Americanas: proibição de despejo preocupa donos de imóveis locados
Justiça acatou um pedido da Americanas e determinou que a varejista não pode ser despejada dos imóveis que aluga, mesmo com aluguel atrasado
atualizado
Compartilhar notícia
O juiz Luiz Alberto Carvalho Alves, da 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, acatou ontem (2/2) um pedido feito pela Americanas e proibiu que os donos dos imóveis que a varejista aluga ingressem com ações de despejo.
Em recuperação judicial desde o último dia 20/1, a Americanas acumula dívidas que chegam a R$ 47 bilhões. Entre as dívidas estão parcelas de aluguéis das lojas e dos centros de distribuição que a empresa utiliza. A Justiça do Rio determinou que os locatários não poderão despejar a Americanas dos imóveis por dívidas acumuladas até a data da recuperação judicial.
As propriedades cedidas para a varejista fazem parte do patrimônio de 33 fundos de investimento imobiliário listados no mercado. As dívidas que a Americanas tem com parte desses fundos será discutida na recuperação judicial, junto com o passivo que a empresa tem com funcionários, fornecedores e bancos.
Por isso, é certo que os fundos não receberão integralmente os aluguéis atrasados. A situação deixou os donos dos imóveis descontentes, e alguns haviam começado a mover ações de despejo para buscar outro inquilino. É o caso da AD Shopping, gestora dona de mais de 40 shoppings, que tentou retomar a loja da Americanas em um shopping no interior de São Paulo.
Outro gestor de um fundo que administra um galpão na Bahia locado para a Americanas montar um centro de distribuição disse, no mês passado, que o objetivo era tentar minimizar os prejuízos.
“A coisa mais rápida a ser feita é pedir a retomada do imóvel e alugar o espaço novamente”, lamentou Rodrigo Abbud, sócio da gestora VBI.
Com a decisão judicial de ontem, os despejos não poderão mais acontecer, sob multa diária de R$ 100 mil para os donos dos imóveis.
Discussão judicial
O caso da Americanas é o mais complexo já enfrentado no ramo imobiliário. Dona de cerca de 3.000 lojas, de 25 centros de distribuição e de mais de 200 pontos logísticos, a empresa tem uma das estruturas mais complexas de locação de ativos.
“Para uma empresa de varejo como a Americanas, uma rede extensa de lojas e galpões é essencial para a geração de receitas. É diferente de uma indústria, cujo faturamento fica concentrado em poucos ativos, como em dezenas de fábricas”, explica Arthur Vieira de Moraes, professor de finanças e sócio da plataforma de fundos imobiliários Clube FII.
Ele lembra que a decisão judicial protege a Americanas de despejos por dívidas acumuladas até a recuperação judicial, mas, se houver novos atrasos, os donos poderão, em tese, retomar os imóveis.
“Alguns gestores estão com receio de a Justiça acabar protegendo a Americanas de despejos também durante o período da recuperação judicial, mesmo que ela volte a atrasar aluguéis. Como as lojas e os centros de distribuição são essenciais para que a empresa consiga pagar as dívidas e se reestruturar, a Justiça pode entender que as retomadas dos imóveis não seriam cabíveis em nenhuma situação. Se isso acontecer, os fundos imobiliários terão um problema”, argumenta Vieira de Moraes.
Para Tiago Lopes, sócio do escritório Lollato, Lopes Advogados e especialista em reestruturação de empresas, não há jurisprudência para uma decisão desse tipo. “No entanto, não é raro que casos grandes como o da Americanas gerem precedentes novos”, pondera.
Há um consenso entre os especialistas de que é interesse da Americanas manter os aluguéis em dia, pelo risco de acabar perdendo uma fonte de receita essencial para o funcionamento do negócio. Prova disso é que a varejista tinha como modus operandi o atraso de pagamento de fornecedores, não de aluguéis.
O ponto é que o desfecho do caso ainda é incerto. O volume de dívidas da empresa cresce a cada dia, desde que ela anunciou a descoberta de um rombo de R$ 20 bilhões em seu balanço, fruto de uma maquiagem contábil para esconder a sua real situação financeira.
“Se a Americanas deixar de pagar os aluguéis, mesmo depois da recuperação judicial, acredito que o mercado começará a se perguntar se ela tem condições de permanecer no processo de reestruturação ou se a falência deveria ser decretada”, afirma Samuel Dimbarre, sócio do escritório RHOM Advogados.