Como a mudança no ICMS tornou a gasolina mais cara
ICMS “único” passou a ser cobrado na gasolina nesta semana. Defensores afirmam que modelo traz simplificação e transparência no longo prazo
atualizado
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O preço da gasolina mudou nesta semana — e ficará mais caro em quase todos os estados. O motivo é um novo modelo de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), imposto estadual que incide sobre os combustíveis.
Foram três as mudanças principais. Primeiro, passou a ser cobrada uma alíquota fixa de R$ 1,22 sobre cada litro de gasolina e de etanol anidro (que é misturado à gasolina no Brasil).
Além disso, o valor será o mesmo em todas as unidades da federação. Por fim, a cobrança agora ocorre só uma vez na cadeia de distribuição dos combustíveis, a chamada “monofasia”.
Antes da alíquota fixa, os consumidores pagavam uma porcentagem do valor do litro. A fatia também variava a depender do estado. Em São Paulo, por exemplo, a alíquota era de 18%. Assim, ao preço médio de R$ 5,09 visto na capital na última semana, o ICMS girava em torno de R$ 0,92 por litro. Ou seja, a mudança para alíquota fixa aumenta o valor pago.
A Fecombustíveis calculou que isso ocorrerá para quase todos os estados. As exceções são Amazonas, Alagoas e Piauí, porque, nesses estados, o cobrado já superava R$ 1,22 mesmo no modelo antigo.
Enquanto isso, o modelo de monofasia, embora não altere diretamente os preços, é defendido pelo setor por reduzir a complexidade na cadeia.
“A implantação da monofasia do ICMS, com alíquotas específicas por litro e uniformes em todo o país trará transparência quanto ao peso do tributo na composição do preço”, disse em nota o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP).
No caso do diesel e do gás de cozinha, a alíquota única já estava valendo desde maio (de R$ 0,94 por litro para o diesel e de R$ 1,28 por quilo para o gás). O modelo foi aprovado em lei complementar no Congresso no ano passado, e teve meses de transição até entrar em vigor no último mês.
Simplificação
Cassiano Menke, sócio coordenador da área de Direito Tributário do escritório Silveiro Advogados, diz que as mudanças são bem-vindas do ponto de vista da simplificação. Mas aponta que a alíquota única em todos os estados, embora reduza complexidade e aumente a transparência, deixa de levar em consideração as especificidades de cada lugar.
“Em alguns estados mais ricos, há capacidade contributiva mais robusta. Em outros, os consumidores podem não ter poder aquisitivo para suportar essa alta”, diz.
Uma alternativa para o problema são discussões de cashback (dinheiro de volta) ou outras transferências às famílias mais pobres como compensação pelo imposto elevado, diz Menke. “São medidas que ajudariam a amenizar essa distinção na alíquota única, e alguns estados começam a discutir. É algo com o qual países desenvolvidos já trabalham.”
Há críticas sobretudo ao valor escolhido para a alíquota. O montante de R$ 1,22 foi decidido por governos estaduais, que são os responsáveis pela cobrança do ICMS, em reuniões com o Ministério da Fazenda no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).
A proposta inicial era ter uma alíquota ainda maior, de quase R$ 1,46/litro, mas o preço terminou reduzido na decisão final.
Defensores da medida, por outro lado, apontam que o modelo de alíquota fixa, independentemente do valor estabelecido, trará mais estabilidade em momentos de variação muito brusca do preço do petróleo.
No ano passado, após o início da guerra na Ucrânia, o barril de petróleo no exterior disparou e elevou os preços dos derivados, como gasolina e diesel. O litro de gasolina chegou a superar R$ 9 em alguns postos. Com esse valor, o ICMS pago em um estado que cobra 17% ficaria em R$ 1,53, ou seja, mais caro do que a alíquota fixa.
A guerra pelos bilhões do ICMS
Fatores políticos também entraram na discussão. Em uma proposta encabeçada pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL), o Congresso definiu no ano passado que estados deveriam reduzir a alíquota de ICMS em combustíveis para um teto de 17%. Antes, alguns estados chegavam a cobrar mais de 30%. (Desde então, parte dos entes voltou a aumentar as alíquotas, que hoje vão de 17% a 23%).
A medida ajudou a manter os preços de combustíveis sob controle no auge da alta do petróleo, mas custou mais de R$ 50 bilhões em renúncia de ICMS só em 2022, na projeção dos estados. Só em São Paulo, o cálculo da Secretaria da Fazenda é que o estado deixou de arrecar R$ 1 bilhão por mês no ano passado.
Além da alíquota única, estados também discutem no Supremo Tribunal Federal (STF) medidas de compensação retroativa da União para os gastos tributários gerados com a redução da alíquota. O governo aceitou compensar R$ 27 bilhões aos entes.
Independentemente do resultado desses debates, a alta no ICMS com o novo modelo de alíquota fixa veio para ficar. De imediato, o cálculo é que o tributo tende a anular parte do corte de preço que havia sido feito pela Petrobras em maio. Nas últimas semanas, o preço da gasolina vinha caindo.
“A redução no preço da gasolina registrada em todo o país ainda é efeito do último reajuste [da Petrobras]”, disse Douglas Pina, diretor-geral de Mobilidade da Edenred Brasil, responsável pelo Índice de Preços Ticket Log e que acompanha as variações nos combustíveis. “Devemos aguardar os próximos dias e o reflexo da mudança no modelo de cobrança do ICMS, que deve elevar o preço médio do combustível comercializado nas bombas logo no início de junho.”