Mudanças regionais ameaçam influência da França na África Ocidental
Protestos e mudanças de regime na África Ocidental colocam em risco a influência da França na região, que volta os olhos para a Rússia
atualizado
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Em meio a instabilidades políticas e incertezas sobre o futuro, alguns países da África Ocidental dão sinais de que a influência francesa pode estar perdendo força na região. No início desta semana, Senegal foi mais um país a registrar protestos com bandeiras da França sendo queimadas – um ato simbólico que reflete sobre o atual momento de nações do Sahel.
Senegaleses foram às ruas após o líder da oposição, Ousamen Sonko, ser preso na última sexta-feira (28/7). Além da prisão, o partido do político foi dissolvido pelo atual governo, que mantém ligações com a França.
O novo episódio de revolta contra a presença da França região se soma a outros que aconteceram recentemente em países do Sahel. A faixa, que se estende por algumas nações do continente, vive um momento de instabilidade e de troca de alianças.
Militares mudam tabuleiro geopolítico
Durante a última cúpula Rússia-África, realizada nos dias 27 e 28 de julho, o discurso do presidente interino de Burkina Faso chamou a atenção como um possível recado de países da África para o Ocidente. Ibrahim Traoré, capitão do exército do país que assumiu o poder após um golpe militar no fim de 2022, criticou as atuais alianças regionais e chamou alguns líderes africanos de “marionetes” que “cantam ao som dos imperialistas”.
A forte declaração acontece em um momento de reposicionamento de Burkina Faso que, assim como Mali, se afastou do apoio da França após um golpe militar. Na época, o Níger se tornou um dos últimos refúgios do Ocidente na região do Sahel. Contudo, após a queda do ex-presidente Mohamed Bazoum, o discurso de líderes da junta militar que comanda o país atualmente se alinhou ao dos usados para a derrubada de governos vizinhos, dando indícios sobre o futuro.
Ao Metrópoles, Henrique Rabello, pesquisador do Laboratório de Análise Política Mundial da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), explica que a questão do combate a grupos extremistas no Sahel – o atual epicentro do terrorismo global – e a ascensão de militares ao poder se unem a outros fatores que explicam a onda anti-França.
“Existe uma junção de uma insatisfação com o crescimento grupos jihadistas na região, que se alia a um sentimento de impossibilidade da França de conter esses grupos e que, por último, se vincula a uma ideia de combate a França como um país colonizador”, explica.
Apoio da Rússia
O afastamento de países africanos com a França coincide com um momento em que a Rússia tenta aumentar sua influência na região.
Na última cúpula Rússia-África, o Kremlin firmou acordos de cooperação militar com mais de 40 países africanos. Além disso, o governo de Putin prometeu destinar US$ 90 milhões para reduzir a dívida da nações da África, e anunciou o envio de até 50 mil toneladas de grãos para seis países do continente.
Segundo Henrique Rabello, a atual movimentação russa e a insatisfação de africanos com os franceses mostra que a África Ocidental é um atual ringue de disputas geopolíticas entre potências ocidentais, onde a Rússia encontrou uma chance de diminuir os efeitos negativos da invasão na Ucrânia.
“Esse momento é muito importante para a Rússia, no sentido de aumentar sua posição e influência no continente africano para justamente buscar formas de diminuir o seu isolamento por conta da guerra na Ucrânia”, explica.