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Brasil voltará ao top 10 dos PIBs mundiais, mas isso não importa muito

PIB nominal do Brasil deve ser 9º do mundo em 2023, mas indicador não é o ideal para medir o desenvolvimento de um país, dizem especialistas

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Imagem de uma moeda de 1 real. Acima dela, a palavra "PIB". Ao lado, uma seta apontando para cima. E, do outro lado, um ponto de interrogação - Metrópoles
1 de 1 Imagem de uma moeda de 1 real. Acima dela, a palavra "PIB". Ao lado, uma seta apontando para cima. E, do outro lado, um ponto de interrogação - Metrópoles - Foto: Getty Images

Com um desempenho acima das expectativas nos dois primeiros trimestres de 2023, a economia brasileira deve retornar ao grupo das 10 maiores do mundo ainda neste ano, de acordo com projeções divulgadas em outubro pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). De acordo com a instituição, o país deve ultrapassar Canadá e Itália e terminar o ano em 9º lugar no ranking que mede o Produto Interno Bruto (PIB) nominal. Em 2022, o Brasil ficou na 11ª colocação.

Para o FMI, o PIB brasileiro deve ser de US$ 2,13 trilhões em 2023. A entidade estima que o país se mantenha como a 9ª maior economia do mundo em 2024 e, em 2026, assuma a 8ª posição, com um PIB de US$ 2,476 trilhões.

Os bons resultados dos dois primeiros trimestres deste ano (altas de 1,8% e 0,9%, respectivamente, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE) levaram o FMI a revisar para cima suas estimativas de crescimento da economia brasileira em 2023. Segundo o fundo, o país deve registrar uma expansão de 3,1% do PIB, ante 2,1% da última projeção. Em 2024, a economia do Brasil deve avançar 1,5%.

Por que o PIB não é o indicador ideal

Apesar da visão mais positiva do FMI sobre a economia brasileira, especialistas ouvidos pelo Metrópoles afirmam que o ranking do PIB nominal diz pouco a respeito das condições de vida de um país e não é o melhor indicador para medir o grau de desenvolvimento ou o crescimento de uma economia.

O PIB, em linhas gerais, é o valor de todos os bens e serviços finais produzidos em um país em determinado período. No Brasil, o cálculo é feito pelo IBGE, com base em levantamentos do próprio instituto e dados de outras instituições, entre as quais o Banco Central (BC), a Secretaria da Receita Federal e a Fundação Getúlio Vargas (FGV).

O PIB nominal, contudo, não considera fatores como a desigualdade de renda, o bem-estar da população ou o impacto ambiental da produção econômica. O PIB per capita, por sua vez, é calculado a partir da divisão do PIB total pelo número de habitantes. Grosso modo, esse cálculo mede o quanto da riqueza do PIB caberia a cada indivíduo de um país se todos recebessem partes iguais.

“Esse ranking de PIB nominal não é muito relevante. Os economistas nunca olham com muita atenção para esses números porque eles se referem meramente ao tamanho absoluto da economia. O Brasil tem uma população muito grande, é um país enorme. O que importa é PIB per capita”, afirma o economista Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).

Segundo Pessôa, o PIB nominal tem “alguma importância”, mas apenas “para questões geopolíticas”. “A China, por exemplo, ainda tem um PIB per capita muito menor do que os Estados Unidos. Só que a China é muito grande e tem um peso enorme na economia mundial. Portanto, tem uma importância geopolítica relevante”, exemplifica.

“Se eu quiser medir eficiência produtiva, o melhor indicador é a produtividade do trabalho, ou seja, a produção por hora trabalhada. Já para medir o bem-estar da população, além de considerar indicadores de desigualdade, a melhor medida é o PIB per capita, que é a quantidade de renda, bens e serviços disponíveis para cada cidadão”, explica Pessôa.

O economista Volnei Eyng, CEO da Multiplike, também tem ressalvas ao ranking do PIB nominal elaborado pelo FMI e avalia que o salto que o Brasil dará em 2023 é resultado de fatores pontuais.

“Entre o oitavo e o 12º país do ranking de PIB nominal, é tudo muito próximo. Temos de levar em consideração que a moeda de referência é o dólar. Neste ano, o real valorizou 6% em relação ao dólar. Isso já faz muita diferença”, afirma. “No ano passado, o PIB do Brasil cresceu 2,9% e, neste ano, crescerá mais de 3%. Dá pouco mais de 6% de crescimento em dois anos. Em 2023, o grande motor foi novamente o agronegócio, que cresceu 21% no primeiro trimestre, um índice absurdo. Tudo isso colabora para esse avanço de um ano para outro.”

