extraditar o seu nacional”.
“Isso é uma regra, é um princípio bastante difundido do direito internacional de não extraditar seus cidadãos, aqui ainda tem um acordo bilateral entre Brasil e Espanha. Então, existe grande possibilidade de o governo espanhol não extraditá-lo”, afirma. Antun ressalta que sua análise é sobre casos hipotéticos e não sobre o caso específico de Gutierrez.
Criminalista e mestrando em direito penal na USP, Rogerio Costa também afirma que no tratado entre Brasil e Espanha nenhum dos países é obrigado a extraditar. “Já aconteceu de a Espanha não extraditar pelo fato de ter cidadania. Eu diria que é improvável que o pedido seja aceito pelo governo espanhol”, disse.
Ele afirma, no entanto, que, mesmo que não haja extradição, se os crimes pelos quais Gutierrez é investigado também forem tipificados como crimes na Espanha, ele pode ser julgado no país europeu.
Em entrevista à GloboNews, o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, afirmou que na legislação espanhola há “várias nuances”, e que pode ser ponderado o “momento da aquisição da nacionalidade” e a “gravidade do delito”.
“Tem algumas situações a serem avaliadas com a soberania do estado espanhol”, disse Andrei Rodrigues. Ele também mencionou a possibilidade de o executivo cumprir a pena na Espanha caso não possa ser extraditado.
Fraudes na Americanas
De acordo com investigações da PF e do Ministério Público Federal (MPF), o ex-CEO da varejista é suspeito de ter participado das fraudes no balanço da companhia “desde o seu planejamento até a publicação dos resultados”.
A prisão de Gutierrez foi comunicada nesta manhã à PF. Como ele tem cidadania espanhola e estava no país desde o ano passado, seu nome foi incluído na difusão vermelha, a lista de foragidos internacionais da Interpol.
Inquérito conduzido pela PF aponta que Gutierrez tentou blindar seu patrimônio antes que a fraude na Americanas viesse à tona. As estratégias do executivo incluíram o repasse de imóveis e valores para familiares, além da remessa de dinheiro para paraísos fiscais.
A PF afirmou, em seu pedido de prisões e buscas e apreensões contra ex-executivos da Americanas, que a cúpula da empresa não “media esforços para enganar o mercado financeiro” por meio de fraudes contábeis que escondiam os resultados negativos da varejista e garantiam lucros aos seus diretores.
“Documentos e planilhas eram falsificados, dívidas contraídas com os bancos eram escondidas do balanço e créditos inexistentes eram criados e lançados na contabilidade da companhia”, afirma a PF no pedido que resultou na Operação Disclosure, deflagrada na quinta-feira (27/6) contra 14 investigados.
Além das buscas em suas residências, o ex-CEO da empresa Miguel Gutierrez e a ex-diretora Anna Christina Ramos Saicali foram alvo de mandados de prisão. Ele estava na Espanha e ela segue em Portugal. Ambos tiveram seus nomes incluídos na lista de Difusão Vermelha da Interpol, a polícia internacional.
Consultada pelo Metrópoles, a defesa de Miguel Gutierrez informou que ele reitera que jamais participou ou teve conhecimento de qualquer fraude e que vem colaborando com as autoridades, prestando os esclarecimentos devidos nos foros próprios.