EUA liberam lote de documentos sobre ditadura Argentina
A ditadura argentina deixou 30 mil desaparecidos, segundo dados oficiais
atualizado
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O governo argentino considerou relevantes as 1.078 páginas de documentos publicadas nesta segunda-feira, 8, pelos EUA sobre a última ditadura (1976-1983) no país latino-americano. Os papeis, referentes ao período de 1977 a 1980, foram entregues na quinta-feira em Buenos Aires pelo secretário de Estado americano, John Kerry, ao presidente Mauricio Macri. O compromisso de divulgação foi assumido por Barack Obama em março, quando esteve na Argentina para respaldar as medidas econômicas de abertura da Argentina após 12 anos de kirchnerismo Macri tem se esforçado para reaproximar o país das grandes potências e atrair investimento externo.
Obama disse então que seu país tinha “a responsabilidade de enfrentar o passado com honestidade e transparência”. Ele se referia aos questionamentos sobre o apoio logístico e financeiro às ditaduras militares latino-americanas do período.
Na divulgação desta segunda-feira, o secretário de direitos humanos argentino, Claudio Avruj, citou em entrevista coletiva os trechos que considerou mais importantes. Ele destacou tentativas do ex-presidente Jimmy Carter (1977-1981) de convencer o ditador Jorge Videla (1977-1981) a libertar presos políticos e respeitar direitos humanos. De parte dos argentinos, havia uma busca por estreitar relações. Videla chamou o americano para o casamento de sua filha, convite recusado por Carter.Avruj mencionou ainda referências à visita do então secretário de Estado americano, Henry Kissinger, ao país durante o Mundial de 1978 e à preocupação dos militares com a atuação do ativista Adolfo Pérez Esquivel, que levou o Prêmio Nobel da Paz em 1980.
Em 2002, 4.600 documentos do Departamento de Estado americano foram divulgados numa negociação iniciada entre os governos de Fernando de la Rúa e Bill Clinton. Naquele lote, descobriu-se que Kissinger tinha dito em 1976 ao almirante argentino César Guzzetti a frase “quanto mais rápido tenham êxito, melhor”. Cogitou-se que com aquele acordo o democrata Clinton tivesse interesse em expor o apoio do republicano Kissinger ao golpe. O democrata Carter é reconhecido como um dos que mais ajudou a reconstituir o período.
Grupos de defesa de direitos humanos pressionam por dados da CIA, do FBI e dos departamentos do Tesouro e de Segurança Interna, na esperança de encontrar pistas de desaparecidos e dos filhos deles. “Os papeis confirmam muito do que já se disse e vão estimular investigação”, disse Avruj.
O representante especial para direitos humanos da chancelaria argentina, embaixador Leandro Despouy, mostrou-se surpreso com o teor da documentação e a comparou com o já conhecido. “Muitas condenações de hoje foram fundamentadas nos documentos de 2002. O fato de estes novos serem papeis do FBI e do Pentágono transcende os limites da diplomacia tradicional”, avaliou, antes de propor uma homenagem a Carter.
Os arquivos publicados neste lote estão em três documentos no site https://icontherecord.tumblr.com e podem indicar até que ponto o governo americano conhecia e aprovava os abusos de direitos humanos na Argentina nesse período. Há nos escritos depoimentos de parentes de desaparecidos dados na Embaixada dos EUA em Buenos Aires, sinal de que a Casa Branca estava a par da repressão.
Segundo o Departamento de Estado, a divulgação envolveu 14 agências e departamentos do governo americano. Parte dos documentos provém das bibliotecas presidenciais de Carter, Ronald Reagan (1981-1989) e George H. W. Bush (19891993). A expectativa é que o processo de publicação esteja completo no fim de 2017. Os EUA ainda prometem difundir partes do relatório diário que os presidentes dos EUA recebiam sobre assuntos de segurança nacional. A ditadura argentina deixou 30 mil desaparecidos, segundo dados oficiais.