A economista Carla Beni, professora de MBA da FGV, observa que o cálculo do PIB nominal não considera, por exemplo, “as questões do crédito, o consumo das famílias ou o volume de inadimplência”. “Há críticas possíveis às métricas de cálculo do PIB, mas ainda é uma referência. Com todas essas ponderações, o fato de o PIB do Brasil avançar no ranking não deixa de ser uma notícia positiva. É uma sinalização importante”, pondera.

“Mas é fundamental sempre colocarmos uma lupa sobre esse dado para considerar também outros componentes. E até usar outros índices em conjunto, que medem a qualidade de vida da população”, completa Beni.

Se, na lista do PIB nominal, o Brasil deve voltar ao “top 10” nos próximos meses, no ranking do mesmo FMI sobre PIB per capita o país não está situado nem sequer entre os 60 mais bem colocados – aparece na 66ª posição (US$ 10,4 mil). O maior PIB per capita do mundo é o de Luxemburgo (US$ 116,9 mil), seguido por Suíça, Irlanda e Noruega. Os Estados Unidos, líderes do PIB em termos nominais, ocupam o quinto lugar (US$ 63,4 mil).

A situação brasileira também não é boa no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Em 2021, o país caiu três posições na lista composta por 191 nações, do 84º para o 87º lugar, com IDH de 0,754.

O IDH varia de zero a 1: quanto mais próximo de 1, melhores são as condições de vida em um país, tendo como referência itens como saúde, educação e renda. Os cinco maiores IDHs do mundo são de Suíça, Noruega, Islândia, Hong Kong e Austrália. Nas Américas, o líder é o Canadá (15º colocado), seguido pelos EUA (21º).

Economia em desaceleração

O FMI não foi o único a refazer suas estimativas para o crescimento da economia do Brasil em 2023. No início de outubro, a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad) projetou que o PIB do país teria alta de 3,3% neste ano, percentual mais do que três vezes superior à estimativa anterior, de 0,9%.

Duas semanas antes, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) também havia elevado sua projeção para o Brasil, de 1,7% para 3,2%. O Banco Mundial é outro que mudou seus cálculos e agora espera que o Brasil cresça 2,6% neste ano, ante 1,2% projetado em junho.

Segundo a última edição do Relatório Focus, do BC, que reúne estimativas do mercado financeiro sobre uma série de indicadores econômicos, o PIB do Brasil avançará 2,89% em 2023, antes de desacelerar para 1,5% em 2024 e 1,9% em 2025.

“Este é um ano em que o mercado financeiro terá de fazer um exercício de mea-culpa. A maioria dos analistas dizia que o crescimento do PIB seria menor do que 1%”, observa Carla Beni, da FGV. “A economia é feita de trajetórias e expectativas. Quando você tem um crescimento mais robusto, isso também melhora a expectativa para o ano seguinte. Espero que o país não só se mantenha entre as 10 maiores economias do mundo, mas consiga avançar ainda mais.”

Volnei Eyng, da Multiplike, afirma que as projeções para o PIB, em geral, são “muito conservadoras”. “Em 2022, a projeção para o Brasil era uma alta de 1% e deu 2,9%. Neste ano, as estimativas eram de 0,5% a 1% e vai fechar próximo de 3%”, aposta o economista.

Apesar das expectativas de um forte crescimento do PIB em 2023, dizem os analistas, a desaceleração projetada pelo mercado é um sinal de alerta que merece atenção. Dados do Monitor do PIB, da FGV, mostram que a economia brasileira recuou 0,6% em agosto, na comparação com o mês anterior, depois de já ter caído 0,3% em julho.

“A economia do país ainda sente os efeitos da política monetária. Tivemos uma taxa Selic que chegou a 13,75% ao ano, o que freou a atividade econômica. A taxa de juros começa a ter uma interferência depois de seis a nove meses. Como o Brasil começou a baixar a Selic apenas em agosto, significa que pelo menos até a metade do ano que vem ainda teremos esse reflexo de um PIB menor”, explica Eyng. A elevação da taxa de juros é o principal instrumento dos bancos centrais para desaquecer a atividade econômica e combater a inflação.

As incertezas em relação ao cumprimento das metas fiscais por parte do governo, principalmente com as declarações recentes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que dificilmente o país conseguirá zerar o déficit primário em 2024 – como determina o Marco Fiscal aprovado pelo Congresso Nacional –, também contribuem para um cenário menos otimista nos próximos meses.

Essa desaceleração preocupa. O governo prometia cumprir as metas fiscais de 2024, mas agora existe uma dúvida se isso vai acontecer, o que acaba levando a um PIB menor”, diz o economista. “Nos próximos 12 meses, vence 25% da dívida pública do Brasil. O país vai ter de sugar muito dinheiro para rolar essa dívida. A partir do momento em que a meta fiscal não é cumprida, é claro que isso assusta o investidor, que cobra um prêmio maior.”

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