Sem os pais, crianças dormem no chão em gaiolas de metal nos EUA
“O estresse é esmagador. O foco precisa estar no bem-estar dessas crianças”, disse uma pediatra em visita ao abrigo
atualizado
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Dentro de um armazém antigo no sul do Texas (EUA), centenas de crianças esperam dentro de gaiolas de metal. Uma das celas era ocupada por 20 delas. Garrafas de água, sacos de batata frita e grandes folhas de papel usadas como cobertores se espalham pelo lugar.
Uma adolescente contou a uma defensora pública estar ajudando a cuidar de uma criança pequena desconhecida, pois a tia da menina estava em outro lugar do armazém. Ela conta sobre ter usado seu celular para ensinar outras crianças, com quem dividia a cela, como trocar fraldas.
Mais de 1,1 mil pessoas estavam dentro recinto – amplo e escuro –, dividido em alas para crianças desacompanhadas, adultos sozinhos e mães e pais com filhos. As gaiolas de cada ala têm acessos a áreas comuns e banheiros químicos. A iluminação fica constantemente acesa.
De acordo com a Patrulha de Fronteira, aproximadamente 500 menores no local têm a companhia dos pais, mas outros 200 estão sozinhos. Muitos dos adultos que cruzam a fronteira sem permissão podem ser acusados de entrada ilegal e levados presos, sendo separados de seus filhos.
Cerca de 2,3 mil crianças foram tiradas de seus pais desde que o secretário de Justiça, Jeff Sessions, anunciou a nova política, determinando aos funcionários do Departamento de Segurança Interna encaminhar todos os casos de entrada ilegal nos EUA para serem processados criminalmente. Igrejas e grupos de defesa dos direitos humanos criticaram duramente a política. Eles classificam a situação como desumana.
Espalharam-se histórias menores sendo arrancados dos braços dos pais, incapazes de saber para onde seus filhos seriam levados. Um grupo de congressistas esteve na mesma instituição no domingo (17/6) e foi designado a visitar um abrigo onde estão cerca de 1,5 mil crianças, muitas separadas dos seus responsáveis.
No Vale do Rio Grande, no Texas, o corredor mais movimentado para aspirantes a entrar nos EUA, funcionários da patrulha argumentam precisar reprimir os imigrantes e separar os adultos das crianças para desencorajar outras pessoas. “Quando você isenta um grupo de pessoas da lei, isso cria um atrativo”, justificou o chefe da patrulha, Manuel Padilla.
Os funcionários encarregados de administrar o local afirmaram que todos os detidos recebem alimentação adequada, acesso a chuveiros, roupa lavada e assistência médica. A ideia é manter as pessoas por pouco tempo na instalação. Nos termos da legislação dos EUA, crianças devem ser entregues em até três dias aos abrigos financiados pelo Departamento de Saúde.
Segundo Padilla, os funcionários no Vale do Rio Grande permitem às famílias com crianças menores de 5 anos estarem juntas, na maior parte dos casos. Uma defensora pública, porém, após várias horas no local, diz ter ficado profundamente perturbada com as cenas vistas. Michelle Brane, diretora da Comissão de Mulheres Refugiadas, se encontrou com uma garota de 16 anos que estava cuidando de uma menina mais nova há três dias. A menor tinha 2 anos, supõe a adolescente e as outras pessoas em sua gaiola.
Depois de algumas perguntas de um advogado, os agentes encontraram a tia da menina e reuniram as duas. A criança tinha 4 anos e parte do problema foi o fato de ela não falar espanhol, apenas k’iche, uma língua indígena da Guatemala. “Ela não falava, pois estava muito traumatizada”, disse Michelle. “Estava apenas encolhida, como se fosse uma bola pequena.”
Trauma
Michelle contou ter visto também autoridades na instalação – onde não há brinquedos ou livros – repreenderem um grupo de crianças de 5 anos por brincarem dentro de sua gaiola, ordenando calma. Um garoto próximo da cela não estava brincando com os outros. Segundo Michelle, ele estava quieto, segurando um pedaço de papel, que era uma cópia da carteira de identidade de sua mãe.
“O governo está literalmente levando as crianças para longe de seus pais e deixando-as em condições inadequadas”, disse a defensora. “Se um dos pais deixasse uma criança em uma gaiola sem supervisão com outra criança de 5 anos, eles seriam responsabilizados.”
A chefe da Academia Americana de Pediatria, Colleen Kraft, que visitou um abrigo no Texas, viu uma criança ainda engatinhando, chorando descontroladamente e batendo os punhos contra o chão. Os funcionários tentavam consolar a criança, que parecia ter cerca de 2 anos. Ela foi tirada de sua mãe na noite anterior. Os funcionários deram a ela livros e jogos, mas não podiam segurar ou abraçar a criança para tranquilizá-la. “O estresse é esmagador. O foco precisa estar no bem-estar dessas crianças”, disse a médica.