Lei marcial e briga entre poderes desafiam democracia na Coreia do Sul
Presidente da Coreia do Sul decretou estado de lei marcial na terça-feira (3/12), mas foi barrado pelo Parlamento do país por unanimidade
atualizado
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A democracia na Coreia do Sul vive momentos turbulentos após o presidente do país, Yoon Suk Yeol, decretar lei marcial na terça-feira (3/12). O mandatário justificou a decisão com a necessidade de “limpar elementos pró-Coreia do Norte do país”. Esta foi a primeira vez que a lei marcial foi implementada no país asiático desde o fim de uma ditadura na década de 1980.
A polêmica decisão de Yoon Suk Yeol, que na prática substitui leis civis por militares, ampliou o poder do Executivo e fechou o Parlamento do país, foi barrada por congressistas do país horas depois do anúncio do presidente sul-coreano.
Segundo as regras constitucionais do país, congressistas têm o poder de derrubar a implementação de um estado de lei marcial com a aprovação da maioria no Parlamento. Foi o que aconteceu em uma tensa votação realizada horas após Suk Yeol anunciar o decreto, onde 190 parlamentares presentes, dos 300 que membros da casa, foram favoráveis ao veto.
A decisão fez com que militares, que chegaram a invadir a Assembleia Nacional e tentaram prender o líder da oposição, recuassem. O mesmo aconteceu com o presidente Yoon Suk Yeol, que voltou atrás e cancelou a lei marcial após ser acusado de tentar aplicar um autogolpe.
Desdobramentos, porém, ainda estão sendo esperados e o presidente está sendo pressionado a deixar o cargo.
Democracia de 36 anos
Comparada com outras nações, a democracia na Coreia do Sul é relativamente nova, e foi conquistada há apenas 36 anos, quando os sul-coreanos elegeram o primeiro presidente do país por meio de voto direto.
Antes da eleição do general Roh Tae-woo, em 1988, o país enfrentou períodos políticos marcados por governos autoritários e ditaduras militares desde o estabelecimento do país, em 1948.
O primeiro presidente da nação, Syngman Rhee, governou a Coreia do Sul entre 1948 e 1960, quando renunciou e buscou asilo nos Estados Unidos. Um governo provisório foi instaurado no país, mas no ano seguinte, 1961, um golpe militar elevou o general Park Chunghee ao poder.
Ele ficou no comando da Coreia do Sul por 18 anos, até ser assassinado em outubro de 1979. Na época, o país enfrentou um novo golpe militar, liderado pelo general Chun Doo-hwan.
Militares ficaram no poder por quase dez anos, quando novas manifestações tomaram conta da Coreia do Sul em 1987 exigindo uma transição democrática.
Plano de fundo da crise atual
O caos político na Coreia do Sul surgiu dias após o Parlamento viver um impasse sobre um projeto, liderado pelo Partido Democrata (DP), de oposição ao atual governo sul-coreano.
Após rejeitar o plano orçamentário do governo, o partido de oposição sugeriu uma revisão nos gastos com um corte de aproximadamente US$ 2,9 bilhões no orçamento da atual administração, inicialmente previsto para US$ 482 bilhões.
O projeto de lei da oposição foi visto pelo Partido do Poder Popular (PPP), sigla que o atual presidente faz parte, como politicamente motivado. A questão, que tinha até a próxima segunda-feira (9/12) para ser aprovada pelo Parlamento, teve o prazo adiado para 2025.
A situação ainda demonstrou uma dificuldade de Suk Yeol, eleito em 2022, de governar. Apesar de ser o nome escolhido pela população sul-coreana no pleito presidencial daquele ano, o governo atual não conseguiu a maioria no Parlamento da Coreia do Sul.
Atualmente, o partido de Suk Yeol possuí apenas 115 cadeiras na Assembleia Nacional, composta por 300 membros. A oposição conta com 184 parlamentares, enquanto um cargo está vago.
Analistas ouvidos pelo Metrópoles, no entanto, apontam que a dificuldade de Suk Yeol em governar não foi o único ponto que o motivou a decretar lei marcial no país.
“A questão orçamentária e a não aprovação do plano do governo teve um peso fundamental, mas não foi o único”, explica Claro Cauti, professor de Relações Internacionais do Ibmec-SP. “Sua mulher [de Suk Yeol] está envolvida em um escândalo de corrupção, altos funcionários também estão envolvidos em casos de corrupção, e a Coreia do Sul é um país com histórico de casos de corrupção”.
Além de membros do alto escalão da administração Suk Yeol, a primeira-dama da Coreia do Sul, Kim Keon Hee, se envolveu em um escândalo no início deste ano. Ela foi flagrada recebendo uma bolsa de luxo da Dior de um pastor local, avaliada em US$ 2,2 mil, o que contrária a lei anti-corrupção do país, que impede autoridades públicas e cônjuges de receberem presentes acima de $750.