Como o agronegócio fez o PIB do Mato Grosso disparar
Estudo do economista Sergio Vale mostra que, entre 1986 e 2023, o produto nacional cresceu 121,5% e o mato-grossense, 782%
atualizado
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Todos sabem que o agronegócio tem sido o carro-chefe do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. Ainda assim, são surpreendentes alguns estudos que revelam detalhes dessa participação. Em um deles, o economista Sergio Vale, da consultoria MB Associados, constatou que o PIB do Mato Grosso avançou 782%, entre 1986 e 2023, ante um crescimento de 121,5% da média do país. Ou seja, o salto mato-grossense foi 6,4 vezes maior do que o nacional.
A título de comparação, no mesmo período, o PIB de São Paulo cresceu 91,4% e o do Rio de Janeiro, 54,8%. É fato que o Mato Grosso partiu de uma base menor, mas essa expansão explosiva tem sido uma constante em todas as regiões onde a atividade agrícola é forte. Nesse mesmo período, o produto do Mato Grosso do Sul, por exemplo, aumentou 307% e o de Goiás, 217%, ambos muito acima da média nacional. A seguir, em entrevista ao Metrópoles, Vale discorre sobre como essa diferença se traduz em prosperidade.
O que caracteriza esse avanço do PIB do Mato Grosso em relação aos demais estados brasileiros e à média nacional?
O salto foi puxado pelo agronegócio. Esse foi um setor que contou com a presença do Estado no momento necessário, principalmente por meio das iniciativas da Embrapa, mas que se abriu para o mundo depois disso.
Mas o Estado ainda tem forte presença no agro, principalmente por meio do financiamento.
Não é assim. Os subsídios ao agronegócio brasileiro são pequenos. São os menores se comparados aos dos grandes países onde é forte a atividade agropecuária, como os Estados Unidos, a Europa e a China. É uma ilusão achar que o Estado subsidia o agro. Esse é um segmento que funciona essencialmente via setor privado, com grande inovação tecnológica e ela não acontece mais por meio de órgãos púbicos como a Embrapa. Ela vem de empresas que investem em novas sementes, em novos defensivos. É isso que dinamiza o setor.
O que mais contribuiu para a pujança do segmento?
O mundo também ajudou. Quando a China começou a despontar com um crescimento robusto e constante, o Brasil estava pronto para fornecer as commodities que os chineses precisavam, no começo dos anos 2000. Se a China tivesse se consolidado como grande importadora na década de 1970, a situação seria diferente e o Brasil não poderia aproveitar o momento. Depois disso, o setor passou por um longo período de diminuição do peso do Estado, o que também foi importante.
O que o senhor quer dizer com “diminuição do peso do Estado”?
Faça uma comparação com o que acontece com a indústria. Ela só pede proteção, vive se fechando, não se integra com o resto do mundo. Por isso, vem perdendo espaço consistentemente nos últimos anos. O fato é que um país excessivamente protecionista na área industrial, no fim do jogo, só atrapalha. A única área da indústria que ainda vai bem é a extrativa, ligada a commodities como o petróleo. Já o agro se abriu, não teve medo de enfrentar a concorrência.
Agora, como fomentar o crescimento dos demais setores?
O agro tem esse dinamismo próprio, mas o restante da economia depende da continuidade de reformas estruturais, de melhorias regulatórias. Não é simples para um país de renda relativamente baixa como o Brasil dar um salto de crescimento sem políticas que ajudem todos os setores. Temos tarefas básicas a cumprir em áreas como infraestrutura e educação. O capital humano é algo absolutamente crucial neste mundo de alta tecnologia. Enfim, temos muitas questões mal resolvidas, ou que nem sequer começaram a ser enfrentadas. Não vamos crescer com força sem resolver o básico.
E quais têm sido as consequências dessa explosão do crescimento do PIB nas regiões do agro?
Ela está ajudando na questão social. Nas regiões afetadas pelo agronegócio, diversos indicadores sociais estão melhorando de forma constante. Esse é caso do Índice de Desenvolvimento Humano nessas áreas, que se aproxima dos estados do Sul, historicamente, muito mais avançados. Há uma grande chance de, no fim desta década, o Centro-Oeste ter o menor índice de desigualdade de renda do país. Considerando o que eram esses estados 30 ou 40 anos atrás, trata-se de uma mudança impressionante. Ou seja, o resultado desse avanço do PIB não é só econômico. Ele se espalha para a sociedade.