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Com commodities em queda, produtores no Brasil já projetam prejuízo

O agro está preocupado: a supersafra que começa a ser colhida no Brasil em 2023 chegará ao mercado internacional com preços mais baixos

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1 de 1 Agronegocio - Agro - Rural - fazenda - metropoles - Foto: Michael Melo/Metrópoles

Produtores brasileiros no agro vivem um paradoxo em 2023. Enquanto o Brasil começa a colher uma “supersafra”, com recordes de produção e clima favorável, produtos como milho, soja e carnes chegarão aos mercados globais valendo muito menos do que em anos anteriores.

Após as altas recorde em 2021 e 2022, a leitura é que o momento de bonança chegou ao fim para as commodities da agropecuária. Na bolsa de Chicago, os contratos futuros da soja e do milho acumulam queda de mais de 20% em relação a maio de 2022.

A queda nos preços é causada, sobretudo, por uma oferta que cresce mais do que a demanda, resume Francisco Queiroz, da Consultoria Agro do Itaú BBA.

“Se olharmos os números da próxima safra, a produção de soja tende a ser recorde globalmente, crescendo 11%. Mas o consumo só crescerá 6%, no melhor cenário”, diz. “Começamos a vislumbrar um ciclo menos benéfico.”

Nos últimos dois anos, a pandemia da Covid, a guerra na Ucrânia e os eventos climáticos desfavoráveis levaram ao que se chama na teoria econômica de choque de oferta. A demanda por alimentos seguia alta no mundo, mas a oferta no campo não acompanhava o mesmo ritmo, resultando na alta de preços.

Agora, acontece o contrário: animados pelas boas margens dos últimos anos, produtores investiram alto e, com isso, a produção tem batido recordes no Brasil e no mundo.

Além disso, para os próximos ciclos, o clima no Brasil deve ser favorável, sem grandes transtornos ao plantio. Há também boas projeções de safra para outros grandes produtores de grãos, como Estados Unidos e Argentina – que se recupera de uma seca que devastou a produção neste ano. Ou seja, aumentará a oferta de produtos agrícolas.

Investimentos não recuperados

Um problema adicional, para os produtores brasileiros, é que plantar a atual safra custou caro.

No ano passado, a guerra na Ucrânia fez disparar os custos de fertilizantes – boa parte deles produzidos na Rússia – e de outros insumos. Na pecuária, por sua vez, a alta do milho no mercado internacional também teve como consequência gastos elevados para alimentar os rebanhos.

Para completar, os custos em dólar foram mais altos, enquanto a produção atual será vendida com o câmbio estabilizado em R$ 5 ou menos.

“A safra que estamos colhendo agora foi plantada lá atrás com custos de produção altos e dólar mais caro”, diz Tirso Meirelles, vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp). “O prejuízo da safra atual vai ser muito grande.”

Pelo lado da demanda, o cenário poderia ser ainda pior. Projetava-se que as altas de juros e a maior inflação em quatro décadas nos países desenvolvidos poderiam fazer cair o consumo a partir deste ano.

Como parte dos preços em mercados internacionais é feito puramente de expectativas, esse risco foi o que contribuiu para baixar os preços de commodities em todas as frentes, do agro ao petróleo e minérios.

Na prática, a queda no consumo ainda não se provou, diz Queiroz. A demanda está estabilizada nos países ricos; a reabertura da China, após quarentenas severas, é um fator positivo para as commodities brasileiras.

Corrida para esvaziar os estoques

Daqui para a frente, contudo, está claro que a reabertura chinesa não será suficiente para, sozinha, levar os preços internacionais aos patamares anteriores, inclusive porque o gigante asiático vem crescendo a um ritmo menor, comparado ao período anterior à pandemia. Já no mercado doméstico, produtores se deparam com uma demanda ainda fraca diante da renda achatada da população.

Cenário parecido se vê também nas carnes, afirma Thiago Bernardino, pesquisador da área de pecuária do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea). A cotação do boi gordo, em índice do Cepea, recuou mais de 16% nos últimos 12 meses.

Criadores investiram para aproveitar o cenário de preço alto, mas o gado inseminado em 2020 só vira boi gordo em 2023. Hoje, sobram estoques em bovinos e suínos no campo.

Outro desafio recente foi o efeito do embargo de vendas da carne brasileira para a China, após um caso de “mal da vaca louca” no Pará. O Brasil obteve autorização para voltar a exportar após um mês, tempo relativamente curto, em uma negociação costurada durante viagem do ministro Carlos Fávaro (PSD) em abril. Apesar do retorno das vendas, há hoje ampla margem de negociação para o lado dos chineses, o que derruba os preços.

“Ficamos com muita carne estocada. E frigorífico, assim como varejo, tem de fazer desconto quando há muito estoque”, diz Bernardino. “A China vai continuar comprando muita carne do Brasil, mas quer renegociar preço. A China sabe que estamos produzindo mais carne, mais soja, e vai haver esse ajuste.”

Venda na baixa

Lucilio Alves, professor da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” da Universidade de São Paulo (Esalq/USP) e pesquisador da área de grãos do Cepea, afirma que o efeito é pior para os produtores que não tomaram precauções como seguros, proteções no mercado (via opções de hedge) ou venda de parte da produção em contratos futuros, quando o preço ainda estava alto.

“Para os próximos anos, a expectativa é recuperação dos estoques mundiais e consequente pressão sobre as cotações – que favorece o consumidor, com alimentos mais baratos, mas certamente afetará aqueles produtores que não conseguiram antecipar essa tendência”, diz Alves.

No caso dos grãos, até o momento, metade da produção de soja ainda não foi vendida, de acordo com Queiroz, do Itaú.

“Ou seja, terá de ser vendida agora, a preço baixo”, diz. “Na safra passada, quem vendeu por último conseguiu preços melhores, e acredito que havia uma expectativa dos produtores de que isso se repetisse, o que levou a esse atraso.”

Plano Safra em discussão

Em alguns casos, Alves, do Cepea, acredita que ações governamentais serão necessárias para garantir a próxima safra. A expectativa é grande em relação às negociações do novo Plano Safra, em Brasília.

Meirelles, da Faesp, avalia que o Plano Safra a ser anunciado não será suficiente para conter as perdas dos produtores e que muitos devem quebrar.

A demanda do setor junto ao Ministério da Agricultura é que o Plano Safra para 2023/24 chegue a R$ 400 bilhões (ante R$ 340 bilhões na safra 2022/23). A federação dos produtores paulistas também pede a extensão do programa para subvenção de seguros, no valor de R$ 2 bilhões. “O seguro é importante, principalmente, para o pequeno e médio produtor. O grande já faz seguro desde sempre”, argumenta Meirelles. “Como nossos custos caíram agora, de alguma forma vamos conseguir ter fôlego para plantar para o ano que vem. Mas teremos que produzir com muita cautela, para ter lucratividade na safra futura e pagar a dívida que foi feita.”

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