Golpe militar no Níger aumenta tensão terrorista na África
Golpe militar no Níger aumenta dúvidas sobre o futuro do combate ao jihadismo no Sahel, o atual centro de grupos extremistas do mundo
atualizado
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O golpe militar no Níger, que derrubou Mohamed Bazoum do poder na última quarta-feira (26/7), se tornou mais um foco de tensão no Sahel. Há alguns anos, a região ficou conhecida como o reduto de grupos extremistas, que se instalaram na área após derrotas no Oriente Médio.
A região, que se estende por alguns países da África, corresponde a 43% do total de mortes ao redor do mundo em 2022 causadas por jihadistas segundo o último relatório Global Terrorism Index. A alta no número – maior do que o Sul da Ásia, Oriente Médio e Norte da África juntos – coincide com um momento de mudanças na geopolítica local causadas por golpes militares.
Recentemente, militares tomaram o poder em Mali e Burkina Faso, modificando a estratégia ao combate a insurgentes islâmicos no Sahel. Com os novos regimes, tropas ocidentais que lutavam contra grupos como Al-Qaeda e Estado Islâmico foram retiradas dos dois países, que se aproximaram da Rússia.
Com as mudanças, os olhos do Ocidente se voltaram para o Níger, uma das últimas democracias da região. Após a expulsão de tropas de Mali e Burkina Faso, a presença militar ocidental no país aumentou. Além das bases estrangeiras já existentes, o governo nigerino aprovou o destacamento de militares franceses para ajudar no combate ao extremismo islâmico no último ano. Contudo, o golpe militar no país fez com que incertezas surgissem sobre o futuro das alianças com o país africano.
Para o professor de geografia e analista internacional Ricardo Marcilio, o roteiro seguido pelos militares do Níger pode indicar o que vai acontecer daqui para frente. “Sob a bandeira de conter a violência, maior autonomia frente a ingerência do Ocidente e uma proximidade maior com os russos, é possível comparar os casos”, afirma.
Aproximação com a Rússia
Uma das dúvidas sobre o futuro do Níger é se o país seguirá os mesmos passos dos vizinhos, que buscaram uma maior aproximação com a Rússia após os militares chegarem ao poder. Analistas ouvidos pelo Metrópoles afirmam que essa é uma possibilidade real, visto que o mais recente golpe parece seguir os mesmos passos daqueles que aconteceram em Mali e Burkina Faso.
“É notória a presença da Rússia na África nos últimos anos, contrabalanceando e surgindo como uma segunda via à assistência militar dos EUA na região. A incidência estratégica vem sendo notada principalmente em países que estão sob guerra civil, com o fornecimento bilateral de aparato militar. Não é bem visto aos EUA que a Rússia permaneça em crescente influência junto aos países que foram tomados por golpe militar, como Mali e Burkina Faso, mas é o que está acontecendo. A crescente aproximação com esses países parceiros, que incentivam trocas bilaterais, é de muita atenção de Putin, em meio à guerra com a Ucrânia, que perdeu grande parte de suas parcerias de cooperação como forma de sanções.”, explica Alana Monteiro Leal, internacionalista e consultora de comércio exterior.
Apesar de o Kremlin ter negado qualquer ligação com o golpe de Estado no Níger e da crise com o Wagner, declarações recentes de Yevgeny Prigozhin sobre a expansão dos mercenários na África coincidem com o momento de instabilidade no país. Na última terça-feira (25/6), um dia antes dos militares tomarem o poder, uma entrevista do “chef de cozinha” de Putin foi divulgada, onde o mesmo afirmou que o futuro do grupo está no continente africano, onde já atua em países como Sudão, República Centro-Africana e Chade.
Com o golpe militar concretizado no Níger, Prigozhin elogiou a atuação dos militares, chamando a tomada de poder de uma “luta do povo com seus colonizadores”. Ele ainda ainda ofereceu ajuda ao novo regime, e afirmou que seus mercenários “são capazes de trazer ordem e destruir terroristas e não permitir que eles prejudiquem as populações locais”.
Sinais de mudança
Apesar do pouco tempo, o novo regime no Níger já deu sinais de pode seguir a linha dos países vizinhos e mudar seus parceiros estratégicos na região. Na sexta-feira (28/7), o general Abdourahamane Tiani, nomeado líder do novo governo, disse que a decisão de tomar o poder partiu principalmente pela questão da segurança do país. Além disso, militar criticou a falta de “colaboração genuína” com Mali e Burkina Faso na luta contra os insurgentes islâmicos.
“Que sentido há na abordagem de segurança contra o terrorismo que exclui qualquer colaboração genuína com Burkina Faso e Mali, onde se concentram a maioria das atividades de grupos terroristas contra os quais lutamos”, disse Abdourahamane.
Além das declarações do novo líder do Níger, o golpe militar já provocou desgastes e mudanças nas relações com a comunidade internacional. Neste sábado (29/7), o presidente francês Emmanuel Macron anunciou a suspensão de todo apoio orçamentário ao país. No mesmo dia, a União Europeia também cortou a cooperação econômica e de segurança com o regime, e pediu que o presidente deposto, Mohamed Bozoum, seja “libertado incondicionalmente e sem demora”.