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Até onde Joe Biden pode ir com sua agenda climática?

Há uma diferença entre promessas e o que é de fato realizável nos EUA; país vai tentar assumir a liderança global na questão do clima

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1 de 1 candidato joe biden durante pronunciamento - Foto: Tom Brenner/Getty Images

Nos últimos quatro anos, os Estados Unidos praticamente não tiveram uma política de proteção climática. Pelo contrário: o presidente Donald Trump negou repetidamente a ciência na questão do aquecimento global e retirou o país do Acordo de Paris.

Com o resultado da eleição de 2020 aprovado pelo Congresso após uma semana tumultuada, a posse de Joe Biden, no próximo dia 20, vai marcar também uma mudança radical na política climática dos EUA.

O Partido Democrata terá o controle efetivo de ambas as casas do Congresso a partir de 20 de janeiro, o que permitirá a Biden impulsionar sua agenda climática. Mas há uma diferença entre o que ele prometeu e o que é de fato realizável.

É possível alcançar a neutralidade climática até 2050?

Em linha com a meta da União Europeia e de outros grandes emissores globais, Biden se comprometeu a tornar os EUA climaticamente neutros até 2050. Algo que o economista ambiental Nat Keohane descreve como um “enorme passo”.

“Estamos perto de ter os três principais emissores do mundo – UE, China e agora os EUA – com promessas de neutralidade climática ou de carbono até 2050 e 2060”, diz Keohane, vice-presidente sênior para o Clima na ONG EDF (Environmental Defense Fund), baseada nos EUA.

A “neutralidade climática” é um termo para se referir ao país que consegue eliminar a emissão de todos os gases de efeito estufa. A “neutralidade de carbono”, especificamente, trata de “zerar” as emissões de CO2 na atmosfera – ou seja, absorção da mesma quantidade de CO2 que se emite no país.

Grande parte do plano de Biden para alcançar esta meta é um segredo bem guardado. Keohane está entre os que acreditam que um corte de 50% nas emissões em relação aos níveis de 2005, até o ano de 2030, deve ser a primeira meta anunciada pelo novo governo.

O cientista climático alemão Christoph Bertram, do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático (PIK), considera a meta de 2050 um sinal positivo. Ele acredita que, para entrar no caminho certo para alcançá-la, os EUA também devem estar preparados para investir em projetos de descarbonização nos países em desenvolvimento.

“Para uma meta de longo prazo como esta, não existe uma única ação para garanti-la. Para fins políticos, é importante sinalizar aos colegas formuladores de políticas e outras partes da sociedade que você tem uma visão clara a longo prazo de para onde as coisas têm que ir”, comenta Bertram.

Internamente, o que Biden pode fazer?

Com 2050 muito distante, todos os olhos estão voltados para o que o presidente eleito fará domesticamente nos próximos anos.

A chave entre suas promessas climáticas é seu plano de tornar o setor elétrico dos EUA climaticamente neutro até 2035. Bertram diz que, neste ponto, poderão ser possíveis ver resultados dentro de três ou quatro anos.

Além do setor elétrico, Keohane diz que sua ONG identificou dois outros objetivos-chave a curto prazo para a política doméstica de Biden: transporte, particularmente com legislação em torno das normas para carros e caminhões, e redução do metano na indústria.

“O governo federal precisa fazer tudo o que estiver ao alcance das autoridades existentes, como a Lei do Ar Limpo”, diz Keohane. “O metano é a principal causa do aquecimento a curto prazo, e reduzir isso é algo que Biden pode fazer desde o primeiro dia.”

Nos EUA, as indústrias de petróleo e gás foram responsáveis por 31% da produção de metano entre 1990 e 2017, de acordo com a Agência de Proteção Ambiental, atrás apenas da agricultura. Investir em fontes de energia limpa e criar uma transição será importante para reduzir as emissões de metano nos próximos anos.

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Os EUA voltarão ao Acordo de Paris?

Biden prometeu voltar a aderir ao Acordo de Paris imediatamente ao tomar posse. O tratado internacional de 2015 estabelece uma estrutura para que os países limitem o aquecimento global a menos de 2 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais.

“O Acordo de Paris é muito peculiar – tem metas comuns a longo prazo, mas o mecanismo dá muita autonomia aos países, ao permitir a eles fixar suas próprias Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs)”, diz Bertram.

Essas NDCs têm que ser estabelecidas a cada cinco anos. Os EUA precisarão emitir suas últimas até novembro deste ano, antes da próxima cúpula sobre o clima.

Rachel Cleetus, diretora política do Programa de Clima e Energia da Union of Concerned Scientists (união de cientistas preocupados), uma organização sem fins lucrativos de defesa da ciência sediada nos EUA, descreveu a saída do Acordo de Paris como vergonhosa. Ela diz que a nova NDC do país terá que mostrar vontade de se comprometer.

“Não é suficiente simplesmente voltar, os EUA precisam voltar com ambições claras de reduzir nossas emissões de calor, bem como fornecer financiamento climático aos países em desenvolvimento – em linha com nossa contribuição de participação justa”, afirma Cleetus.

Os EUA podem se tornar líderes em matéria de clima?

Após quatro anos de “América em primeiro lugar”, com o clima em segundo plano, Biden se comprometeu a “unir o resto do mundo para enfrentar a ameaça da mudança climática”.

Keohane, que também trabalhou como assistente especial para energia e meio ambiente no governo Barack Obama, diz que, embora agora haja um grande déficit de confiança, os EUA sempre têm um papel de liderança a desempenhar no mundo.

“Os EUA precisam começar avançar em casa, com políticas internas”, diz. “É algo em que podemos agir com relativa rapidez.”

Rachel Cleetus diz que a ação será fundamental. “Para ser franca, o governo Biden terá que fazer muito mais do que evocar a retórica desgastada sobre a liderança dos EUA”, diz. “O que o mundo precisa dos EUA não é retórica, mas ação. Precisamos tomar nosso lugar à mesa, e fazer nossa parte de forma responsável, justa e rápida.”

Bertram também diz ser “realista” que os EUA assumam um papel de liderança na proteção do clima, e ressalta que, apesar da falta de envolvimento federal nas políticas climáticas sob Trump, muitos estados avançaram com inovações tecnológicas e políticas de longo alcance.

“Alguns estados americanos veem seu papel como sendo pioneiros tecnológicos globais, e houve muito progresso tecnológico climático nos últimos quatro anos”, comenta ele, citando como exemplos inovações em transporte elétrico e energia renovável.

Os ambiciosos planos de Joe Biden dão alguma esperança de soluções para a crise climática, e os próximos meses serão críticos.

“Estaremos atentos ao que ele fará em seus primeiros cem dias, e até mesmo no primeiro dia”, afirma Rachel Cleetus. “Isso fará toda a diferença.”

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